segunda-feira, 1 de abril de 2024

SOMOS TODOS ZARASTRUSTA

 

    Faravahar, o “Sol Alado”


Falar sobre Ahura Mazda sem referir o Zoroastrismo, Zarastustra ou Zoroastro, o Culto Solar, do Fogo e de Mitra, é ter uma visão unilateral e truncada de culturas, de que somos ainda herdeiros, pertencentes a um conjunto de povos de uma imensa região geográfica que se estendia desde o norte da Índia, Tasjakistão, Afeganistão, Irão, Assíria, Mesopotâmia (o Crescente Fértil), a antiga Pérsia. Convulsionada por milénios de lutas fratricidas, de guerras intestinas e de invasões e fusões de povos e etnias. Contudo, nada obviou a que as tradições culturais desta amálgama de populações da Ásia central e médio oriente (indo-iranianos), fundamentadas nas tradições milenares védicas (civilização do Vale do Indo), se reflectissem posteriormente em todas as teologias e teogonias, desde os mitos gregos, ao império romano até aos rituais exotéricos actuais do catolicismo ou dos ocultos cabalísticos traduzidos em metáforas de tratados alquímicos como o “Rosário dos Filósofos”, - Rosarium philosophorum sive pretiosissimum donum Dei, editado no século XVI no De Alchimia Opuscula complura veterum philosophorum.

Como princípio monista já presente no ramo extinto do Zurvanismo, emanação de Zeruan Akerna, o “Um”, o “Único”, o “Tempo Sem Limites”, o Chronos grego), Mazda (o “Onisciente”, a designação mais antiga) e Ahura (o “Governador” introduzido por Zoroaster Spitāma), ou Ormuzd (ao reunir as duas designações no persa), representa simbolicamente a deidade criadora e sustentadora do Universo, que no Hormazd Tasht dos Yasht (abreviadamente Yt), - colecção de 21 hinos, supostamente escritos por Zoroastro, cada um invocando uma deidade zoroastriana na linguagem antiga Avestan ou língua “gáthica”, - aparece referido por mais de vinte títulos, entre os quais o “Eu Sou”, curiosamente também presente na Cabala hebraica, um dos sete nomes de Deus.

Zoroastro ou Zarathushtra, tal como Manu e Vyasa na Índia, é a designação da reencarnação de vários avatares (serão 13 os mencionados no Dabistãn [1], de acordo com H. Blavatsky), o último nascido no fim do segundo milénio a.C., algures na Ásia Central entre os actuais Uzbekistão e Tasjakistão. Esta linha de profetas citada pela primeira vez por Aristóteles (datando-o de 9600 anos antes de Platão) seria o sétimo Zoroastro. Outro avatar teria surgido 4000 a.C.. Segundo Annie Besant o primeiro Zoroastro dataria de 20.000 anos atrás (Zoroastrianism, p. 7; Four Great Religions, 1897) e de acordo com as escrituras Zoroastrinas, o Avesta, ter-lhe-iam sucedido Gayomard, Hoshang, Tehmuras, Jamshid, Faridun. Finalmente Zaratrusta Spitāma terá sido o último e manifestar-se-á no “Julgamento Final”.

Impossível deixar de referir que a antiga língua Avestan tem forte afinidade linguística e histórica com o sânscrito Rigueveda e pressupõe-se ser mais antiga do que a língua usada para escrever o resto do Avestá ou “palavra da vida“, o "avéstico mais recente". Interessante notar que o termo ahura (governador) no Avestan está linguisticamente relacionado com asura (trevas), termo hinduísta para designar os “anjos caídos na Terra”, entre os quais figura Mithra – o correspondente védico e hinduísta Mitra ou ainda Maitreia, o Bodisatva na tradição budista que surgirá depois de Sidarta Gautama.

Estas afinidades permitiram estabelecer a existência de uma origem cultural e linguística comum destes textos.

De realçar a ligação posterior à Ásia Menor e á Anatólia através da tradição mitológica grega Avestá Mithra conduzindo às várias variantes com Apollo, Helios e Hermes (sempre presente o Culto Solar) e ainda mais tarde (146 a.C.) à figura dos Mistérios romanos Mitraicos ou Culto de Mitra. Uma ligação profunda ao dualismo zoroástrico (sempre a presença da luta entre os pólos opostos, entre o bem e o mal, entre o espírito e a matéria).

O culto Mitraico romano envolve sempre a tauroctonia simbólica e a partilha de um banquete com o deus Sol: Os açorianos Terceirenses talvez sejam os últimos guardiões deste ritual, sem o saberem, com as touradas e os banquetes do “5º touro”, festejam Mitra [2].

Ahura Mazda, representado pelo Faravahar, símbolo solar do pré-Zoroastrismo , o “Sol Alado”,associado à divindade e à realeza no antigo Egipto dinástico, onde representava Hórus na cidade de Edfu, estendia o seu simbolismo universal também na Mesopotâmia, Anatólia e Pérsia.

"Sol Alado de Tebas” (Egyptian Mythology and Egyptian Christianity por Samuel Sharpe,1863)

O símbolo solar encarnado materialmente no ser humano sob a designação de “fravashi” ou o espírito individual (Atma, em Avestan “aquele que foi escolhido para exaltação”), onde na dimensão material irá sofrer as provações desenvolvidas pela dualidade da luta entre o bem e o mal. Porém no colapso material do corpo físico e ao quarto dia após a morte, a alma ou corpo étereo (“urvan”) separa-se do “fravashi” incorporando-se na unidade dimensional de Mazda, onde acumula as experiências e a sabedoria das sucessivas reencarnações.
No zoroastrismo todas as coisas animadas ou inanimadas possuem uma centelha deste espírito “fravashi” que evolui gradativamente de acordo com a complexidade da matéria inorgânica a orgânica como nela se acumulasse a energia solar radiante sob a forma de ligações electroquímicas sempre mais complexas.
Nos tempos correntes “O Leão e o Sol” é um dos símbolos principais do Irão. Esteve presente na sua bandeira nacional até à revolução de 1979 que instalou a Republica Islâmica.

“O Leão e o Sol” na bandeira nacional do Irão


 

Bandeiras do Tasjakistão (à esquerda) e do Uzbekistão


Como já referimos, Zurvã ou Zeruan Akerna é o pai dos dois opostos que representam o Bem, Ahura Mazda e o mal Arimã. De Ahura Mazda (o Logos) emanam por sua vez dois aspectos do próprio, outra dualidade, também de carácter polar e masculina: Spenta Mainyu e Angra Mainyu, que representam, de uma maneira geral, a partilha entre duas dimensões, a do Espírito e a da Matéria, a da Vida e a da Forma, Luz e Trevas, representada na constituição septenária humana e da terminologia teosófica, a natureza dual da mente - de um lado Budhi-Manas e do outro Kama-manas. 

A completar o esquema dualístico, outra deidade fazendo parte da trindade zoroastriana, agora de carácter feminino, é designada por Ārmaiti, a “Sabedoria Criativa” através da qual foi concebido o Universo.

No Gnósticismo, Sophia (Sabedoria) era a sizígia divina de Cristhus (os Éons complementares feminino-masculino, as forças simétricas da natureza) e não apenas uma simples palavra significando sabedoria, tal como nas escrituras zoroastriana do Avesta.

É atribuída à constituição septenária zoroastriana esta estrutura: Do lado direito de Ahura Mazda e com carácter masculino estão: Vohu Manah ou Vohūman correspondendo a Budhi; seguida por Asha Vahishta e por Khshathra Vairya ou Kshatraver, o Manas e Kama-manas.

Do lado esquerdo de Ahura Mazda e com carácter feminino têm assento Spenta Ārmaiti ou Spendarmad representado possivelmente o plano astral; Haurvatāt ou as energias associadas à vitalidade ou ao Prana, e finalmente Ameretāt ou etéreo fisíco.

Tendo em conta o próprio Ahura Mazda (o plano Átmico), somam sete os diferentes aspectos desta cosmogonia dos quais sobressaem sempre os pólos opostos - Spenta Mainyu versus Angra Mainyu. Estes opostos ou Deva, linguisticamente relacionados com os devas sânscritos, tomam também designações: Āka Manah, Indra, Saurava ou Sauru, Nāonghaithya ou Taromad, e os gémeos Tauru e Zairicha. Lembremo-nos que esta organização dual está presente em Pistis Sophia onde o Karma, “a matéria do Barbelo” que a “Potência de Sabaoth”, designação aplicada para “o Todo Poderoso”, a “Verdade”, é a informação relevante dos “arquivos akáshicos” que definem o futuro. Assim, Sabaoth, que “saiu da Região da Direita”, o Futuro, lança esta informação “a todas as Regiões daqueles da Esquerda”, que constituem o Passado das acções humanas, de modo que a “Veste de Luz” passa a estar em consonância com o respectivo Karma. Cfr. Pistis Sophia, final do Capítulo 63, pp 159.

