quinta-feira, 8 de julho de 2021

A natureza profunda das folhas e a geometria sagrada

     Parque urbano de Ponta Delgada, imagem do autor.


Vem este assunto a propósito de reflexões que afluíram à minha mente durante caminhadas que diariamente faço no parque urbano da minha cidade, ao observar descuidadamente o formato da folhas da diversa vegetação arbórea e rasteira que por ali cresce.

As folhas são um dos principais órgãos do reino vegetal adquirindo formas muito diversas e assumindo funções vitais para a planta. São elas que estão encarregues do fenómeno da fotossíntese e das trocas gasosas com o meio ambiente (respiração e transpiração). Através da primeira convertem os fotões da luz visível em energia biologicamente utilizável por um processo que recentemente foi descoberto e que torna a fotossíntese tecnologicamente tão sofisticada, pois ela, inacreditavelmente, tira vantagem da natureza quântica da luz, a sobreposição ou emaranhamento quântico à temperatura ambiente (1). Um único fotão sensibilizava cromóforos distintos (pigmentos que absorvem a energia) de forma simultânea, envolvidos na formação de cadeias de adenosina trifosfato (ATP) nos cloroplastos, produzindo oxigénio e assimilando dióxido de carbono, tornando-se assim nos pulmões do nosso planeta e produzindo quantidades astronómicas de hidratos de carbono que vão constituir as suas estruturas, desde sementes, raízes, tubérculos, caules, folhas e os seus sistemas reprodutores, as flores. Pela respiração fazem o processo inverso absorvendo oxigénio e libertando CO2. Coloca-se claramente a questão: milhares de milhões de anos antes da nossa existência humana já a natureza havia “compreendido” as bases da mecânica quântica.

Espontaneamente surgiu-me a ideia de que toda a prolificidade que a natureza nos oferece expressa nas suas mais diversas formas e feitios, e que traduzem a sua capacidade de adaptação e de competição entre espécies, deveria ser uma maneira eficaz de dissipação de energia, não fosse o princípio da entropia, motor da evolução, também aplicar-se a esta forma de vida. Contudo suspeitei que algo mais deveria estar por detrás deste aparente caos.

Ao reparar no órgão que sustenta esta forma de vida – as folhas, identifiquei uma forma geométrica comum e redundante a todas elas: o triângulo.

É sabido que a árvore foi utilizada pela filosofia da Kabbala como referência oculta da “Árvore da Vida”, representando a Constituição Septenária ao assumir que a copa representa o quadrado (o quaternário) e as raízes o triângulo (o ternário). O triângulo conjuntamente com o círculo e o quadrado, constituem as principais formas da geometria sagrada. Contudo consubstanciando este aspecto deverá existir um outro ligado á economia de meios de que a natureza é pródiga. A sua sustentabilidade aí reside.

Se repararmos, qualquer que seja o formato considerado de uma folha, esta evolui em torno de uma forma geométrica que se aproxima do triângulo ou de um conjunto de triângulos (quando são compostas) que têm a tendência, nem sempre, de desenvolver formas arredondadas nos seus limbos como é o caso das orbiculares e das reniformes (ver figura 2). Ou seja existe uma complementaridade entre duas formas geométricas: o triângulo e o círculo. Se pensarmos que, geometricamente, uma poderá ser deduzida da outra, não estranharemos essa ligação.

Figura 1 – Geometria nas folhas


Figura 2 – Formatos de folhas. Wikimedia Commons.

Uma folha comum poderá ser representada por dois triângulos partilhando um dos lados e derivados da intersecção de dois círculos (Figura 2).

Figura 3 – Visica Piscis e a origem do formato foliar

É evidente que a base será esta, dois triângulos equiláteros que surgem da intersecção de dois círculos, a famosa vesica piscis, a bexiga de peixe, considerada a semente divina da geometria sagrada, simbolismo esotérico da Criação, cuja altura conjunta corresponde a , assumindo que o valor do raio é a unidade.

A Vesica Piscis representa a relação de duas entidades distintas e a complementaridade dos opostos, a dualidade da existência, mediadores entre um dos círculos que representa a criação da matéria sobre a qual desceu o espírito, a energia da Luz, representado pelo outro círculo, ou seja a relação entre a alma e a Psichê. Para Platão era o arquétipo da beleza, a figura central da “Flor da Vida” e mais tarde constituía a forma geométrica, o “útero”, dos construtores das catedrais medievais.

