A estrutura topológica proposta pela Teia Informacional
Fundamental (TIF), da qual já expusemos os conceitos principais, pode ter
similaridades interessantes com o modelo de Edmund Husserl (1) sobre a temporalidade. No pensamento husserliano, o tempo é
estruturado em três camadas ou modos interdependentes: Retenção (passado),
Impressão Primordial (presente) e Protensão (futuro). Essas camadas não são
separadas, mas interpenetram-se de forma dinâmica, dando forma a uma geometria
triangular.
Fig.1 – Modelo
Topológico de Husserl
O ápice do triângulo representa a Protensão, ou seja, a
antecipação do futuro, a base do triângulo interliga a Retenção (memória do
passado) com a Impressão Primordial (o agora). Na sua essência esta estrutura
reflecte a unidade dinâmica do tempo na Consciência como acto cognoscível
humano, onde o presente é sempre influenciado por “resíduos” do passado e
expectativas do futuro.
Deste modo, o diagrama do tempo de Husserl refere-se à representação
fenomenológica da Consciência do tempo, particularmente ao modo como
experienciamos a passagem do tempo na nossa Consciência. Husserl desenvolveu
esta abordagem dentro da sua Fenomenologia da Temporalidade, procurando descrever
pormenorizadamente como os eventos são percebidos e retidos na experiência
subjectiva.
O que propomos explorar será a adopção daqueles critérios husserlianos
na estruturação da Consciência cósmica que emerge da Teia Informacional
Fundamental – TIF, partindo do princípio que, se aquele modelo no âmbito
fenomenológico do microcosmo funciona, será porque é o reflexo de uma mesma “estrutura”
ou modelo no âmbito expandido do macrocosmo.
A geometria do tempo com Husserl desdobra-se em duas componentes:
uma linha horizontal do “fluxo do tempo” (A, C) e uma outra vertical do “tempo
presente” (C, A´). Do “colapso” entre as duas por ligação entre ambas
(decaimento A, A´ e B, B´) surgem superfícies triangulares que representam o
passado (a memória), que se desenvolvem continuamente resultante da confluência
dinâmica entre aquelas duas linhas. O vértice (C) representa o presente como um
momento cuja existência é momentânea e realizada em nanossegundos, diríamos
nós, talvez em tempos de Planck (10-44 segundos).
Do lado oposto podemos considerar o desenvolvimento da Protensão
(o futuro), cuja geometria triangular se desenvolve em “oposição” à primeira.
Isto é, a sua base continua a ser a linha do “fluxo do tempo” (C, E), mas na
continuidade da linha do presente agora desenrola-se outra linha (C, E´) sua
oposta que ao “colapsar” com a primeira cria outras superfícies triangulares
representando o futuro (as pro-memórias). O presente desenvolve-se, de forma
pontual, na confluência daqueles dois vértices (C).
Fig.2 – Diagrama
husserliano
Estas múltiplas superfícies triangulares correspondem a secções temporais dos “cones de luz” (2) – slices, que se desenvolvem no passado (por Retenção) e no futuro (por Protensão), e do ápice dos quais surge o presente (a Impressão Primordial). As memórias (e as pro-memórias) resultam neste modelo do “decaimento” entre duas linhas temporais: a do “fluxo do tempo” e a do “tempo presente”, gerando infinitas topologias triangulares que são coerentes apenas se mantiverem os seus nodos de ligação.
Fig.
3 – Cones de Luz
Considera-se que o Cone de Luz no espaço-tempo relativístico define
os limites causais de um evento em que o futuro e o passado possíveis de um
ponto são determinados por esse cone, uma vez que a superfície do cone
representa trajectórias à velocidade da luz. Agora imagine-se uma secção
triangular feita dentro de um Cone de Luz cujo vértice nascerá sempre no
vértice do cone (o presente) e cuja base intercepta a base do cone, como mostra
a figura 3. Façamos o mesmo para o cone do futuro. As secções resultantes formam
dois triângulos causais internos, delimitando um domínio de coerência temporal
da Consciência que pode ser visto como o "domínio fenomenológico" de
um observador, dentro das possibilidades causais do Cone de Luz.