Segundo Annie Besant o primeiro Zoroastro revelou a natureza sagrada do Fogo e a sua importância nos rituais zoroastrinos quando invocado a partir do profundo brilho do “akasha”, o Agni ou a antiga designação védica Ātar ou Āthrā. As relações são mais que muitas e evidentes!

Exceptuando Ahura Mazda, a estrutura em pólos opostos gera hostes de “demónios”, que parecem corresponder na sua descrição e características aos “elementais” e às suas actividades naturais ou às “Potencias” em Pistis Sophia. Por esta razão o Fogo (um dos 4 elementos alquímicos), um dos filhos de Ahura Mazda e presente em todos os templos, adquire uma importância central no zoroastrismo. Tal como no hinduísmo, o Fogo é o mensageiro entre o céu e a terra e constitui um elemento sagrado. 

O ritual da manutenção do Fogo sagrado pelas Vestais e o culto a Vesta que presidia ao Fogo doméstico em todos os lares romanos, foi a expansão desta tradição até a estes tempos tardios.

Ahura Mazda adquire um papel central na cosmogonia zoroastrina. Esta, apresenta-se dividida em quatro períodos de ciclos de 12.000 anos correspondentes a signos do Zodíaco.

Tudo se desenrola em torno de polaridades, entre Spenta Mainyu (a Luz) e Angra Mainyu (as Trevas). No primeiro ciclo Angra ou Āhriman mantém-se inactiva, mas no segundo dá-se a criação dos primeiros átomos, da terra, da água. do céu, das plantas, dos animais e dos seres humanos e em consonância dos Devas por Angra Mainyu que se opõe a Spenta. Aqui os “fravashi” encarnam no homem para se oporem a Angra. Durante o terceiro período, chamado de “Primeiro Período Humano”, as forças de Angra vão sendo substituídas pelas forças de Spenta. Então no último período dar-se-á o “Julgamento Final” por Ahura Mazda com o advento do avatar Zarathushtra Spitãma em que as forças do Bem derrotam as do Mal. Uma cosmogonia onde o Cristianismo primitivo foi beber. Em Pistis Sophia, o “Éon Cristhus” irá também restaurar a harmonia no mundo dos Éons, curando a “doença” no mundo material em consequência da catástrofe na ordem ideal, dando ao homem o conhecimento e a Sabedoria que irá resgatá-lo do domínio da matéria e do mal.

Tal como Dante Alighieri na sua Divina Comédia o Zoroastrismo possui um texto religioso, o livro de Arda Viraf (talvez Dante se tenha inspirado neste texto), onde um zoroastrista viaja pelo mundo dos mortos para provar a justeza da doutrina de Zoroastro. Para tal este viajante, Wirãz, toma um alucinogénio, uma mistura de vinho, canabis e Haoma ou Soma, que liberta a sua alma até às outras dimensões e onde é esperado não pela bela Beatriz, mas pela bela Dên, que igualmente representa a fé e a virtude. Do mesmo modo que Dante é guiado pelo divino Vergílio, aqui a companhia é feita pelo divino Srosh. Deste modo, depois de atravessar a ponte Chinvat que separa os dois mundos, é conduzido aos lugares reservados aos virtuosos e fiéis à doutrina, percorrendo o caminho das estrelas, o da Lua e o do Sol. Aqui encontra Ahura Mazda que lhe mostra as almas dos abençoados, vivendo realidades virtuais ideais mas semelhantes às vidas terrenas. Depois desce, guiado até aos infernos onde lhe é mostrado os sofrimentos atrozes infligidos aos fracos pecadores. Deste modo concretiza-se o objectivo de Ahura Mazda quando lhe transmite que o Zoroastrismo é a única via correcta para uma vida próspera e livre de adversidades.

Chegados até aqui não poderíamos esquecer os Parsis e a sua ligação à Teosofia que é imensa e genética. Considera-se o Zoroastrismo a religião oficial dos Parsis. 

No Glossário Teosófico [3] diz H. Blavatsky que Ormazd ou Ahura Mazda (Zend-Avesta) é o deus dos zoroastristas ou dos parsis modernos. Simbolizado pelo Sol, como sendo a “Luz das Luzes”. Esotericamente, ele é a síntese de seus seis Amshaspends ou Elohim, e do Logos criador.

O Coronel Olcott, fundador da Sociedade Teosófica com H. P. Blavatsky, escreveu nos seus diários constituídos por seis volumes, extractos de “Old Diary Leaves”, que a comunidade Parsi, na Índia, sempre votou grande afecto e amizade com a Sociedade Teosófica, colaborando e apoiando materialmente as suas iniciativas. Tanto Hindus como Parsis envolveram-se directamente na edificação do ramo da Sociedade Teosófica em Bombaim. Foram proeminentes teosofistas zoroastrianos, Navroji Dorabji Khandalavala, Kavasji Merwanji Shroff, Sorabji J. Padshah, Bahman Pestonji Wadia e P. Iyaloo Naidu entre muitos outros.


Templo Zoroastriano de Adyar. Fonte: Arquivo da Sociedade Teosófica Americana.


Sede da Sociedade Teosófica em Adyar desde 17 de Novembro de 1882


No decorrer dos anos este centro teosófico transformou-se num lugar de estudos e meditação para todas as religiões tendo sido criados um templo Hindu Bharata Samaj, um budista, outro Jainista e outro Sikh, bem como a igreja católica de São Miguel de Todos os Santos, uma mesquita, um templo zoroastriano e uma sinagoga judaica sem esquecer ainda um templo maçónico. Toda esta importante estrutura física consubstanciava um dos princípios teosóficos promotores do estudo comparado das religiões procurando eliminar a ignorância, a intolerância e promover a paz.

É assim, que no volume 1 da colecção Agnimile do Círculo de Estudos Orientais da Nova Acrópole, 1ª edição 2019, “A Chave para a Teosofia” p.59, Helena Petrovna Blavatsky define os propósitos da Teosofia:

“1. Formar o núcleo de uma Irmandade Universal da Humanidade sem distinção de raça, cor ou credo.

2. Promover o estudo das Escrituras Árias, entre outras, das religiões e das ciências do Mundo, e reivindicar a importância da literatura Asiática Antiga, nomeadamente, aquela das filosofias Brãhmânica, Budista e Zoroastrista.

3. Investigar os mistérios ocultos da Natureza sob todos os aspectos possíveis, especialmente os poderes psíquicos e espirituais latentes no Homem. Estes são, em linhas gerais, os três principais objectivos da S. T.".

 

Notas

[1] O Dabestãn ou “escola das religiões” é uma obra persa datada de 1655 d.C., que examina e compara as religiões Abrahamicas, Dhármicas e outras do século XVII da Eurásia e do sudeste, cuja autoria se atribui com alguma incerteza a Mollah Mowbad.

 

[2] Na ilha açoriana da Terceira, celebram-se anualmente entre o dia 1 de Maio e até final de Setembro, dezenas de touradas à corda, onde são “corridos” 4 touros seguindo-se o conhecido na gíria popular por “quinto touro”. Este “5º touro” consiste em banquetes realizados por particulares mas abertos à participação da comunidade num acto de amplo convívio e celebração fraternal. Estas festividades marcam um período de 6 meses e constituem globalmente um acontecimento inequivocamente identitário do povo terceirense, que cimenta o “espírito” festivo e democrático que o caracteriza. Estas celebrações unem sempre um acto “sacrificial” simbólico do touro a um banquete de partilha, tal como no culto mitraico romano.

 

[3] Helena Blavatsky, Glossário Teosófico, Edição CLUC – Centro Lusitano de Unificação Cultural, p. 273.

 


sexta-feira, 15 de março de 2024

Pitris, deidades solares e lunares

 

      Fonte: IA Bing Image Creator da Microsoft

Dois acontecimentos se entrecruzaram na minha mente, activando provavelmente as sinapses de dois neurónios, configurando, mais uma vez, talvez a expressiva e profunda mensagem que Miguel Ângelo deixou no tecto da Capela Sistina. Parece ser um processo recorrente!

Um deles resultou da leitura de um trabalho científico, produto de 11 investigadores oriundos das mais diversas e conceituadas academias do mundo europeu, americano, africano e do médio-oriente. O outro, que provocou a ignição da labareda intuitiva, deveu-se também a uma leitura feita em tempos anteriores, e editada dois séculos antes, da obra de Blavatsky, a Antropogénese.

Aquele, o trabalho de natureza científica a que me refiro, deve a sua publicação ao Journal of Modern Physics, Volume 10, de Janeiro de 2024 sob o extenso título Extraterrestrial Life in the Thermosphere: Plasmas, UAP, Pre-Life, Fourth State of Matter. Nele se revela um conjunto de hipóteses alicerçadas em numerosas investigações experimentais, como é apanágio daquela metodologia onde se exerce a esclarecedora actividade do escalpelo e do bisturi, e ainda de outros tantos factos iluminados pela inteligência humana, sobre um assunto que tem despertado a maior curiosidade mundial e alvo das mais acutilantes teorias da conspiração.