Figura 4 – Visicula Piscis

Três pontos equidistantes e da sua união resultam dois tipos de triângulos: os equiláteros e os rectangulares, estes últimos formados por dois catetos e uma hipotenusa e constituintes de todas as superfícies poligonais, sejam regulares ou irregulares, incluindo os triângulos não rectângulos. Logo a base de reflexão incidirá sobre os triângulos rectângulos.

Podemos considerar os seus catetos como representando a dualidade de dois pólos opostos, dos quais surge um, e só um segmento: a hipotenusa, a união dos opostos geradora da superfície. Logo, de dois segmentos unidimensionais (1D) surge o 2D.

 

A ordem bidimensional não é apenas representada pelo triângulo rectângulo mas também pela figura geométrica do quadrado. Um quadrado surge também de um segmento reafirmando o significado matemático de elevar ao quadrado, inerente ao Teorema de Pitágoras onde o quadrado maior é a soma dos outros dois e o conjunto dos três formam uma sequência de Fibonaci cujo princípio se baseia no número de ouro e cria uma sequência infinita de triângulos. Este é o conhecido triângulo de Price, único triângulo rectângulo cujos três lados formam uma proporção em progressão geométrica, ou seja a razão entre o cateto maior e o menor é igual á razão entre o cateto maior e a hipotenusa, o mesmo significa que é Φ (Phi = 1,6180339887498948482045…de infinitas casas decimais.

a2 = b2 + c2

Figura 5 – Demonstração prática do Teorema de Pitágoras. Imagem Wikimedia Commons.

Outro triângulo rectângulo é aquele que surge dos 3 segmentos que unem os vértices do quadrado com os pontos médios dos lados opostos, o chamado triângulo sagrado egípcio que deriva da progressão aritmética dos seus lados quando por exemplo tomam os valores 3, 4 e 5 e formado pelas respectivas 3 grandes raízes quadradas:   e , ligados de forma simbólica à criação da matéria.

Estamos a relacionar as 3 formas geométricas principais ligadas à geometria sagrada, o círculo cuja relação directa entre o perímetro e o diâmetro, no que resulta no valor π = 3,14159265358979….de infinitas casas decimais, o triângulo e o quadrado e que estão na base da estrutura septenária e da quadratura do círculo.

Figura 6 – As três raízes sagradas. Wikimedia Commons.

A razão desta relação prende-se com a estrutura tipológica que preside à formação de todas as folhas dos seres vegetais. Esta estrutura apresenta uma geometria complexa onde as células vegetais surgem sob um reticulado definido por aquilo que poderão até ser definidas por funções matemáticas bioholomórficas como se existisse um modelo matematicamente reprodutível que orientasse o seu desenvolvimento, algo semelhante à informação organizada dos campos quânticos morfogenéticos defendidos por Rupert Sheldrake.

Em todo o caso normalmente são tidos em conta factores que influenciam a forma das células em geral e as vegetais em particular e que poderão ser de vária ordem ditados por razões de natureza genética e por influências ambientais, como aqueles ligados á presença mais ou menos abundante de recursos hídricos. Assim quando a tensão superficial no interior da célula for a mesma em toda a superfície, a célula tende a ser esférica. Por outro lado a rigidez das membranas celulares conferida pela celulose e outros polissacáridos, tende a confinar o seu interior de acordo com o equilíbrio das tensões geradas com a viscosidade do próprio protoplasma celular. Ao contrário de muitas células animais, as vegetais não mudam de forma.

Já sabemos que as folhas apresentam diferenças estruturais e morfológicas entre os grupos vegetais conhecidos e classificados como pteridófitas, gimnospérmicas e angiospérmicas. Divergem as briófitas que apresentam estruturas primitivas chamadas filóides confirmando que a evolução é dirigida para a apresentação de uma morfologia conforme a geometria sagrada do círculo, triângulo e quadrado. Muitas morfologias apresentam uma mistura destas três formas geométricas como mostra a figura 2.