Aquelas secções triangulares insertas no Cone de Luz representam slices ou "fatias" de tempo
consciente, que ao mesmo tempo permitem modelar a interioridade da experiência
temporal dentro da estrutura espaço-temporal objectiva, oferecendo assim uma
ponte entre a fenomenologia (tempo vivido) e a relatividade (tempo geométrico),
constituindo um “armazém” de informação, fonte das memórias (com semelhanças ao
Akasha védico).
Triângulo de spins e a estrutura temporal de Husserl
Na teoria quântica, especialmente em sistemas de spin frustrado, temos configurações
triangulares onde três spins
interagem de forma que nenhum deles pode minimizar completamente a sua energia.
Esse fenómeno leva a superposições e
correlações não-locais, características
da coerência quântica. Este o
significado de spin frustrado.
Agora, se aplicarmos este fenómeno de spins frustrados ao conceito da TIF e à fenomenologia do tempo de
Husserl, como a descrevemos antes, teremos que a Protensão (futuro) torna-se
semelhante ao estado de um spin que
antecipa uma possível orientação futura, a Impressão Primordial (presente) transforma-se
num estado "colapsado", ou ao momento imediato da experiência, e a Retenção
(passado) ao "resíduo" informacional das configurações anteriores do
sistema.
O tempo na fenomenologia husserliana não é fixo, e também neste
modelo do triângulo de spins, os
estados estão interconectados e indefinidos (a probabilística quântica a
funcionar), adquirindo o aspecto de uma teia dinâmica de relações entre
passado, presente e futuro. Logo, se pensarmos na TIF como uma rede
tridimensional de tetraedros interconectados, onde cada triângulo representa
uma face de um tetraedro e os vértices representam estados de spin, podemos estabelecer uma analogia
com a estrutura fenomenológica de Husserl, dado que surgem 3 considerações
unificadoras:
1. Vértices como
estados de spin - Cada
vértice do tetraedro poderia representar um estado temporal fundamental
(Retenção, Impressão Primordial, Protensão), mas num espaço quântico onde a
informação é distribuída e está correlacionada de maneira não-local.
2. Triângulos
como transições temporais – Os triângulos ao interligarem estados de spin, criam fluxos de coerência entre diferentes momentos (gerando
memórias ao darem coerência à informação), lembrando que a Consciência temporal
não experimenta momentos isolados, mas sim um fluxo contínuo de conexões entre
passado, presente e futuro.
3. Malha
topológica e evolução temporal – A rede de tetraedros, evolui dinamicamente, assim como a
experiência do tempo em Husserl, que é continuamente reconstruída pela Consciência.
Neste modelo este vector evolutivo implicaria mudanças nos estados de spin locais, reflectindo variações no
enfoque e na organização do tempo.
No nosso modelo com spins
da teia informacional, cada triângulo entre estados 𝑆1, 𝑆2, 𝑆3, deverá ser
interpretado como uma secção “activa”, uma espécie de corte epistemológico ou
salto quântico, dentro de um Cone de Luz, e a malha total de tetraedros a
estrutura através da qual a Consciência propaga coerência fenomenológica no
tempo físico.
Deste modo, o modelo de Husserl pode ser visto como análogo
fenomenológico da estrutura quântica agora descrita. Se expandirmos essa rede
para incluir efeitos de não-localidade e entrelaçamento, poderíamos até
explorar implicações para uma compreensão mais profunda da relação entre Consciência
e tempo na física quântica com a Teoria da Redução Objectiva Orquestrada
(Orch-OR) de Roger Penrose e Stuart Hameroff.
Para tal, bastaria ampliar esta abordagem associando-a
a uma estrutura fractal,
onde cada instante do tempo se desdobra em múltiplas camadas interconectadas, algo
similar às características enunciadas da Teia Informacional Fundamental,
onde residem propriedades de não-localidade
temporal e de emaranhamento quântico.
Se expandirmos o modelo para incluir a
Consciência como um campo quântico interagindo com a estrutura temporal, deverá
surgir um operador matemático adicional, representando essa influência, e que deverá
modular os acoplamentos entre os respectivos estados.
A equação que traduz esse modelo pode ser
escrita como:
H = J12S1S2 + J23S2S3 + J31S3S1
Onde, 𝑆𝑖
são operadores de spin associados aos
estados temporais (passado, presente, futuro) e os coeficientes 𝐽𝑖𝑗 representam os acoplamentos entre esses
estados.