Refiro-me à existência do fenómeno OVNI, acrónimo da oculta designação de Objectos Voadores Não Identificados, também conhecido na língua inglesa por UFO - Unidentified Flying Object, mais recentemente designados por UAP - Unidentified Aerial Phenomena ou Fenómenos Aéreos Não Identificados, e que a Wikipédia esclarecidamente diz ter sido “utilizado no âmbito da National Aviation Reporting Center on Anomalous Phenomena – NARCAP”. Por muitas que sejam as siglas, mantêm-se contudo o seu carácter e origem absolutamente desconhecidos.

No entanto, aquele trabalho de investigação de 2024, resulta da análise acurada de imensos fenómenos registados e relatados por cosmonautas e astronautas (e talvez por taikonautas chineses, mas não divulgado) ao longo de todos estes anos envolvidos na exploração espacial) e antecedendo mesmo a década de 40 e o período da Segunda Guerra Mundial (então designados por “Foo fighters”).

Ali é referida a ligação do fenómeno UAP (mas certamente não de todos, como é salvaguardado) com a descoberta de plasmas com dimensões que atingem por vezes quilómetros de dimensão e que se manifestam na Termosfera terrestre, a zona fronteiriça com o espaço intergaláctico.

O plasma é tido como o quarto estado físico da matéria (depois dos estado sólido, liquido e gasoso) e origina-se na ionização das partículas subatómicas da matéria gasosa quando sujeitas a altas temperaturas cujo efeito dissocia os componentes do átomo em electrões e respectivos núcleos.

Diz aquele artigo do Journal of Modern Physics no seu Abstract, que “os “Plasmas” de tamanho superior a um quilómetro e comportando-se como organismos multicelulares tem sido filmados durante as 10 missões da NASA do Space Shuttle, acima das 200 milhas da superfície terrestre na região da Termosfera. Estes “plasmas” auto iluminados são atraídos e podem “alimentar-se” com a radiação electromagnética. Possuem diferentes morfologias: 1) cone, 2) nuvem, 3) donut, 4) esféricos – cilíndricos; e foram filmados evolucionando para cima e para baixo desde a Termosfera até às tempestades atmosféricas; agregando-se às centenas e interagindo com os satélites artificiais gerando actividade electromagnética; aproximando-se dos Space Shuttles.”

E mais adiante, de forma inequívoca, é-nos dito que os “Plasmas não são biológicos mas podem representar uma forma de pré-vida que através da incorporação de elementos comuns existentes no espaço, podem resultar na síntese de RNA”. Esta asserção é novamente vincada confirmando que estes plasmas possuindo cargas eléctricas polarizadas podem formar ”cristais de plasma” que formam sistemas helicoidais podendo evoluir para estruturas de dupla hélice semelhante ao DNA. Inclusivamente a transferência de cargas eléctricas poderia configurar um fenómeno semelhante à transferência horizontal de genes. Contudo, por mais de uma vez, assegura-se que de momento não existirem evidências dos plasmas conterem DNA, nucleótidos ou aminoácidos (já foram descoberto 92 aminoácidos no espaço intergaláctico), apesar de possuírem propriedades que os acercam das características de uma vida pré-biótica, incluindo estruturas do tipo parede celular, formadas por correntes eléctricas bipolares, tais como as estruturas bipolares das paredes celulares orgânicas. As similitudes são impressionantes quando nos mostram assumir comportamentos complexos tomando formas esféricas, ovóides, hélicoidais e apresentando muitas vezes um núcleo central protegido por camadas iónicas duplas de carga positiva e negativa, tal como as estruturas celulares dos organismos biológicos e ainda apresentarem fenómenos de pulsação que imitam movimentos de deslocação. Deslocam-se ora em linha recta, ora virando abruptamente 90 e 180 graus, ora dirigindo-se a outros plasmas e canibalizando-os energeticamente. 

Quando observados da superfície terrestre poderão assim configurar a presença e os movimentos de alguns UAP`s.

De tal modo são as semelhanças com os conhecidos organismos vivos, que dois investigadores, Lozneanu e Sanduloviciu, propuseram que estes plasmas semelhantes a entidades celulares constituíam uma forma de vida extra-terrestre completamente diferente daquela que conhecemos. De acordo com a Academia Russa das Ciências, na pessoa de V. N. Tsytovich, “Estas estruturas de plasmas complexos e auto organizados exibem todas as propriedades necessárias que as qualificam candidatas à matéria viva inorgânica”. Tanto Tsytovich como Teordorani argumentam que as condições necessárias para gerarem estes plasmas vivos são comuns no espaço potenciando a que sejam uma forma de vida abiogénica extra-terrestre muito comum.

Figura 1 – Plasmas com mais de 1 km de extensão configurando cones, donuts, formações nucleadas e espiraladas, registadas pela missão shuttle STS-75.
Fonte: Extraterrestrial Life in the Thermosphere: Plasmas, UAP, Pre-Life, Fourth State of Matter, Journal of Modern Physics, Vol 10, 2024

Verificou-se que estes plasmas reagiam às tempestades geomagnéticas, às fulgurações solares e às EMC`s – Ejecções de Massa Coronal solares, às mudanças de temperatura em resultado de eclipses e às ondas atmosféricas provocadas por flutuações electromagnéticas ambientais como radiação rádio, a Ressonância Shumann e fluxos de protões e electrões, emanados pelas tempestades solares. 
O Sol sendo o maior plasma na nossa vizinhança, retoma mais uma vez um papel central, ao condicionar o comportamento destes plasmas tidos como estruturas pré-bióticas que antecederam e são precursoras da vida como a conhecíamos até agora. 
Com isto reavive-se a mitologia solar! Fazemos parte de um grande organismo vivo, na certeza que estamos a desconstruir concepções e ideias anquilosadas do que considerávamos ser a Vida.

Está na hora de retomar “o fio à meada”. O fio de Ariadne que nos levará ao que nos propusemos logo no início deste tema. Para tal faremos referência a H. P. Blavatsy e à Doutrina Secreta (D.S.).

Para que não subsistam dúvidas sobre as opções acerca da evolução defendidas pela filosofia teosófica, transcrevo da D. S. - antropogénese: “Se o homem é realmente o Microcosmo do Macrocosmo, o ensinamento nada tem de impossível e é de todo lógico. Porque o homem se converte em Macrocosmo para os três reinos que lhe são inferiores. De um ponto de vista físico, todos os reinos inferiores, excepto o reino mineral – que é a própria luz cristalizada -, desde as plantas até às criaturas que precederam os primeiros mamíferos, se consolidaram em sua estrutura física por meio da “poeira abandonada” pelos minerais e dos resíduos de matéria humana, provenientes de corpos vivos e mortos, de que se alimentam e lhes deram o seu corpo externo. Também o homem, por sua vez, se transformou, graças às transmutações alquímicas da Natureza, ao passar pelos cadinhos vivos dos animais.” (DS, pp187). Aqui se espelham as mais recentes ideias, de que “somos pó das estrelas”, de que somos o produto de uma vasta evolução de consecutivos reinos, originados na Terra Arqueana pré-biótica, onde os aminoácidos e nucleotídeos, agrupados nos primevos polímeros de RNA, fornecidos por meteoritos carbonáceos, aumentavam de concentração através de ciclos contínuos de fases húmidas e secas , “as transformações alquímicas da natureza” vistas à luz ocultista do século XIX.
No entanto surge na DS o conceito de “Construtores”, os Pitris Lunares e Solares, aquelas entidades pré-existentes de natureza um tanto “espiritual” que vão instilar no homem os seus conteúdos  e características.

Todas as mitologias estão recheadas por cultos lunares e solares.
Diz o Vishnu Purana, volume III, capítulo II, que os primeiros homens foram os Chhâyâs, emanados dos Pitris. Blavatsky faz-lhe referência: “É a encantadora história de Sanjna, a filha de Vishvakarman, casada com o Sol. Sanjna, “não podendo suportar os ardores do seu Senhor”, lhe deu a sua Chhâyâ (sombra, imagem ou corpo astral), enquanto se refugiava na floresta para praticar as suas devoções religiosas ou Tapas. O Sol, crendo que a Chhâyâ era a sua mulher, teve filhos com ela…”. (DS, pp191). Comparemos Sanjna à nossa Termosfera e Chhâyâ aos plasmas. O Sol através da sua intensa actividade, expressa nas ejecções de massa coronal, a matéria da sua própria natureza constituinte, e fulgurações explosivas de dimensão titânica, projecta no espaço interplanetário, potentíssimas correntes eléctricas, raios X e gamma e ondas rádio que vão criar corpos plasmáticos como se de filhos seus se tratassem. Estes, como vimos evoluem desde a Termosfera até à Ionosfera, comportando-se como seres vivos abiogénicos, podendo recolher material orgânico, por exemplo deixado pelas esteiras dos meteoritos carbonáceos.
Aqui parece residir a alegoria solar e dos respectivos Pitris.