Mas poderiam perguntar: o que tem a geometria e a matemática a ver com o morfologia das folhas dos vegetais? Não desconhecemos que um parâmetro base na organização de um ser é a informação estruturada que ele contém, seja sob a forma do seu ADN e de todas as variáveis que ele vai transmitir geneticamente, seja no seu polimorfismo que na sua maioria nada tem a ver com a genética. Isto, só é possível pela informação traduzida em matemática e geometria, veiculada de forma orgânica, a forma material que reconhecemos. Só através desta relação podemos construir o mundo onde evoluímos: um mundo de relações entre objectos materiais. A comprovação da existência dos campos quânticos de ressonância morfogenética, tais arquétipos platónicos ou Akasha das doutrinas orientais, viriam dar um contributo definitivo para a compreensão deste assunto. De facto, muitas investigações nas áreas da biologia e da física sobre a natureza vegetal têm mudado progressivamente a nossa atitude relativa à vida em geral e em particular à das plantas. Citarei apenas dois casos que revelam a existência de uma “inteligência” nas plantas associada ao tratamento de informação relacional.

Num estudo publicado na revista Nature, da autoria de Monica Gagliano, Vladyslav V. Vyazovskiy, Alexander A. Borbély, Mavra Grimonprez e Martial Depczynski, datado de 2 de Dezembro de 2016 (2), mostraram que a designada “aprendizagem associativa”, fenómeno discernível do fototropismo e de influências ambientais, é uma componente essencial no comportamento das plantas, concluindo que a “associative learning” representa um mecanismo universal de adaptação partilhado tanto por animais como por plantas. Os experimentos delineados tiveram a particularidade de evidenciar pela primeira vez que as plantas possuem capacidade de aquisição de aprendizagens que as orientam no seu comportamento como plantas forrageiras, no caso em apreço a ervilha Pisum Sativa.

Num outro caso (3), descobre-se que as árvores possuem um network de comunicação subterrâneo que as leva a troca de informação através dos seus sistemas radiculares e da criação de uma rede de micélios numa perfeita relação simbiótica conhecida como micorriza (do latim myca, fungos, interagindo com as raízes, riza), estabelecendo ligações electroquímicas de longa distância e incentivando o crescimento das suas congéneres, partilhando nutrientes entre si e sabotando a instalação de plantas invasoras concorrentes. Este amplo sistema de cooperação e ajuda mútua constitui o maior sistema relacional do planeta até agora conhecido. Uma rede Web de informação envolvendo extensos campos electromagnéticos, construída e desenvolvida pelo mundo verde que define o comportamento das plantas seja por alterações induzidas pela qualidade da luz, som, estímulos mecânicos e bioquímicos produzidos pelo estabelecimento de relações de quase afectividade sensorial.

Para finalizar, também é sabido da existência de um campo de energia conhecido por radiação Kirlian (4), evidenciado inicialmente pelo método de electrofotografia executado em folhas de plantas pelo russo Semyon Davidovich Kirlian em 1939. O método consiste em fotografar um objeto com uma chapa fotográfica, submetida a campos eléctricos de alta-voltagem e alta-frequência, porém de baixa intensidade de corrente (técnica da kirliangrafia), resultando no aparecimento de um halo luminoso, em torno do objecto, a designada “aura”, também designada nos meios científicos por Corona. Este fenómeno poderá estar associado ao campo quântico de ressonância morfogenético de Rupert Sheldrake que na sua essência supõe-se modelar e formatar os organismos vivos através de um processo quântico relacional de “entanglement”.


Figura 7 – Fotografia kirlian de uma folha Coleus, 1980 - Wikimedia Commons

Em conclusão, a natureza vegetal é pródiga em espantar-nos com a sua capacidade de adaptação e organização, pois ao assumir na sua estrutura componentes do sagrado geométrico que definem princípios matemáticos simples e básicos, revela também existir na génese da Vida um fio condutor que transforma a simplicidade em padrões crescentes de complexidade, cujo resultado coloca em pé de igualdade todos os seres, como fontes de crescimento e aperfeiçoamento de uma única entidade, tal como o fio percorre e une as pérolas de um colar.

 

João Porto

Ponta Delgada, 8 de Julho de 2021


Publicado na Revista Matemática para Filósofos da Nova Acrópole Portugal

https://www.matematicaparafilosofos.pt/a-natureza-profunda-das-folhas-e-a-geometria-sagrada/


Notas

(1)  Ball, P. Physics of life: The dawn of quantum biology. Nature 474, 272–274 (2011). https://doi.org/10.1038/474272a

(2)  Gagliano, M. et al. Learning by Association in Plants. Sci. Rep. 6, 38427; doi: 10.1038/

srep38427 (2016). http://www.nature.com/srep.