A influência da Consciência como um campo quântico
pode ser expressa pela adição de um operador exponencial do Hamiltoniano: Ψ=𝑒−𝛼𝐻 onde α é um parâmetro necessário para regular a
interacção da Consciência com a estrutura temporal. Este operador irá agir
sobre os estados do sistema, modulando as probabilidades das transições entre
diferentes momentos.
A Consciência propaga coerência nas Ordens Implícita e Explícita de Bohm
Esta formulação sugere que a Consciência (a Ordem Implícita de Bohm) pode ser interpretada como um Campo que influencia a dinâmica do tempo de forma global, emergindo como uma coerência quântica distribuída na rede (sede de memórias) e da qual emerge por partilha, a Consciência fenomenológica (a Ordem Explícita), graças à existência de uma estrutura física cerebral que sintoniza a Implícita – a estrutura fractal dos microtúbulos da Teoria Orch-OR, (Stuart Hameroff, Roger Penrose, Consciousness in the universe: A review of the ‘Orch OR’ theory, Physics of Life Reviews, Volume 11, Issue 1, 2014, Pags. 39-78).
Neste processo a Entropia terá um
papel fundamental no “desdobramento”ou “colapso” inferido pelo Holomovimento
bohmiano. Aqui, é a Consciência que provoca o “colapso” e não o contrário. O
tempo seria uma função do estado de informação do sistema. O que consideramos ser
o "fluxo do tempo" seria uma espécie de “efeito térmico” do
entrelaçamento e da desorganização informacional entrópica, passível de ser
sujeita a correcções permanentes (o mesmo efeito idêntico àqueles dos cristais
quânticos temporais).
A consciência do tempo não seria
apenas um “relógio biológico”, mas uma emergência da coerência entre múltiplos
ciclos neurais — análoga à coerência angular entre os tripletos de spins. Isso
permitiria experiências cognitivas como a distorção temporal (meditação, fenómenos
psicadélicos), o déjà vu (ressonância entre Retenção e Protensão) e os insights criativos e da intuição (“colapso”
da distinção linear entre os três tempos).
A nível fundamental, poderia haver
uma camada quântica de processamento, um "campo da consciência" que
se acopla aos circuitos clássicos, regido por uma estrutura tipo spin, que actua como uma engrenagem
trifásica temporal. Na
neurociência, a ideia do “nanomotor trifásico de spins”, de que trataremos mais adiante, pode ser interpretada como
uma analogia fisicalista mas profunda para compreender os ritmos internos da Consciência
e a emergência do tempo subjectivo, especialmente quando a Consciência é
pensada como uma interface quântica com a Realidade.
Fig.3 –
Microtúbulos, polímeros cilíndricos com diâmetro de 25 nm, constituídos por
monómeros de tubulina que tem uma estrutura fractal de acordo com a sequência
de Fibonacci (3, 5, 8, 13).
"O tempo não é um dado absoluto, mas emerge da síntese de retenção e
protensão, onde cada momento contém o rastro do passado e a antecipação do
futuro.", Edmund Husserl, Zur
Phänomenologie des inneren Zeitbewusstseins (Sobre a Fenomenologia da Consciência Interna do Tempo).
Foi desta citação que retirámos a
inspiração para a “construção do tempo” como propriedade emergente de um modelo
de uma rede quântica informacional onde os estados locais carregam influências
passadas e projecções futuras, semelhante ao entrelaçamento temporal. Husserl
via o tempo como um fluxo de Consciência estruturado pela percepção e memória,
o que pode ser também interpretado como uma forma emergente ou explícita da Teia Informacional.
O tempo como fenómeno
emergente da Teia Informacional Fundamental (TIF) em 4 princípios
Vamos então
considerar estes 4 princípios como âncoras do modelo TIF:
1º - Um princípio fundador afirmando que o tempo não é uma entidade
absoluta, mas uma propriedade emergente da dinâmica
interna de uma rede informacional auto-organizada — uma teia quântica que
incorpora estados de Consciência.