Sabemos hoje que a vida na Terra surgiu entre 3,5 e 4,5 mil milhões de anos. Corolário provável de um conjunto de homeostasias como a nova força exercida pela gravidade de uma lua, a sua presença protectora em grande parte ao bombardeamento meteorítico tardio e a estabilidade magnética conferida à Terra e ao seu eixo, levaram a que o clima passesse a ser regulado por estações. 
Outras homeostasias: a Terra, ao ter sido impactada por Theia, adquire um núcleo interno, um acréscimo de água, placas tectónicas, ganha uma lua (agora uma parte significativa da antiga Terra) que cria sinergias com o novo planeta e tem assim condições para que a vida vingue e evolua.
Este acontecimento inesperado, e as sinergias criadas, terão acelerado ou mesmo justificado o aparecimento de vida. Um corpo planetesimal gelado que se encontrava na mesma órbita do que a Terra, num ponto de Lagrange L4, viria a fazer pender o prato da balança, sobretudo no que respeita à presença da água na futura Terra. Não fosse este acontecimento e a Terra seria apenas uma estrutura rochosa estérea muito semelhante a Vénus, sem um campo magnético e sem placas tectónicas. Por outro lado, a presença do efeito gravitacional da Lua induziu a uma oscilação muito pequena do eixo da Terra à medida que evolui em torno do Sol.

Segundo a Teosofia, e o seu sistema complexo de Rondas, Cadeias e Globos, a Lua é definida como um resíduo de um Globo muito maior, que foi o planeta físico da 3ª Cadeia mantendo a mesma posição na 3ª Cadeia que aquela mantida pela Terra na 4ª Cadeia e que irá desaparecer no futuro (na 7ª Ronda). A coincidência de eventos e as previsões parecem ser totais.
Esta será então o que parece ser a alegoria lunar e dos seus Pitris.

 Este sistema complexo, umbilicalmente ligado ao conceito de Constituição Septenária, estende-se à evolução planetária quando atribui a cada corpo do sistema solar, sob a designação de Globo, a existência simultânea de sete dimensões ou Globos, dos quais apenas um é materialmente visível. No seu conjunto formam uma Cadeia que agrupadas em ciclos de 7 definem uma Ronda em que foram percorridos 49 Globos. A doutrina postula que cada planeta evolui durante sete Rondas estando o nosso planeta presentemente a atravessar o período correspondente à 4ª Ronda. Os Puranas hinduístas designam os Globos por Dvipas sendo a Terra conhecida por Jambudvipa. 

É ponto assente que ambos os Pitris – lunares e solares, contribuíram para o aparecimento do homem. Os lunares por pertencerem à cadeia planetária da Lua, contribuíram com o conjunto de homeostasias que descrevemos anteriormente, designados por princípios inferiores pela DS. Decididamente aqueles que garantiram definitivamente as condições de equilíbrio e as bases para o surgimento da vida. 
Já os solares, referidos como Dhyan-Chohans, são os responsáveis por fornecer os atributos dos princípios superiores ou aqueles que emanados directamente do Sol, garantiram o aparecimento de soluções cumulativas de índole energética, que de abiogénicas e extra-terrestres – sob a forma de plasmas, evoluíram até formas superiores biológicas onde a consciência fez caminho no decurso de muitos éons.
Outras mitologias cosmogónicas construíram-se em torno destes dois princípios, sempre apresentados sob um carácter dualístico, por vezes adquirindo aspectos de género – feminino versus masculino, forças de cariz positivo-negativo, Yin-Yang.

O culto solar fez um longo percurso histórico nas tradições religiosas e culturais dos povos: surge nos deuses hinduístas védicos Savitr e Surya, que fazem parte dos Adityas, os sete deuses solares que representam, ao fim e ao cabo, as sete frequências de luz visível (as sete cores do arco-irís). As divindades solares são referência em todas as obras védicas: Surya aparece no Ramayana na figura do rei-macaco Sugriva e no Mahabharata, Kunti a mãe dos heróis Pandavas alimenta a culpa de ter dado vida a uma criança, fora do casamento e contra sua vontade, filha do Sol. 

Figura 2 - Savitar e Surya na sua carruagem de ouro, representam o Sol.
Fonte: Pieter Weltevrede, http://www.sanatansociety.com


Mais tarde vai estar plasmados na heliolatria grega do culto solar onde pontificavam os deuses Apolo e Hélio, este último adoptado posteriormente ao equivalente do deus romano Sol Invictus, transformado pelo imperador Aureliano na primeira divindade do Império pré-cristão.
No Egito dinástico, também surgem diversas deidades associadas ao Sol e aos cultos solares, onde se destacam os de Ámon, Rá, Hórus e Áton e Hator com papéis preponderantes nos mitos da criação revelados nos Textos das Pirâmides. Os cultos solares, atestando a sua importância, estiveram associados às grandes cidades egípcias, Hermópolis Heliópolis, Mênfis e Tebas.

A par dos mitos solares, os lunares e as suas deidades estão presentes em todas as mitologias (confira em https://es.wikipedia.org/wiki/Deidad_lunar). A deidade lunar em algumas mitologias adquiria poderes superiores à deidade solar, uma vez que tanto habitava a noite como o dia, para além de encobrir o Sol durante os eclipses. Era a deidade que representava a estabilidade cíclica que permitia, com o seu calendário próprio, as sementeiras, o florescimento das culturas agrícolas e a realização de boas colheitas. O eterno retorno vinculado à celebração dos ritos e à marcação da passagem do tempo.
As duas deiades representavam a Vida nos seus múltiplos aspectos: “Deste modo, os irmãos gémeos (Castor e Pólux) vivem alternativamente, um durante o dia e o outro durante a noite.” (DS, pp 138). Um é mortal e o outro imortal. A dualidade sempre presente na construção da Vida.

Voltemos àqueles plasmas abiogénicos, concebidos como estruturas pré-bióticas ( e portanto imortais), são como entidades “Construtoras”, os Devas solares e lunares, que albergam no seu seio os elementos essenciais ao surgimento da vida biológica (mortal), como a conhecemos. Diz Blavatsky na Doutrina Secreta: “Usando uma metáfora, embora insuficiente para exprimir a ideia completa, mas bem adaptada ao caso, diremos que esses Criadores (querendo referir-se aos Pitris), são como os raios numerosos do orbe solar; este permanece inconsciente da obra realizada por aqueles, e nela não intervém, enquanto seus agentes mediadores, os raios, servem de meios instrumentais em cada primavera - a aurora manvantárica da Terra - e fazem despertar e frutificar a vitalidade adormacida inerente na Natureza e em sua matéria diferenciada.” (DS, pp 175).
Nas alegorias exotéricas os Pitris estão sempre ligados ao fogo, o que é o mesmo que dizer aos plasmas, quarto estado da matéria. É assim que no complexo sistema dos cultos solares e lunares hinduístas as entidades mais elevadas e puras, designadas por Agnichvâtta-Pitris, os Devas ou ainda os Mânasa-Dhyânis, são as verdadeiras entidades solares, portadoras do “fogo” interior, que farão brotar a inteligência e a consciência; enquanto as lunares, conhecidas como Barhichad-Pitris ou os Prajâpatis inferiores, são aquelas entidades “criadoras” ligadas à formação da Lua e ao surgimento das condições materiais necessárias à vida no planeta Terra, como resultado da colisão com o proto-planeta Theia. De acordo com a DS iremos encontrá-los correspondendo às características dos Elohim, transmitidas pelas doutrinas cabalísticas e bíblicas, que posteriormente em éons de tempo de evolução, irão conferir o aspecto mórfico ou físico do futuro homem. Aqui associa-se outro tema defendido pelo biólogo Rupert Sheldrake e colocada em evidência pela recente descoberta do Electroma, ambos a reavivarem os conceitos ancestrais de Prana e Fohat.

Em conclusão, podemos seguramente afirmar que em resultado da convergência de dois eventos criaram-se duplas sinergias: de um lado os plasmas termosféricos criados pela actividade solar - o “fogo” -, e por outro da imprevista formação da Lua – na designação esotérica de “Cadeia Lunar” e que irá condicionar a existência da futura “Cadeia Terrestre” -, criam-se as condições necessárias e suficientes para que a vida apareça e com ela, na escala evolutiva, o futuro homem.
Corresponde isto à visão actual das coisas nos mais variados domínios da Ciência.

Poder-se-ia argumentar contrapondo com uma apreciação probabilística: a casualidade dos discursos esotéricos e exotéricos e aquele das estruturas existentes na Termosfera terrestre. Mas nem aqueles das teorias filosóficas nem as hipóteses científicas agora elaboradas em bases factuais, são construções casuísticas do pensamento humano. Devem-se ambas, por um lado a elaborados sistemas mitológicos exotéricos construídos durante milénios e fazendo parte da cultura da humanidade, e por outro, das descobertas resultantes de saturados investimentos no domínio da actividade aeroespacial e dos avanços do conhecimento humano realizados neste século.