 (3)  Elhakeem A, Markovic D, Broberg A, Anten NPR, Ninkovic V (2018) Aboveground mechanical stimuli affect belowground plant-plant communication. PLoS ONE 13(5): e0195646. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0195646.

(4)  WILSON PICLER, FOTOGRAFIA KIRLIAN (BIOELETROGRAFIA): Uma abordagem crítica e desmistificada dos padrões cromáticos, UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS, FEEC - Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação, Campinas 2019. http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/345805.









 

quinta-feira, 1 de julho de 2021

Os números e a entropia/sintropia











O Homem Vitruviano, Pixabay License

Por definição a entropia é uma grandeza termodinâmica que mede a desordem de um sistema e está relacionada com o seu grau de organização ou da previsibilidade da informação que define esse sistema. Quanto maior a desordem do sistema, maior a entropia e vice-versa.

Considera-se geralmente a entropia como um processo espontâneo, natural e nem sempre irreversível seja no sentido de aumento da desordem ou da ordem, ou seja, da variação da entropia (ΔS) respectivamente no sentido positivo ou negativo, neste último caso designada por negentropia ou sintropia, princípio simétrico da entropia que contribui para a organização de um sistema e se opõe à perda ou degradação de energia.

Esta ideia poderá expressar-se por ΔS = SfinalSinicial, onde se ΔS > 0 a entropia aumenta, se < 0 a entropia diminui, sendo que a variação da entropia é directamente proporcional à variação da energia dada pela temperatura ou pela agitação e movimento das partículas, isto significa que a temperaturas mais baixas o movimento/agitação, a informação e a energia, serão menores.

Qualquer sistema funciona com as duas componentes – entropia e sintropia. Por exemplo no âmbito biológico temos o anabolismo e o catabolismo dos processos metabólicos, um repondo e o outro destruindo. É o ciclo Sattva, Tamas e Rajas dos Gunas da filosofia védica.

ΔS define assim a dinâmica dos sistemas abertos porque considerando o Universo como sistema fechado a entropia será sempre maior que zero e irreversível. A sua origem confirma o desiderato: nascido do vácuo quântico, a sua história até hoje, 13,8 mil milhões de anos depois, tem sido feita de sucessos e retrocessos, de organização e destruição, na sua crescente expansão caminhando para o zero absoluto, recriando a sua condição inicial.

A palavra entropia vem do grego “en”, que significa “em” e “tropêe”, que é “mudança”. Esta mudança feita de organização para subsequente dissipação de energia, experiencia a criação de sistemas e de seres complexos num processo evolutivo imparável e irreversível em diversas dimensões da Constituição Septenária. O ΔS < 0 é sempre momentâneo porque se processa numa dimensão temporal conferida pela omnipresença do campo quântico do Bosão de Higgs – o Anthakarana.

Estamos a relacionar já diversas componentes em torno do conceito de entropia/sintropia: informação, temperatura, energia e organização relacional de sistemas.

A informação e a entropia/sintropia ligada aos sistemas cibernéticos representa a tendência para a autodestruição e degradação dos sistemas, sobretudo dos não evolutivos, e por outro lado a estruturação algorítmica e programática. O equilíbrio entre os dois significa a duração de vida do sistema e a evolução da inteligência artificial que actualmente ganha terreno com a computação quântica. Contudo o conceito de informação ultrapassa os sistemas cibernéticos se pensarmos que todos os sistemas tridimensionais, desde os campos quânticos no âmbito do microcosmo até aqueles que constituem o macrocosmo manifestado, são passíveis de serem traduzidos em referenciais de volume, massa, simetria, carga e resistência eléctrica, densidade, pressão, etc.

Esses referenciais conhecidos como grandezas físicas, relacionam e assumem valores e constantes universais como se plasmassem ou cristalizassem “configurações” organizadas de informação sem os quais não existiriam. É assim que o Diagrama de Enzo Tonti classifica cada variável física como tendo uma associação bem definida com um elemento do espaço e do tempo, como mostra a Figura 1.