2º - A estrutura da TIF tem por base os nodos quânticos (unidades de informação/Consciência) interligados. Cada nó quântico
carrega um estado de spin ou um vector de
informação, como num modelo topológico
de Campos quânticos. Os vínculos entre os nós quânticos formam triângulos
e tetraedros, baseando-se na geometria mínima definida como ligação trina (3).
3º - A emergência do tempo surge como síntese
local fenomenológica, que de acordo com a interpretação de Husserl, cada
nodo ou nó da teia vive o presente com uma Retenção (passado) e uma Protensão
(futuro). O presente torna-se consequência do estado informacional e das relações entre os nodos e será dado pela equação:
Ψ(t): representa o estado global da teia informacional (o
Campo de Consciência).
H local: é o acoplamento de spins locais
(o tempo interno).
H não-local: são as ligações não-locais (a coerência global, a retrocausalidade).
D[Ψ]: é o termo de dissipação
que gera a flecha do tempo (a Entropia emergente).
γ: é o factor de decoerência (interacção com o meio) e i o número complexo.
4º - O tempo surge
como fenómeno Auto-referente em que a Consciência actua no papel de “observador”
e deste modo co-gerador do tempo,
porque cada experiência do presente é um cruzamento informacional entre retenção e protensão (de acordo com
a fenomenologia de Husserl). Assim, o
tempo é participativo e co-criado.
Não esqueçamos que para
Husserl, a Consciência não está no tempo, pelo contrário é a fonte do tempo. Em
vez de ser um observador passivo da passagem do tempo, a Consciência constitui
o tempo através de três momentos fundamentais que estão sempre presentes na
realidade.
Fig.4
– Quatro Princípios da TIF que informam o tempo.
O tempo, neste
modelo, não é um fundo de palco onde os eventos ocorrem, mas é tecido junto com
os próprios eventos, como uma dança informacional consciente. É um efeito da
complexa interacção entre estados quânticos locais, coerência global e Consciência
auto-reflexiva, numa topologia fundamentalmente viva e dinâmica.
Vamos esboçar
duas abordagens distintas, mas que no entanto podem dialogar entre si: uma
equação que represente a evolução temporal quântica e outra que modele a estrutura
intencional e temporal da Consciência fenomenológica de Husserl.
O modelo quântico
será assumido pela célebre Equação de
Schrödinger com a adição de um acoplamento Consciente que vai descrever
como o estado quântico de um sistema evolui no tempo:
que, por
consequência, vai ser adaptada para reflectir um acoplamento com um Campo de Consciência:
Onde:
H é o Hamiltoniano do sistema físico
C é o operador que representa a influência da Consciência
como Campo informacional (pode incluir a coerência global ou a informação
contextual).
Ψ(𝑡) o estado do sistema,
i representa a unidade imaginária na matemática
O outro modelo será
designado por Fenomenológico Husserliano,
que vai reflectir uma Estrutura Tripla da Consciência temporal, inspira-se nos
diagramas temporais de Husserl (retenção, percepção e protensão), e será um
sistema dinâmico triádico:
Onde:
R(t) é a retenção (passado vivido)
P(t) a percepção (presente imediato)
F(t) a protensão (expectativa do futuro)
α,β,γ são os parâmetros que regulam o fluxo da experiência.
Essa matriz
define uma dinâmica intencional do tempo, onde o presente surge da retenção e influencia
a expectativa futura, assim definido por Husserl.
Então, estaremos
agora em condições de integrar os dois modelos num Modelo Híbrido:
Onde f(R,P,F)
representa um operador que modula o Hamiltoniano com base nos estados
fenomenológicos internos da Consciência.
Ou seja, resumindo a operação num diagrama de 3 passos:
Os modelos temporais modernos, especialmente no contexto da física quântica e da filosofia da Consciência, têm vindo a aproximar-se surpreendentemente de certas intuições fenomenológicas, como as de Husserl, expressando a forma como eles dialogam com a ideia de um tempo emergente e relacional como numa Teia Informacional Fundamental.
O quadro relacional
que apresentamos, coloca em evidência algumas propostas trabalhadas por nós e faz
a comparação dos conceitos do modelo de Husserl com alguns actuais da Física e
da Matemática.