Em qualquer caso, fica aqui lançado o repto a outras hipóteses que nos possam esclarecer sobre este intrincados assuntos ligados às doutrinas esotéricas milenares e reflectidas em todas as mitologias. 

Os véus que ocultam os verdadeiros mistérios da Filosofia Esotérica são densos e intrincados, e ainda hoje não se pode dizer a última palavra. Contudo, algumas pontas podem agora ser levantadas, proporcionando-se ao estudante realmente interessado certas explicações que até então lhe eram negadas.” (DS, pp 328).


Bibliografia

R. Joseph1*, C. Impey2, O. Planchon3, R. del Gaudio4, M. Abu Safa5, A.R. Sumanarathna6, E. Ansbro7, D. Duvall8, G. Bianciardi9, C. H. Gibson10, R. Schild11, 1Astrobiology Research Center, California, USA 2Department of Astronomy, University of Arizona, Tucson AZ 85721 3Biogéosciences laboratory, University of Burgundy, Dijon, France 4Department of Biology, University of Naples Federico II, Italy 5Dept. of Applied Physics, Palestine Polytechnic University, Hebron, Palestine 6Dept. of Research and Innovation, Eco Astronomy International Research Center, Tetouan, Morocco 7Space Exploration Ltd, Boyle, County Roscommon, Ireland. 8Dept. of Zoology, Oklahoma State University (emeritus), Stillwater, OK, USA 9Università degli Studi di Siena, Italy. 10Center for Astrophysics and Space Sciences, University of California (emeritus), San Diego, USA 11Center for Astrophysics, Harvard-Smithsonian (emeritus), Cambridge, MA, USA. Extraterrestrial Life in the Thermosphere: Plasmas, UAP, Pre-Life, Fourth State of Matter, Journal of Modern Physics, Vol 10, 2024.

Helena Petrovna Blavatsky, Doutrina Secreta – Antropogénese, Volume III, Editora Pensamento-Cultrix, Ltda., 1980.


João Porto e Ponta Delgada, 15 de Março de 2024


quarta-feira, 6 de março de 2024

RETROCAUSALIDADE: O FUTURO VINDO NA NOSSA DIRECÇÃO

 











"Tudo, entre os mortais, tem o valor do irrecuperável e do fruto do acaso. Entre os Imortais, em contrapartida, cada acto (e cada pensamento) é o eco de outros que no passado o antecederam, sem princípio visível, ou o fiel presságio de outros que no futuro o repetirão até à vertigem. Não há coisa que não esteja como perdida entre infatigáveis espelhos. Nada pode acontecer uma só vez, nada é preciosamente precário".

                                                    Jorge Luís Borges, O Alepf


Este mundo é cheio de paradoxos. Entre muitos, um deles foi até há pouco tempo remetido para as catacumbas do desconhecido e do indecifrável. Refiro-me ao paradoxo EPR ou paradoxo de Einstein-Podolsky-Rosen, base do abismo profundo que tem separado até aos nossos dias a Relatividade Geral da Mecânica Quântica.

No seu âmago residem duas concepções do mundo: uma ligada ao macrocosmo, a outra inerente ao microcosmo, ambas mantendo razões, pontos de vista e instrumentos de análise irredutivelmente próprios que não permitem conciliações teóricas e práticas, cada uma descrevendo o seu mundo à sua maneira. E ambas funcionando correctamente dadas as circunstâncias certas. Aliás a mecânica newtoniana continua a singrar nos domínios do aeroespacial e dos jogos de guerra.

Um dos pressupostos que as manteve afastadas era a ideia da existência do fenómeno de emaranhamento quântico que implicava a transferência de informação a velocidades instantâneas, supralumínicas, que colidiam com o limite imposto pela velocidade da luz de 299.792.458 metros/segundo. A interpretação da mecânica quântica da Escola de Copenhaga no que dizia respeito ao fenómeno do colapso da onda em partícula, implicava a existência de um “entanglement” ou emaranhamento instantâneo em todo o espaço.

Outro pressuposto envolvia a natureza da gravidade como força. Depois da concepção einsteiniana do espaço-tempo como um corpo de molusco, formado por curvaturas modeladas pelas titânicas massas dos corpos celestes, alguns como os buracos negros que tudo avassalam, outros que definem e mantêm a estabilidade das órbitas planetárias dos sistemas estelares, a cosmologia parecia assentar de forma segura numa descrição plausível e bela que de vez retirava do palco o éter, o espaço e o tempo absolutos e infinitos newtonianos. Contudo, nunca se encontrou um suporte para esta força, uma partícula, um bosão que a carregasse e transmitisse. Era absolutamente necessário à sua perseveração e consistência.

Contudo Schrodinger, com a sua célebre equação de onda, tratava o tempo de forma clássica estabelecendo que o tempo na mecânica quântica não é relativisticamente invariante, definindo que no colapso de onda existe claramente na sua descrição um “antes” e um “depois”, assunto que posteriormente em 1926 foi estabelecido matematicamente por Klein e Gordon, conhecido como o operador de Alembert, que estabelece uma relação entre energia, momento e massa dado pela equação:


E² = c²p² + m²c𑇕

(E a energia total de um objecto, p o momento, m a massa e c a velocidade da luz)


Para quem tem alguma noção básica de matemática, verá na resolução desta equação um aspecto dual em resultado do valor da raiz quadrada, aspecto dual que não está presente na resolução da equação de Schrodinger. Significa que o valor de onda assume uma propagação de ondas retardadas que se propagam de forma retardada no tempo (do passado para o futuro), e por outro lado, também se propagam em ondas avançadas que o fazem retroactivamente no tempo (do futuro para o passado). No caso vertente a equação de Schrodinger só apresentava uma solução de onda retardada, que vem do passado para o futuro.

Quando considerado, este aspecto fazia desaparecer o paradoxo EPR quando admitidas como reais as ondas do futuro para o passado, aquelas ondas construtoras de sintropia enquanto aquelas vindas do passado para o futuro eram construtoras de entropia. Assim, o tempo presente parece resultar do impacto constante entre sintropia e entropia. Revive-se o Trimurti hinduísta numa acção perene, Tamas (entropia), Sattva (tempo presente – a ilusória e ínfima estabilidade como veremos de seguida) e Rajas (sintropia).

Micro e macroscopicamente, a entropia definiria a lei universal da causalidade onde a causa antecede o efeito, passível de ser estudada e inventariada. Ao contrário a sintropia seria resultado do efeito antecedendo a causa, afinal o verdadeiro construtor do nosso mundo aceite como a realidade suprema – por detrás dela, a dualidade anima e animus de C. Jung, imponderável e mística, impossível de ser reproduzida e estudada pelas actuais leis da Física.

Em 1949 já Feynman com os seus diagramas interpretativos da electrodinâmica quântica, apontava que nos fenómenos de emissão e absorção no quadro das interacções das partículas subatómicas do Modelo Padrão, os emissores evoluíam do passado para o futuro enquanto os absorventes faziam-no do futuro para o passado.

 

Diagrama de Feynman: uma electrão e a sua antipartícula (positão e+) aniquilam-se e neste processo originanam um fotão (ϒ) que gera um par quark/antiquark e este último um gluão. O positrão (e+) e o antiquark (q-) evoluem do futuro para o passado. https://en.wikipedia.org/wiki/File:Feynmann_Diagram_Gluon_Radiation.svg


Estes modelos de simetria temporal dos campos quânticos electrodinâmicos explicam resultados convencionais obtidos no mundo experimental macroscópico, impossibilitando a distinção entre ambos.

Então porque não vemos o mundo como uma onda?

Consideremos uma bola de basebol: A sua velocidade máxima que possui a massa de 0.145 quilogramas é de 46,7 metros/segundo. Qual será então o seu comprimento de onda associado? Substituindo os valores para massa e velocidade na equação de De Broglie 

 

 (onde λ = comprimento de onda, ꚕ a constante Planck 6,626 x 10 elevado a -34 e v a velocidade em apreço), teremos então:

 

Em conclusão, este comprimento de onda ( λ ) é vinte vezes menor do que o diâmetro de um fotão (partícula da luz)! Sendo tão pequeno, não podemos esperar que uma bola de futebol se comporte como uma onda, exibindo por exemplo padrões de difracção ou ultrapasse paredes por efeito túnel.

Ou seja, a afectação do futuro no passado acontece numa transição de fase absolutamente microscópica resumida ao tempo presente, um tempo que deverá ser considerado de dimensão minimalista, o tempo granular minímo, exactamente igual ao tempo de Planck: 10 elevado a-46 segundos. Esta dimensão impede a exploração experimental do processo transaccional daqueles dois tempos: o de retrocausalidade impactando o da causalidade. Uma transição de fase correspondente precisamente ao tempo presente. Esta quase instantaneidade do tempo presente não é incomum. A mesma, conhecida como emaranhamento é a matriz sustentável do espaço-tempo. Um passo fundamental, como se verá ainda, para a unificação da Teoria da Relatividade com a Física dos Campos Quânticos.