Figura 1 – As variáveis físicas com os elementos do espaço e do tempo aos quais estão associadas. Wikipedia.org

Estes atributos quantitativos dos sistemas, reflectidos pelo Diagrama de Tonti originam as quantidades físicas relacionadas com o espaço e o tempo, sejam escalares, vectoriais ou tensoriais, sejam quais forem as teorias físicas e qualquer que seja a sua natureza matemática. 

Todo sistema físico, mesmo um campo quântico, assume uma "configuração" própria, descrita por variáveis de configuração, variáveis de fonte e variáveis de energia. Por exemplo num campo electromagnético as variáveis de fonte são definidas pelas cargas eléctricas com as suas grandezas vectoriais como variáveis de configuração e as variáveis de energia surgem da variável de configuração com a de origem.

Ou seja, parece existir um processo utilizado pela natureza, e só a ela inerente, de criação de organização através da complexificação de sistemas que visem a dissipação de energia de forma mais rápida. Aquilo que parece ser o surgimento de sistemas organicamente e estruturalmente mais complexos – do cristal ao vírus, deste ao microorganismo, numa cadeia evolutiva que atinge o seu âmago no ser humano. Constitui apenas um processo momentâneo onde a razão final de equilíbrio entre entropia/sintropia, geradora e impulsionadora da evolução dos sistemas, penderá sempre para um valor final entrópico positivo com a dissolução progressiva desses sistemas materiais em sistemas de outras dimensões onde apenas permanece a informação. A entropia ao conduzir ao vácuo na sua acção de dissolução faz dele o manancial titânico de todas as energias.

Este é também o caso paradigmático e paradoxal dos Horizontes de Eventos dos Buracos Negros, onde a informação não é destruída e permanece como estrutura ou sistema bidimensional. Ou seja, a informação em vez de ser destruída no interior do Buraco Negro, seria acumulada ou armazenada numa superfície bidimensional que de forma semelhante a um holograma projectaria uma imagem de si mesmo em três dimensões. Leonard Susskind e Gerard't Hooft aplicando este conceito a todo o Universo, concluíram que este seria um holograma, no qual as informações tridimensionais estariam “impressas” em superfícies bidimensionais situadas na esfera imaginária que circunda o nosso Universo. Seria como uma “flatland” onde os seus habitantes viveriam sem saber num mundo com apenas duas dimensões. Assim, espantosamente o nosso mundo tridimensional seria apenas uma ilusão, fazendo-nos regressar à concepção milenar dos Vedas (Maya).

Este é também o processo que alicerça a teoria da reencarnação e da vida para além do fenómeno da morte e que é corpo doutrinário de todas as teologias. A informação, como primeiro Logos do Ternário, é indestrutível e permanece na manifestação do Quaternário. A matéria e as suas forças agregadoras são o veículo de evolução da matriz primordial, a informação, e onde a entropia/sintropia constitui apenas o processo.

Como afirmava o pré-Socrático e precursor do atomismo Anaxágoras: “Em todas as coisas há uma porção do noûs, e há ainda certas coisas nas quais o noûs está também”.

 Para Anaxágoras a origem do Universo estava assente em elementos infinitos em número e tempo (as homeomerias, sementes ou spérmata ou ainda os futuros átomos de Demócrito e Leucipo), agregados por uma força chamada noûs – uma inteligência que tudo governava e apenas separava ilusoriamente os pares opostos que compunham o Universo. Dava como exemplos de pares opostos o frio/quente e o húmido/seco ou melhor dizendo de forma generalizada sintropia/entropia.

A Aritmética comum, por razões práticas, encara os números como sequências estáticas inter-relacionadas por sub-séries sem relação dinâmica entre si. O “Uno sem Segundo” da Doutrina Secreta desenvolve a inter-relação existente dos valores numéricos e as suas “sombras geométricas” e do que há entre e dentro delas – a designada Matemática Dinâmica ou Viva.

Carlos Rovelli em Helgoland argumenta de forma similar aconselhando-nos a adoptar uma visão do mundo “relacional” contrariando a visão mecanicista introduzida pela ciência do século XVII. Deste modo os objectos no microcosmos quântico nada mais são do que as propriedades (por exemplo posição, momento e energia) que exibem ao interagir em relação a outros objectos e entre si. Isto significa que se removêssemos o conteúdo do Universo, removeríamos também o espaço e o tempo confirmando que a realidade é feita pelas relações espaciais e temporais entre sistemas. Neste aspecto a Teoria da Relatividade Geral vem confirmar este acervo ao nível macrocosmo e o Bosão de Higgs dá-lhe suporte estrutural ao nível do microcosmo.