Conceitos de Husserl |
Paralelo na Física/Matemática |
Impressão, Retenção, Protensão |
Spins acoplados
ou estados de superposição temporal |
Fluxo da consciência |
Dinâmica não-local de Campos quânticos |
Horizonte de intencionalidade |
Amplitude de probabilidade |
Estrutura tríplice |
Tripletos quânticos |
Tempo emergente |
Tempo como variável interna de sistemas coerentes |
Entre muito outros modelos, referiremos os principais. Podemos destacar o Modelo de Tempo Emergente da Gravidade Quântica proposto na teoria da “loop quantum gravity”, onde prevalece a visão do tempo como entidade não fundamental, já que o Universo é descrito por relações entre eventos (tal como aquele implícito na estrutura nodal numa teia), emergindo a partir de mudanças nos estados quânticos. Sem um tempo externo absoluto, o fluxo é construído pela inter-relação dos momentos, tal como Husserl propõe que o presente é sempre entrelaçado com o passado e o futuro.
A Teoria do Bloco Crescente (Growing Block Universe) propõe que o passado e o presente existem, mas o futuro ainda não existe ontologicamente, pois o tempo é visto como um "bloco" que cresce à medida que o presente se move, espelhando por exemplo a protensão husserliana, que vive da abertura do instante presente ao que ainda não foi.
Outro modelo proposto pelo conceito de Retrocausalidade e do Tempo Quântico Bidirecional como a Two-State Vector Formalism (Aharonov, Vaidman), estabelece que os estados quânticos são definidos por condições tanto no passado quanto no futuro, ou seja o tempo não é linear, mas tecido por vectores de influência em ambas direcções, que mais uma vez se assemelham às condições de Husserl relativas à retenção e protensão.
Ainda temos a teoria do Tempo Relacional
proposto por Carlo Rovelli onde o tempo também é relacional e não absoluto. Os
eventos existem relativamente uns aos outros, e o "agora" é uma
convenção emergente, algo que se costura numa teia de correlações
assemelhando-se ao conceito de tempo interno da Consciência como uma síntese
subjectiva, tal como Husserl descreve. Para
Husserl, em vez de ser um observador passivo da passagem do tempo, a Consciência
constitui o tempo através de três momentos fundamentais que estão sempre
presentes na realidade.
Também o tempo, proposto pela dupla Alain Connes e Carlo Rovelli, surge como Informação Térmica (Thermal Time Hypothesis) sendo uma função do estado de informação do sistema. Aqui reconhece-se que o "fluxo do tempo" seria um efeito térmico do entrelaçamento e da desorganização informacional, ou seja a percepção da passagem do tempo está ligada à assimetria da informação e ao crescimento da entropia (ou desordem).
Em resumo,
Edmund Husserl oferece uma cartografia fenomenológica do tempo, que pode hoje
ser reinterpretada matematicamente, em modelos quânticos e topológicos. Antecipou
a noção de que a estrutura do tempo está codificada na própria Consciência, tal
como um Campo quântico informacional fundamental com uma geometria própria.
Tripletos de Spins como “nanomotores trifásicos” à escala de Planck
Numa abordagem final
e mais fisicalista, que nos permita uma visão materializada destes conceitos,
poderíamos comparar os tripletos de spins
a nanomotores à escala de Planck (ou aproximadamente a essa escala).
Se tomarmos o triplo acoplamento de spins (passado-presente-futuro, ou S₁, S₂, S₃), e o concebermos como um circuito mínimo gerador de uma dinâmica interna, poderia ser comparado a um nanomotor trifásico com características muito específicas, funcionando à escala de Planck.
Feita esta
analogia, vamos correr o risco de propor uma base comum para os seguintes elementos:
Elemento do Modelo |
Equivalente ao Motor Trifásico |
Spins S₁, S₂, S₃ |
Bobinas ou fases do motor |
Acoplamentos J₁₂, J₂₃, J₃₁ |
Interacções de fase que criam rotação |
Energia quântica local |
Potencial de entrada (uma tensão mínima de Planck?) |
Evolução do estado |
Movimento ou rotação interna |
Holomovimento |
Campo gerador da rotação ou um "Campo do rotor quântico" |
Tempo |
Efeito que emerge da "rotação" coerente entre os estados |
Cada tripleto de spins comportar-se-ia como uma célula
dinâmica de tempo, girando numa frequência fundamental, o pulsar ou quantum de
duração.