Em 2022 o prémio Nobel da Física era atribuído ao trio John Clauser, Alain Aspect e Anton Zellinger, confirmando de forma definitiva a existência do fenómeno quântico do emaranhamento pelo trabalho em “experiências com fotões entrelaçados, instituindo a violação das desigualdades de [John] Bell e tornando-se pioneiros na ciência da informação quântica”, de acordo com a Academia Real Sueca das Ciências. John Bell, que anteriormente em 1964, formularia o problema de modo à sua verificação experimental, os pressupostos que passariam a ser conhecidos como a “desigualdade de Bell”, onde seriam retomados os conceitos de não-localidade de David Bohm e das “variáveis ocultas” ou da “ondeidade”. 

Um “campo de forma”, como Bohm denominaria, em que cada ponto do espaço contribui com informação, que no seu conjunto forma uma matriz organizada, de ligação entre nós de uma malha. Uma “espuma de spins” de acordo com a teoria da Gravidade Quântica em Laços de Carlo Rovelli. Este campo quântico covariante, que se contém a si próprio, para operar em regime não-local apenas exige que o potencial quântico deve manter a sua intensidade independentemente da distância. Sem sistemas de referência privilegiados, “trabalha” de maneira oposta à de todas as outras forças electromagnéticas, porque recebe a todo o instante toda a informação necessária (massa, spin, carga) decidindo em última análise, como as partículas surgem e se movimentam na nossa dimensão espácio-temporal.

A partir daqui estão configurados os pressupostos necessários que nos farão compreender a teoria da “sincronicidade” de Carl Gustav Jung (1875-1961).

Em 1952, em co-autoria com Wolfgang Pauli (1900-1958), prémio Nobel da Física, publicariam um artigo intitulado: “Sincronicidade – um princípio de conexões acausais”, onde era trabalhado o conceito, anteriormente apresentado em 1920 por C. Jung, onde se entende a sincronicidade como princípio de conexão acausal que não pode ser explicado utilizando como base a causalidade, e que à primeira vista apenas sugerem acontecimentos coincidentes sem qualquer ligação aparente, e que ele denominaria de “coincidência significativa” pois possuem um padrão próprio dinâmico com a presença aleatória de circunstâncias, expressas por eventos com relações significativas.

A violação da causalidade: provam-no a imensidade de experiências pessoais dos insights ou intuições que se desenvolvem como fenómeno síncrono. Provam-no os experimentos cientificamente controlados de Rhine, envolvendo a percepção extra-sensorial e a clarividência. Provam-no as muitas descobertas científicas que ocorreram e ocorrem quase simultaneamente em lugares distantes no mundo, sem que houvesse qualquer contacto prévio ou posterior entre os investigadores. Rupert Shelldrake explica-a pela existência de um Campo Mórfico fractal que permeia toda a natureza (provavelmente Quântico Covariante).

Esta violação surge-nos como mera casualidade e tem sido sempre entendida como tal, desde que não ultrapasse os limites impostos pela estatística probabilística. Quando isso acontece transforma-se em mistério ou em suposto erro de amostragem.

A Casualidade é a manifestação no Tempo Presente e forma o aparente tecido do nosso mundo do dia-a-dia. Muitas destas violações da causalidade só podem ser verificadas posteriormente, pois foram realidades de tempos futuros que se manifestaram antecipadamente, os designados acontecimentos “sincronísticos”.

Causalidade → Casualidade ← Acausalidade

Geralmente admitimos que o acaso é susceptível de alguma explicação causal, e só pode ser chamado “acaso” ou “coincidência”, porque a sua causalidade ainda não foi descoberta. Como temos uma convicção arreigada a respeito da validade absoluta da lei da causalidade, achamos que esta explicação do acaso é suficiente; mas se o princípio da causalidade só é válido relativamente, segue-se que a imensa maioria dos casos pode ser explicada em sentido causal; contudo deve restar um pequeno número de casos que não tem qualquer ligação causal. Encontramo-nos, assim, diante da tarefa de seleccionar os acontecimentos casuais e separar os acausais dos que podem ser explicados causalmente. É de supor, naturalmente, que o número dos acontecimentos que podem ser explicados causalmente superam de muito os acontecimentos suspeitos de acausalidade e, por esta razão, um observador superficial ou preconceituoso pode facilmente ignorar os fenómenos acausais relativamente raros. Logo que passamos a lidar com o problema do acaso, defrontamo-nos com a necessidade de uma avaliação quantitativa dos acontecimentos em questão.

                        Carl Jung, “A Dinâmica do Inconsciente, Sincronicidade


Outras influências de retrocausalidade foram detectadas a nível biológico, tais como este trabalho de Tressoldi e colaboradores., “Heart Rate Differences between Targets and Nontargests in Intuitive Tasks” onde se constata que as reacções dos batimentos cardíacos surgem numa fase anterior à estimulação, (Tressoldi e coll., 2005).

Ou ainda o trabalho de 2003 de Spottiswoode e May realizadas no Cognitive Science Laboratory, que confirmaram trabalhos experimentais anteriores datados de 1997, conduzidos por Bierman e Radin, que mostravam reacções antecipatórias de 2 a 3 segundos na condutividade eléctrica da pele face à provocação de estímulos emocionais.

Também Chris King em 2003, confirmava que os sistemas vivos são constantemente postos à prova com bifurcações decisórias, num constante estado de escolha, provenientes de informações provindas do passado (ondas retardadas) e informações provenientes do futuro (ondas avançadas) e que este estado constante de selecção de opções, seriam comuns a todos os níveis e estruturas da vida, desde moléculas até às macroestruturas orgânicas. Tomariam a forma de livre-arbítrio nos sistemas mais complexos. 

Por outro lado, as bifurcações decisórias seriam a causa de dinâmicas aparentemente caóticas que explicariam a razão da vida estar organizada de forma fractal. Este modo fractal seria uma importante propriedade dos sistemas vivos e um modelo provado de sobrevivência aos impactos da dualidade sintropia versus entropia. Aliás um modelo copiado do próprio Cosmos e base de reflexão de todas as cosmogonias e teogonias.

Quanto à própria natureza da consciência nos seres humanos (e nos animais em diversos patamares), a teoria Orch-OR de Stuart Hameroff e Roger Penrose, vem reforçar esta ideia da interacção causal e acausal com o colapso de onda exercido na estrutura microtubular, também ela organizada fractalmente. Seriam processos eminentemente quânticos. Aqui as ondas retardadas do passado e as avançadas do futuro, sob o efeito de sincronicidade não-local de uma dimensão espaço temporal que se contêm a si própria, fazem a gestão do cognoscível entre sintropia e entropia.

Neste contexto falar em livre-arbítrio impondo condições que minam qualquer noção credível para o mesmo, torna-o uma manifestação ilusória ou aparente no nosso mundo. Resultado do equilíbrio de “forças” construtoras (sintropia) e destruidoras (entropia) que se desenvolvem na nossa “brana” – o Tempo Presente, que como vimos possui uma dimensão espaço temporal mínima: o espaço e o tempo de Planck. Surge assim mais um paradoxo que só pode ser contornado se a acção que faria com que o evento acontecesse não possa ocorrer. Este é o Princípio da Autoconsistência de Novikov. Creio que também Agostinho de Hipona (354–430 d.C.) já se havia apercebido deste assunto.

O Princípio de Autoconsistência de Novikov assenta na concepção fractal de multiversos numa tentativa de solucionar alguns paradoxos criados pelas perspectivas de viagens no tempo, do estilo ir ao passado e modificar as situações de me originaram ou ir ao futuro e criar as condições para ganhar na lotaria na minha linha do tempo original.

A solução a este paradoxo para Igor Novikov seria não alterar a linha do tempo original, e sim gerar uma linha alternativa em consequência dos fatos que foram alterados na primeira, fazendo com que a primeira ficasse intacta. Ou seja criaríamos uma nova linha do tempo que se desenrolaria num universo paralelo, ou então seríamos impedidos de alterar os acontecimentos passados por um bloqueio da bifurcação que levasse a essa alteração. Esta última hipótese pressupõe a existência de uma Consciência provedora que fizesse a manutenção da estrutura fractal dos universos ou o colapso do próprio acto pela extinção desta nova linha do tempo por insustentabilidade. A insustentabilidade destas novas linhas do tempo dever-se-iam a carência de ondas avançadas, por não existir a linha do tempo futuro e acausabilidade (sintropia), o vector construtor. Seria sempre necessário existir o desafio da dualidade.

Tanto num caso como noutro, estas hipóteses implicam a existência de uma Consciência, talvez O Inefável gnóstico em Pistis Sophia, o Ayn Soph na Cabala, o Brahman hinduísta, o Uno neo-platónico, a Mente Cósmica teosófica, uma entidade para além do espaço-tempo, talvez a Energia Escura do lambda (Λ) na actual cosmologia.