O nosso mundo material e energético expresso nas formas ou figuras geométricas estáticas, as designadas “sombras” dos números, resultam do impacto ou do movimento espaço-temporal, inter-relacional entre sistemas onde predomina a dinâmica sintropia/entropia, tal como o exemplo de um ponto de luz que em movimento rápido causa a ilusão de um a linha luminosa contínua.

A Teoria da Informação Integrada (TII) de GiulioTononi (2004 e 2014) ao defender que o todo é maior que a soma das partes, implicitamente assume que os sistemas complexos e organizados num processo de sintropia, criem no seu seio as condições para que a entropia seja a etapa sucedânea. Como resultado deste processo sintropia/entropia, o acumular de “superavit” de informação cria as condições para o despertar da consciência desde o átomo. Aqui a informação inerente aos sistemas confunde-se com a consciência reflectida no primeiro aforismo do Caibalion de Hermes Trismegisto: O Todo é Mente; o Universo é Mental. 

Como Hesíodo na sua Teogonia afirmava: “No princípio, era o caos”. Não existindo dualidade, reinava a vacuidade homogénea – o Nada, do qual nasce um ponto sem dimensões contendo como atributo o infinito em si próprio. Aqui encontramos similitude com a descrição do fenómeno quântico característico da perturbação do vácuo que vai originar, como primeiro acto, o Universo.

Contudo um ponto no hiper-espaço infinito não é gerador de forma nem do espaço-tempo. Este apenas definirá a origem, o zero de um futuro vector e de um potencial que aparece na sequência da dualidade ou paridade de um segundo ponto. Os dois ligando-se originam a grandeza vectorial de natureza linear unidimensional que contém a primeira medida – o um.

É a partir desta unidade primordial, definida pela distância entre os dois pontos, que irá surgir o terceiro elemento como ponto de encontro dos arcos gerados pela velocidade do movimento centrado ora num e noutro e que estruturam um plano bidimensional poligonal. Eis a primeira configuração geométrica 2D cujo polígono – um triângulo equilátero, resulta dos campos quânticos das forças nucleares fortes, fracas e das forças electromagnéticas. Assim se distribuem em ordens de três as partículas subatómicas conhecidas por quarks que dão origem aos protões e neutrões, o mesmo é dizer aos primeiros átomos de hidrogénio, matéria base do Universo.

O triângulo equilátero em conjunto com o círculo constitui a figura principal da geometria sagrada. As outras figuras como o quadrado ou os restantes polígonos são apenas conjuntos de triângulos que a sintropia/entropia organiza por simples economia de meios energéticos.


Os sistemas 3D, expressos pelos sólidos platónicos também vão surgir da mesma forma, onde ganha preponderância de organizador energético o número de ouro Φ=1,6180339887498948482045… com infinitos algarismos decimais.

Sem entrarmos em pormenores que nos encheriam páginas, a secção áurea – configuração geométrica do número Φ (Phi), identifica-se com um segmento de recta e um ponto e é a descrita nos seguintes termos por Euclides nos seus Elementos, livro 2, proposição II: “Uma recta está dividida em média e extrema razão quando a recta (a+b) é para o segmento maior (a) o mesmo que este é para o menor (b).”


Não poderíamos deixar nesta altura de estabelecer ligações óbvias entre o Diagrama de Tonti e a estrutura pitagórica da Tetraktys ou Década Pitagórica com a sua base 10 = 1 + 2 + 3 + 4, e a sua asserção de que os números estão na base de toda a manifestação.

O Tetraktys representa a organização do espaço-tempo, o equilíbrio sintropia/entropia:

Enquanto a primeira linha representa a kénon aristotélica, ou seja, o vazio ou vácuo, zero dimensões, o reino das ideias puras arupicas, Arkhé - um ponto, a segunda linha representa uma dimensão dada pelos números em si, como primeiro reflexo das ideias, uma linha definida por dois pontos gerada pelo potencial residente no vácuo, a passagem do arupico não-formal para o rupico formal. Já a terceira linha representa as duas dimensões, a sombra dos números onde as ideias adquirem forma, o tal plano definido por três pontos enquanto a quarta linha representa as três dimensões - um tetraedro definido por quatro pontos onde as formas adquirem volume (Figuras 4 e 5).