Essa rotação
seria trifásica, ou seja não linear, e por consequência geraria um vector de
direcção temporal, isto é, um tempo orientado dentro da malha do espaço-tempo.
Em grande escala,
a coerência entre milhares de milhões desses "nanomotores" formaria a
estrutura do tempo contínuo que nos é dado perceber.
À escala do microcosmo de Planck, cada unidade tríplice giraria com uma frequência associada à energia de Planck (~10⁴³ Hz), originando o ritmo fundamental da Realidade.
Esta visão vai de
encontro aos conceitos modernos de que o espaço-tempo não é contínuo, mas
emerge de unidades discretas de informação e interacção, em que cada tripleto
de spins poderia ser a menor unidade
dinâmica, semelhante a um rotor temporal fundamental que vibra na malha
quântica da realidade.
Fig.5
- Representação do nanomotor trifásico à escala de Planck, comparável ao
tripleto de spins gerador do
espaço-tempo.
Neste modelo os
três vectores de spin 𝑆1, 𝑆2,
𝑆3 formam um triângulo equilátero, e as interacções
de acoplamento 𝐽12, 𝐽23, 𝐽31
são os vínculos dinâmicos entre os nós quânticos.
O movimento
interno em sentido anti-horário representa o Holomovimento de David Bohm, e a
seta vermelha simboliza a emergência da direcção do tempo (aquele percebido
passado-presente-futuro).
Esta proposta de modelo fisicalista, fazendo a síntese de alguns conceitos da física quântica com estruturas fenomenológicas como aquela temporal de Husserl, sugere que o tempo possa emergir de uma rotação cíclica de informação à menor escala de Planck, tal como um “motor” elementar, constituinte celular da matriz cósmica da Consciência.
Expandindo o
modelo do “nanomotor trifásico” de spins
à dimensão de Planck para o contexto cosmológico, o passo seguinte seria propor
uma visão onde o Universo, na sua génese e evolução, emerge como uma rede
coerente de interacções de spins
fundamentais, funcionando como geradores locais do espaço-tempo.
Assim, cada
tripleto de spins (passado, presente
e futuro) forma uma célula topológica mínima de tempo, como vimos um triângulo
dinâmico em rotação. Estes triângulos, conectando-se em tetraedros, formariam
uma malha de quantização do tempo e do espaço, servindo como se fossem “átomos
do tempo”. Seriam os quantas do
tempo!
A rede cósmica tridimensional surgiria da multiplicação dessas células numa rede tridimensional formando um espaço dinâmico que evolui conforme a reorganização permanente dos estados quânticos locais. O Universo seria, então, uma “teia giratória” de ressonâncias que se auto-organiza a partir de condições iniciais quânticas. Mais uma vez, faz-nos lembrar cosmogonias ancestrais.
A fase
inflacionária inicial do Universo poderia ser interpretada como uma aceleração
de ressonância ou uma transição de fase da rede de tripletos, onde os
acoplamentos de spins mudam
abruptamente, gerando expansão geométrica por coerência angular não local – a
explicação para as flutuações quânticas do vácuo, que segundo alguns
cosmologistas, estariam na origem do Universo.
Por sua vez a gravidade mais não seria que um defeito topológico. As ondulações ou imperfeições na rede de tripletos gerariam curvaturas, interpretadas como gravidade, explicando abordagens como as de Verlinde ou da gravidade quântica em laços, assim como as ideias subjacentes da gravidade como emaranhamento holográfico ou defeito topológico de spins.
O tempo, encarado do ponto de vista cósmico, apresentar-se-ia como uma frequência de ressonância global. Emergiria da frequência dominante da rede, gerada pela média dos “giros” dos tripletos. As flutuações locais naqueles “giros” causariam dilatação ou contracção temporal, correspondendo às variações registadas do tempo relativístico.
Não sei se este
modelo será verdadeiro ou se representa de forma aproximada a realidade.
Contudo, sei que representa a minha busca pela verdade e encontrei nele alguma
beleza que me cativou a expô-lo. Fico pela assumpção de que a divagação
filosófico-científica constitui uma abordagem importante.