Bibliografia

Bierman D.J. (1997) e Radin D.I., Anomalous anticipatory response on randomized future conditions. Perceptual and Motr Skills.

C. G. Jung, Sincronicidade, A Dinâmica do Inconsciente, Vol. 8/3, 2018 Editora Vozes, Livro Digital Google Books.

Cramer J. (1986), The Transactional Interpretation of Quantum Mechanics, Review of Modern Physics 1986. 

 King, C. (2003), Chaos, Quantum-transactions and Consciousness, NeuroQuantology 2003.

Spottiswoode P. (2003) e May E., Skin Conductance Prestimulus Response: Analyses, Artifacts and a Pilot Study, Journal of Scientific Exploration, Vol. 17, No. 4. 

Tressoldi P. E. (2005), Martinelli M., Massaccesi S., e Sartori L., Heart Rate Differences between Targets and Nontargets in Intuitive Tasks, Human Physiology, Vol. 31, No. 6, 2005.


quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Um aviso do Tempo Futuro vindo do Passado

 



Futuro é aquele tempo que nos chega espantosamente já construído. No entanto poderíamos encontrá-lo já inscrito em memórias deixadas pelo passado.
Pois se é a Lei da Causalidade, aquela “potência Contrafactor” (1), que constrói o futuro, então, as grandes escalas, que só o tempo futuro pode construir e abarcar, obra da Entropia, vão definir as pequenas escalas que nos são dadas no presente. Somos fractais por essa razão e também muito pequeninos. Acabamos por ser um produto da retrocausalidade.
Invertendo a causalidade e a localidade destroem-se todos os pressupostos axiomáticos sob os quais vive Sophia – o Conhecimento. No nosso mundo, assim confinada ao espaço-tempo num quadrado que se pode transformar num cubo, não resistirá à Luz do Alhures/Algures – o Inefável, sem a Pistis, as potências Construtoras do triângulo, que se pode transformar numa pirâmide. Afinal a mensagem simbólica básica inscrita na Tetractys da Década Pitagórica.
É o Futuro que vem na nossa direcção! Saibamo-lo construir na dualidade dos opostos: Pleroma versus Kenoma.
Este poderia ser o melhor conselho que nos poderiam dar, inscrito na pedra, o material mais comum e duradouro existente, num sério aviso para o futuro da Humanidade.
Transmitido em todas as cosmogonias e teogonias em todas as civilizações, algumas geograficamente muito distantes, sob formatos mitológicos e camadas de véus obscuros, terá sido a única maneira inteligente de garantir a sua transmissibilidade (para além da oral que se deteriora com o tempo) para as gerações vindouras, sobrevivendo ao caos da existência material. Foi assim nas mensagens dos textos gnósticos do cristianismo primitivo (os manuscritos gnósticos de Nag Hammadi), foi assim pela mitologia védica e Hinduísta, egípcia, babilónica, maia, azeteca, celta, ameríndia e dos povos do pacífico e do sudoeste asiático. Definitivamente um assunto universal com origem provável num grande acontecimento que impactou globalmente de forma acutilante a Humanidade e o planeta, e que hoje é conhecido como a época do Younger Dryas.
Este poderá ser afinal o significado oculto da mensagem até agora indecifrável, transmitido pelas conhecidas “malinhas de mão” presentes na estatuária arcaica distribuída pelos quatro cantos do mundo (ou seis: este, oeste, norte, sul, zénite, nadir) e agora também descoberta na civilização pós-diluviana representada magistralmente nas inscrições das ruínas de Göbekli Tepe na Turquia com mais de 12.000 anos. Época datando exactamente do período do Younger Dryas.


Pilar 43 em Göbekli Tepe


Verifica-se que a presença das “malinhas de mão”, estende-se desde as representações Assírias no Iraque com 880 a 859 anos a.C., até às Olmecas e azetecas na antiga América Central datando de 1200 a 400 a.C., entre civilizações sem qualquer contacto entre si. 
O mesmo sucede ainda mais longe na Nova Zelândia no contexto cultural das tradições Maori, em que uma importante figura da mitologia maori, vinda da dimensão do reino dos deuses, possuidor de uma profunda sabedoria divina, transmitiu-a ao povo maori em artefactos semelhantes a malinhas ou bolsas em tudo semelhantes às de Göbekli Tepe.
Este facto confirma definitivamente a universalidade e a importância da mensagem a transmitir.

O deus sumério Oannes


Ora, se existia uma mensagem tão importante a transmitir, seria lógico que esta mensagem estivesse agregada a outros simbolismos, também eles envoltos num carácter universalista, estendendo-se de certo modo aos fundamentos culturais de quase todas as civilizações. A ideia seria facilitar a interpretação das “malinha de mão”, como que envolvendo-a de outros aspectos redundantes com significados mais abrangentes e/ou complementares.


Friso babilónico com os “deuses alados”, a “Árvore da Vida” e as “malinhas”

 

Na realidade, encontramos outros símbolos com estas características e sempre associados às “malinhas de mão”. São eles: as serpentes aladas ou dragões alados, “A Árvore da Vida” e “Os Sete Sábios”. Tantos uns como outros surgem associados aos registos gráficos encontrados nas próprias “malinhas de mão” ou envolvendo o ambiente artístico onde estas se encontram.

As serpentes aladas ou os dragões alados são símbolos do Conhecimento ou da Sabedoria, da Evolução ligada ao eterno retorno. Veja-se o significado no Jardim do Éden bíblico ou no Hinduísmo com os “Nagas”, no Ouroboros e no Caduceu com Asclépio o deus grego da medicina e da cura.

Reportam-se sempre à mudança e ao mundo futuro. No antigo Egipto era comum a serpente na estatuária simbolizando autoridade e sabedoria divina ou, pelo contrário, a grande serpente Apófis do submundo idêntica ao Basilisco de sete cabeças em Pistis Sophia representando em ambos os casos o mau uso do conhecimento, o seu aspecto dual para o bem e para o mal.

Máscara de Tutankhamon com um ureu, adorno em forma de serpente


Em geral a serpente é assunto comum em todas as mitologias: Na Epopeia suméria de Gilgamesh; na mitologia do Daomé, na África ocidental, a serpente suporta o mundo com as suas muitas espirais; do outro lado do oceano Quetzalcoatl, a serpente emplumada maia, conhecida pelos azetecas como Gukumatz, em ambos os casos símbolo da transformação e da chegada dos deuses do leste que trouxeram o progresso e o conhecimento astronómico; Jormungand, a serpente de Midgard, surge na mitologia nórdica, abraçando o mundo no abismo do oceano.

Uma associação persiste: a da serpente com o oceano ou com o caos das águas revelando a muito provável ligação ao evento catastrófico do Younger Dryas ou do Dilúvio, este último também presente em todas as tradições culturais. Veja-se a representação do deus-peixe sumério Oannes.

Finalmente em Ísis sem Véu de Helena Blavatsky é dito que “Na Serpente estava toda a filosofia do universo”.



A serpente símbolo obrigatório nas “malinhas”


Outra simbologia oculta, associada às “malinhas de mão”, são um grupo de sete deuses ou seres de origem divina, designados por os “Sete Sábios”. São referidos nas mais importantes mitologias como agentes ou construtores civilizacionais portadores do conhecimento, da ciência e da sabedoria surgidos de um profundo cataclismo. Na mitologia suméria o deus Enki, fazendo parte dos quatro deuses primeiros (Anu, Enlil e Ninursague eram os outros que compunham este quaternário integrados nos sete maiores), era guardião das leis divinas, sendo o deus da sabedoria, da água e da fecundidade. Os outros deuses - Istar, Nana e Samas, eram designados por deuses do céu e faziam parte desta tríade que, conjuntamente com os anteriores constituíam uma estrutura septenária. 
Também na mitologia Assíria, surgem os sete Apkallu, considerados seres sábios e divinos que eram responsáveis por transmitir conhecimento e sabedoria aos homens, retratados como seres de aparência humana, figuras de homem-peixe, por vezes alados configurando aves. É o caso de Utuabzu descrito com uma cabeça e asas de águia num corpo humano, era protector dos conhecimentos divinos e guardião da árvore sagrada Ea.
Encontram-se sempre como portadores das “malinhas de mão” e como sobreviventes ao dilúvio.

Utuabzu

Na Índia, são os Saptarishi (em sânscrito sapta, sete e rishi, sábio) que designa os sete  rishis nos textos védicos, possuidores de incríveis poderes visionários e filhos de Brahma. É-lhes atribuída a responsabilidade de perseverar e transmitir o conhecimento no decorrer das eras. 

Esta ideia de organização septenária vai influenciar outro sistema cosmogónico, o gnóstico de Valentinus, recuperando do sistema Tétrakis Pitagórico, aparecem as sete esferas ou planos de existência, os Aeons em pares de syzygies, também informado por princípios duais masculino-feminino nas manifestações hierárquicas, corporizando centros de actividade tal como aqueles Sephirots na Cabala, ou os mesmos princípios Rajas, Sattva e Tamas do Trimurti Hindu, todos eles encimados pela região superior designada por Pleroma, formando no conjunto o Ogdoad.