 

Figura 4 – A divina Tetraktys ou Década Pitagórica. Wikipedia.org

Finalmente, nesta geometria sagrada, é evidente a presença geométrica da Constituição Septenária (força divina da trindade, 3 + 4, o quadrado da terra).

Tudo o que evolui obedece a um padrão septenário com origem no número 3:

 - As sete frequências das notas musicais (Figura 6);

 - As sete frequências vibratórias das cores do espectro visível da luz;

- Os sete tipos de configuração dos edifícios cristalinos: monoclínico, triclínico, cúbico, orto-rombico, tetragonal, trigonal e hexagonal;

- Os sete quadrantes de referência do espaço-tempo: alto, abaixo, direita, esquerda, frente, atrás e centro;

- Os sete períodos da vida humana: infância, adolescência, juventude, idade adulta, maturidade, velhice e senilidade;

- Os sete centros biológicos neuro-hormonais do corpo humano: raiz, umbilical, esplénico, coronário, laríngeo, frontal e coronal;

- Os sete “veículos” do Homem e seus correspondentes no plano da Física Quântica:

a) O físico ou Sthula Sharira/fermiões que constituem a matéria propriamente dita;

b) Duplo-etérico ou Prâna/campo electromagnético;

c) Astral ou Linga Sharira/campo das forças nucleares fracas;

d) Mental concreto ou Kâma Rupa/campo das forças nucleares fortes,

 (o seu conjunto define a geometria quaternária, o Tetragrammaton cabalístico);

e) Mental abstracto ou Kâma Manas/campo holomórfico;

f) Intuitivo ou Buddhi/campo do espaço granular;

g) Espiritual ou Atmâ/campo da informação,

 (definem a trindade ou configuram a geometria do ternário).

Estes dois conjuntos estabelecem ligação entre si pelo Antakharana ou Bosão de Higgs cujo campo confere massa ao quaternário – o iniciador da manifestação, do movimento Theos.

 

Figura 5 – A Década Pitagórica e a dinâmica “relacional”

Segundo Helena Blavatsky “Os antigos filósofos sempre atribuíram algo de misterioso e divino à forma do círculo. O mundo antigo, coerente com o seu simbolismo e as suas intuições panteístas, que unificam os dois Infinitos, o visível e o invisível, representava a Divindade, e também o seu Véu exterior por um círculo. Esta fusão dos dois em uma unidade e a aplicação do nome Theos indistintamente a ambos estão explicadas, mostrando-se ainda mais científicas e filosóficas.”


Figura 6 – Diagrama das séries harmónicas e a radiografia de um búzio. Imagem: imgur.com/gallery/XEOQPNi

“A matéria física é música solidificada” –  Pitágoras


 A união do círculo (resultante da distribuição equidistante de pontos infinitos ao ponto seu centro) com o quadrado representado pela Quadratura do Círculo envolve as forças do impulso energético do Fohat da tradição egípcia, o Sattva védico, a tal energia organizadora, a relação universal de sintropia/entropia representada por outra proporção fundamental, a relação entre o perímetro do círculo e a seu diâmetro, π = 3,1416…, onde se irá inserir, num tempo mais tardio, uma representação pela mão de Leonardo da Vinci conhecida como o Homem de Vitrúvio, o ser humano com alma divina, o Verbo feito carne.

 

João Porto

Ponta Delgada, 29 de Junho de 2021

Bibliografia

CARLOS ROVELLI, Helgoland, Edição Allenlane, Kobo-Fnac, 2021.

HELENA P. BLAVATSKY, A Doutrina Secreta, Cosmogénese, Volume I, Editora Pensamento, São Paulo, 1969.

JAIME BUHIGAS TALLON, “a Geometria Divina”, A esfera dos livros, 1ª. Edição, Março de 2021.

KUHNEN, R. F. “Em tudo uma porção de tudo”. In SOUZA, J. C. (org.). Pré Socráticos. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

 

Revista Fénix - Nova Acrópole Portugal

https://www.matematicaparafilosofos.pt/os-numeros-e-a-entropia-sintropia/

O Indescritível

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