Post scriptum
Estávamos a dar
por terminado este assunto, quando nos chegou de novo à mente a lembrança da
obra de Júlio Verne, “Paris no século XX”.
Nesta obra ficcionista, escrita em 1863, mas só publicada em 1994, 131 anos
mais tarde, porque o seu editor, Pierre-Jules Hetzel, não a considerou credível
e perspectivou vendas muito fracas.
Descreve uma
Paris de 1960 e uma civilização tecnologicamente avançadas, com automóveis
(onde antevê o motor de combustão com um pormenor incrível), redes eléctricas,
telecomunicações, correio electrónico, TGV, décadas antes de sua materialização
real, e que surpreende pela sua informação científica consistente e sobretudo
pela sua actualidade como antecipação sociológica (2025).
A visão de Júlio
Verne parece confirmar algo que hoje associamos à "visão remota" (remote viewing), ou seja, uma forma de
percepção não-local ou de Consciência expandida no tempo e no espaço, querendo
confirmar as nossas propostas.
O fenómeno designado
por "remote viewing", explorado
por programas militares como o Stargate
Project nos EUA, baseia-se na ideia de que a mente pode aceder a informações
além das restrições do espaço-tempo clássico, vindo ao encontro das teorias actuais
dos modelos quânticos não-locais e de entrelaçamento, agora explorados pela
computação quântica, interacções quânticas além da causalidade linear e pela
nossa proposta do modelo relativo à Teia Informacional Fundamental.
Este modelo ao acoplar
múltiplos tripletos numa rede coerente, cria uma estrutura topológica dinâmica,
que permite codificar padrões de memória (retrospectiva), simular projecções
temporais (prospectiva) e manter coerência entre regiões distantes da rede
(presente expandido) de acordo com o modelo husserliano.
A Consciência
(como Campo quântico) unifica a ideia de Holomovimento de David Bohm e à temporalidade
subjectiva de Husserl, podendo aceder a regiões do espaço-tempo por um efeito
de ressonância topológica.
O que Júlio Verne
descreveu naquela obra deverá ter sido uma “captura” visionária arquetípica,
originada numa excitação coerente na TIF.
O modelo de
tripletos de spins oferece uma
linguagem formal para descrever fenómenos subjectivos como antecipação criativa
(intuição, insights) e visão remota,
propondo que estados futuros podem ser alcançados através de uma topologia
quântica coerente da Consciência.
Júlio Verne, neste contexto, pode ter sido um sintonizador sensível a padrões futuros da malha informacional, acedendo-os por estados alterados da Consciência expandida.
Notas
(1) Edmund
Husserl (1859 – 1938), foi um filósofo e matemático austro-alemão, considerado
o pai da Fenomenologia, uma abordagem filosófica que procura descrever a
estrutura da experiência consciente a partir da perspectiva da própria Consciência.
Formado em
matemática, desenvolveu uma nova forma de pensar a relação entre sujeito e
objecto, rompendo com o empirismo e o psicologismo dominantes na época.
Um dos seus
grandes legados foi a sua análise da experiência do tempo. Visto como não sendo
um dado externo, mas algo que é constituído pela própria Consciência. Deste modo,
propôs um modelo em que a Consciência do tempo envolve três momentos: a
Retenção ou o eco do que acaba de passar, a Impressão, o momento presente
vivido, e a Protensão vista como a antecipação do que está por vir. Este
tripleto de fluxo, ao invés de se mostrar sucessivo ou sequencial, é
simultâneo, pois cada momento da experiência temporal está entrelaçado com os
outros.
Nesta nossa
proposta a estrutura temporal (t) descrita por Husserl será encarada sob um
aspecto geométrico, como um triângulo dinâmico, onde os vértices representam o
passado – retentio (t−1), o presente – impressio (t) e o futuro – protensio (t+1),
dando origem, na nossa opinião, a uma proposta de modelo de spins acoplados, que se influenciam
não-localmente, ou mesmo à ideia de secções triangulares derivadas dos Cones de
Luz do espaço-tempo relativístico.
Fig.7 - Edmund Husserl, c.
1930.
Fonte: Archiv für Kunst und Geschichte, Berlin.