Sistemas cosmogónicos congéneres encontramos na América Central, O Popol Vuh, o grande repositório da tradição pré-colombiana que conta a história da queda da humanidade e a chegada dos “primeiros homens”, as criaturas do Quetzalcoatl – a Serpente Emplumada, que nos incas toma o nome de Viracocha , os homens louros, brancos e barbudos, nomeadamente Balam-Quitz – o Jaguar do Doce Sorriso; Balam-Acab – o Jaguar da Noite; Mahucutah – o Nome Ilustre e Iqui-Balam – o Jaguar da Lua. Segundo o Popol Vuh “eram dotados de inteligência; viam instantaneamente podiam enxergar longe; tinham sucesso em ver o que queriam; conseguiam saber tudo o que havia no mundo. Sem precisar se mover inicialmente, viam à distância coisas ocultas…Grande era a sabedoria deles; sua vista alcançava as florestas, as rochas, os lagos, os mares, as montanhas e os vales. Na verdade, eram homens admiráveis…Podiam saber tudo e examinavam os quatro cantos, os quatro pontos do céu, e a face redonda da terra.” (2).

Quetzalcoatl, uma “malinha de mão” e a serpente 

Entretanto, Tezcatilpoca, o Espelho Esfumaçado, cujo culto exigia sacrifícios humanos fez desaparecer obrigando-o a abandonar Tula/Tollan no México: a eterna luta da luz contra as trevas. No entanto Quetzalcoatl prometeu um dia voltar. Tezcatilpoca aparece nas lendas ligado à noite, às trevas e ao jaguar sagrado, sendo o deus do céu nocturno, da lua e das estrelas; senhor do fogo e da morte. Segundo a lenda, Tezcatilpoca usava um aparelho, designado por espelho esfumaçado, para observar à distância a actividade dos homens e dos deuses, interpretado mais tarde nas obsidianas – Tezcat, com as facas sacrificiais e espelhos divinatórios.

Outro símbolo designado como “A Árvore da Vida” faz parte de muitas outras tradições religiosas (conceito sagrado) e filosóficas (a árvore do conhecimento a unir o céu e o submundo) e concepções cosmogónicas (a origem da natureza humana e do cosmos) e como tal adquire aspectos dualísticos. A Árvore da Vida tem uma referência muito especial com a Cabala hebraica. Ali é dividida hierarquicamente em 10 Sephirots hierárquicos que podem ser lidos microcosmicamente, do ponto de vista do homem ou de baixo para cima, como também macrocosmicamente, do ponto de vista do universo ou de cima para baixo. No seu seio operam agentes estabilizadores, de acção e não-acção, distribuídos em três colunas que contribuem para a perfeita harmonia das esferas de actividade dos Sephirots ou agentes construtores. Esta mesma estrutura encontra outras congéneres no Hinduísmo, onde os Vedas, os Puranas e os Upanishads referem a Árvore da Vida, símbolo do Conhecimento, ligando a terra e o céu, representando também os agentes duais e da harmonia com a simbologia Trimurti - Brahma (o Criador), Vishnu (O Protector) e Shiva (O Destruidor) ou Rajas, Sattva e Tamas.
Nos livros sagrados do hinduísmo, os Puranas mencionam também uma árvore divina, a Kalpavriksha, guardada pelos gandharvas no jardim da cidade mitológica de Amaravati sob o controlo do deus Indra do Rigeveda, rei dos seres luminosos Devas que controlam a natureza e o clima.
De uma maneira geral o conceito da Árvore da Vida, associado sempre ao sagrado, aos deuses e à mitologia, reflectindo a imortalidade, o fluxo e refluxo cíclico da vida cósmica, reeditando o significado esotérico do Ouroboros, das serpentes ou do Caduceu, estende-se por quase todas as tradições importantes de povos espalhados geograficamente por todo o mundo. É o caso da árvore Chipre sagrado no Irão, a Peepal também conhecida como Bodhi ou Banyan na Índia, e na China, o Baobá na África Ocidental, o Carvalho na tradição celta, o Freixo na Escandinávia, o Limoeiro na Alemanha e o Laurel na Grécia.
O conceito Teosófico liga a Árvore da Vida à Constituição Septenária da Cabala e aos princípios do Budismo Esotérico e às Estâncias do Livro de Dzyan, ambos amplamente comentados na Doutrina Secreta de Helena Petrovna Blavatsky.
Na Teosofia o Homem, encarado como Microcosmo, assim como a natureza ou o Universo, o Macrocosmo, é o saptaparna (a planta de sete folhas), simbolizado geometricamente por um triângulo sobre um quadrado. Nesta constituição septenária o triângulo é a Tríade superior é a parte imortal da natureza humana, constituída por Atman, o raio do Absoluto, no vértice e Budhi, a Alma Divina, e Manas, a Mente Pura, na base. Por sua vez o quadrado, Quaternário inferior, é formado por Sthula sharira, o corpo físico; Prana, o corpo vital; Linga sharira, o duplo etérico ou o corpo astral na teosofia original e finalmente Kâma Rupa, o corpo de desejos ou corpo emocional. Esta constituição pode ser lida em dois sentidos., tal como a organização Sephirótica.

A “Serpente”, a “Árvore da Vida”, os “Sete Sábios”, associadas com as “malinhas de mão”, partilham e reforçam a mesma mensagem. Representam simbolicamente o Conhecimento profundo e a Ciência transmitida por entes de uma cultura ou civilização superior, desaparecida num evento cataclísmico de dimensões planetárias. Estes conhecimentos envolviam a transmissão dos princípios fundamentais da vida humana e do universo, a Constituição Septenária do Microcosmo (relativa à natureza humana) e do Macrocosmo (relativa às cosmogonias e teogonias). 
Por esta razão consideramos que as “malinhas de mão” mais não são do que o símbolo da Constituição Septenária e representam a união do quaternário com o ternário – um quadrado e um triângulo unidos.
Uma mensagem que, uma vez tendo a descodificação simbólica apropriada, revela o âmago da fundamentação da natureza humana e do Cosmos.



Uma “malinha de mão” suméria e a representação gráfica da Constituição Septenária


A “malinha de mão” alvo de muitas interpretações sem grande sentido antropológico e arqueológico, uma delas, mais corrente, atribui a geometria do quadrado da mala à representação da Terra e o arco da pega da mesma, à representação da Via Láctea no céu. Esta interpretação não andará longe da verdade se considerarmos que por exemplo a representação da Via Láctea para os egípcios significava a mãe dos corpos celestes representada pela deusa Nut na abóbada celeste, o que coincide com a ideia filosófica do Tríade Logoica na Cabala e na Teosofia.

A deusa Nut, vista como a Via Láctea

No Antigo Egipto a “malinha de mão” adquire um aspecto hieroglífico com o símbolo ankh ou a Crux Ansata, a “Chave da Vida”, a cruz que representa a transformação ou ressurreição e a imortalidade (transmutação alquímica) ou ainda, de acordo com H. Blavatsky, a Constituição Septenária, tal como a cruz romana.

Ankh

Em conclusão: esta seria uma mensagem profunda sobre os fundamentos da origem humana e do próprio universo. Quem a transmitiu originalmente também tinha a intenção de dar a conhecer a sua existência civilizacional alertando a humanidade para os perigos cíclicos futuros que esta estaria sujeita, seja pelo mau uso da Ciência e do Conhecimento, seja pela possibilidade de ocorrência de eventos cataclísmicos, como a hipótese avançada por alguns investigadores acerca da queda de um cometa no planeta, um evento congénere àquele de Tunguska, ocorrido na Sibéria em 30 de Junho de 1908. Um evento de uma dimensão semelhante, mas potenciada muitas vezes mais, pela explosão de núcleos cometários na atmosfera terrestre, configuraria algo semelhante ao registo deixado pelo Younger Dryas. Sobre este tema poderá consultar a actual investigação conduzida pelo Comet Research Group.

Os Apkallu com a “malinha”e a Árvore da Vida ao centro


Escultura olmeca, a “malinha” e a serpente emplumada


Guerreiros Toltecas e um guerreiro azteca com as “malinhas de mão”


“[…] é importante frisar, desde já, um fato que nos parece essencial: o mito é considerado uma história sagrada e, portanto, uma “história verdadeira”, porque sempre se refere a realidades. O mito cosmogónico é “verdadeiro” porque a existência do Mundo aí está para prová-lo; o mito da origem da morte é igualmente “verdadeiro” porque é provado pela mortalidade do homem, e assim por diante.” (MALINOWSKI, 1995)

Notas

(1) Tão bem descrita em Pistis Sophia.

(2) cit. Graham Hancock, As Digitais dos Deuses, pp 174.


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