É da sua autoria a frase “A consciência não é algo que se localiza no tempo, mas algo a partir do qual o tempo se constitui.”, (Vorlesungen zur Phänomenologie des inneren Zeitbewusstseins). Assumimos que o “agora” não é um ponto fixo, mas um ponto de condensação no sentido em que carrega "ecos" do passado e "sombras" do futuro, tal como um nó quântico informacional. Embora Husserl nunca tenha falado directamente em física ou estruturas quânticas (cujos fundamentos já existiam com Max Planck, em 1900, a ideia fundacional da quantização da energia, Einstein em 1905, Niels Bohr em 1913, com o modelo quântico do átomo de Hidrogénio, os contributos essenciais de Erwin Schrödinger (1926), Werner Heisenberg (1927) e de Paul Dirac), contudo o seu modelo de consciência como campo intencional e auto-organizado pode ser hoje reinterpretado como um sistema de informação coerente, antecipando ideias ligadas aos Campos de informação quântica, a outros modelos de consciência distribuída e a possíveis arquitecturas temporais não lineares, que exploramos.
(2)
Imagine um flash de luz e pense num evento como, por exemplo, uma lâmpada acesa
num instante específico e num ponto do espaço. A luz sai desse ponto em todas
as direcções, como uma esfera que cresce com o tempo. Se olharmos isso no
espaço-tempo (em vez de só no espaço), esta esfera crescente tranforma-se num cone.
Assim, o Cone do Futuro
representará tudo o que a luz (e qualquer influência causal) pode atingir a
partir daquele evento, tudo o que pode acontecer depois daquele ponto, enquanto o Cone
do Passado representará então tudo o que poderia ter influenciado esse evento
(vindo a uma velocidade menor ou igual à da luz), ou seja tudo o que poderia
ter causado o evento.
Fora dos cones situam-se os eventos que estão para além do alcance causal, que não poderiam ter
influenciado nem sido influenciados.
Normalmente estes
conceitos são expressos de forma gráfica em que o eixo vertical e o eixo
horizontal representam respectivamente o tempo e o espaço (este último para
simplificar é visto apenas numa direcção).
O cone cresce para cima, sendo o futuro possível e para baixo como o passado possível. Genericamente, o gráfico mostra o que pode causar o quê e define os limites da comunicação e da interacção física. Tornou-se uma ferramenta essencial na Teoria da Relatividade de Einstein.
(3)
A ligação trina baseada na geometria mínima refere-se à estrutura mais simples
e estável de interligação entre três unidades fundamentais de informação
quântica (ou "nós"/nodos). Na nossa proposta de teia quântica pode
ser compreendida como a forma mínima de acoplamento entre três nodos quânticos,
representando estados distintos (passado, presente, futuro).
Geometricamente,
forma um triângulo, a superfície bidimensional mínima capaz de manter uma
coerência topológica entre três vértices. Faz lembrar o conceito pitagórico.
Fig.8 – Ligação trina
Em modelos de spin, esta ligação é reflectida por
termos de acoplamento simétrico como 𝐽12, 𝐽23, 𝐽31, que conectam os estados. Esta geometria
trina, pode ser entendida como uma estrutura fundamental do tempo
fenomenológico, semelhante ao diagrama de Husserl com Retenção, Presença
Primordial e Protensão.
No plano
quântico, representa unidades mínimas de coerência informacional, cuja
geometria pode estender-se para formar tetraedros (3D) e depois malhas mais
complexas (a rede quântica de spins).
Afinal, na nossa
análise, constitui o conceito básico do Holomovimento (de acordo com David
Bohm), onde a realidade desdobra-se em múltiplas direcções a partir da tríade
fundamental da interacção. O Holomovimento
é como a respiração cósmica do Universo — um fluxo constante entre o visível (a
Ordem Explícita) e o invisível (a Ordem Implícita), onde tudo está conectado
com tudo, onde cada parte do Universo carrega informações do todo — não localmente,
mas de forma holográfica.
Adenda
Este gráfico tenta resumir os conceitos
defendidos nos textos “Uma tentativa de síntese”, “Tempus Machina” e “Um Modelo
Topológico e o Tempo Husserliano da Consciência”.
João Porto e Ponta Delgada, 10/04/2025