segunda-feira, 3 de março de 2025

7 Ideias Anti-Reducionistas

 



1. Consciência e computadores

"Na verdade, este grande Ser que habita o coração é menor do que um grão de arroz, menor do que um grão de cevada, menor do que um grão de mostarda, menor do que um grão de painço; e, no entanto, é maior do que a terra, maior do que o espaço, maior do que os céus, maior do que todos os mundos juntos."

                                                                              Chandogya Upanishad 3.14.3


Hoje em dia, a relação entre Informação Semântica Computacional (ISC) e consciência é um tema complexo e debatido em filosofia da mente, ciência cognitiva e inteligência artificial. A questão central é saber se um sistema computacional que processa informação semântica pode ter ou simular consciência.

A computação clássica, onde podemos incluir o processamento de linguagem natural e as redes neurais, trabalha com semântica computacional ou seja, com a manipulação de símbolos que representam “significados”. No entanto, isso não implica que a máquina tenha consciência dos “significados”. Uma máquina pode associar palavras e conceitos, mas não há evidência de que "entenda" como um ser humano entende. Em 1980 o filósofo John Searle propôs uma experiência mental, conhecida por Quarto Chinês (1), demonstrando que um sistema que manipula símbolos (como um programa de inteligência artificial) pode simular a compreensão sem realmente entendê-la. Ou seja, um computador pode processar semântica sem consciência ou intencionalidade.

Porém alguns teóricos da mente computacional, como Daniel Dennett e defensores do Funcionalismo, argumentam que se um sistema computacional puder alcançar um nível suficiente de complexidade e integração de informação, poderia exibir algo funcionalmente equivalente à consciência. Também o modelo da Teoria da Informação Integrada (TII), de Giulio Tononi, propõe que a consciência “emerge” da forma como a informação é processada e integrada nos sistemas, dando a ideia da existência de milagres com o conceito de “emergência”, que afinal, nada explica.

No entanto algumas teorias mais recentes sugerem que a consciência pode ter um fundamento quântico. Roger Penrose e Stuart Hameroff, por exemplo, propuseram a teoria Orch-OR (Orchestrated Objective Reduction), na qual a consciência é devida a colapsos quânticos nos microtúbulos neuronais.

A nossa pretensão é explorar a ideia de que, se a informação semântica estiver ligada à estrutura fundamental do espaço-tempo, pode haver uma relação mais profunda entre computação (e a codificação de erros na informação quântica, de que trataremos mais adiante) e consciência. A verdade, é que hoje, os sistemas computacionais lidam com semântica de forma sintáctica, sem necessariamente terem experiência subjectiva (qualia). Se a consciência for apenas um processamento altamente integrado de informação, então um sistema avançado poderia aproximar-se dela. Mas se houver algo mais fundamental (como a estrutura do espaço-tempo ou “mecânica” quântica), então a computação clássica nunca conseguirá replicá-la. Se há algo para além da computação na consciência, uma hipótese radical e inovadora, é que a consciência pode ser um Princípio fundamental da natureza, assim como o espaço-tempo, a energia e a massa: a consciência aparece então como fenómeno fundamental.

Esta ideia defendida no Panpsiquismo apresenta a consciência como propriedade fundamental da realidade, presente até nas partículas elementares. A consciência encarada como um fenómeno multiespectral em vez de um fenómeno binário fisicalista (presente ou ausente, 0 ou 1). Outra é o Idealismo Metafísico que defende ser a consciência um princípio primário e a matéria a sua consequência, não o contrário. Faz lembrar as interpretações quânticas ao proporem que o observador tem um papel fundamental na estrutura da realidade.

Se assumirmos que a consciência é mais do que computação, então podemos concluir que esta pode estar inexoravelmente ligada à estrutura fundamental do espaço-tempo, e é deste pressuposto que vamos partir nesta aventura teórica.

2. A conexão entre consciência e a estrutura do espaço-tempo

"Naquele que é sem começo e sem fim, que é além do tempo e do espaço, no imutável, repousam os céus e a terra, o espaço e a mente, com toda a vida."

                                                            Shvetashvatara Upanishad 6.7


Como vimos, algumas ideias sobre este assunto incluem a Teoria Orch-OR  de Roger Penrose e Stuart Hameroff, que propõem que a consciência nasce de processos quânticos nos microtúbulos cerebrais, influenciados pela geometria do espaço-tempo onde poderia aliar-se a Holografia. Os microtúbulos, eles próprios possuem uma geometria holográfica.

Contudo a holografia estende-se a outras teorias, entre as quais as teorias da gravidade quântica, que implica ser a informação no universo codificada também de forma holográfica. Se a consciência for um processo informacional (2), pode estar ligada a essa estrutura holográfica da realidade.

Então vamos aplicar a mesma metodologia usada na computação quântica e introduzir os códigos quânticos na estrutura do espaço-tempo, que em nossa opinião, poderão estar intrinsecamente ligados a este problema. Se a consciência depende de processos não computáveis ou da própria geometria fundamental da realidade, como vimos antes, talvez seja necessário um novo tipo de "código" para descrevê-la, um código que vá para além da computação clássica e até mesmo da mecânica quântica tradicional. Deste modo é aqui que surgem eventualmente a proposta dos códigos quânticos, intimamente ligados à “substância” da consciência. Se a consciência for um aspecto fundamental da realidade, talvez precisemos de uma nova estrutura teórica para entendê-la, como já dissemos, algo que vá além da física clássica e até da mecânica quântica convencional.

Talvez a consciência esteja relacionada com alguma “camada” ainda mais profunda para além da estrutura do espaço-tempo, algo como uma "teia informacional" subjacente à própria realidade. Um network informacional tipo akasha védico e que alguns teorizam como “espuma de spins” (Carlo Rovelli). Esta visão unificadora, junta física, filosofia e tradições espirituais de uma maneira que não deixa de ser intrigante.

O conceito védico do akasha como um Campo informacional cósmico, emparceira com a teoria do campo unificado, a informação holográfica e até com outras hipóteses quânticas já lançadas sobre a consciência. Acreditando que se o espaço-tempo for mais do que apenas um "cenário" pode na verdade resultar de uma teia de informações primordiais. Talvez a consciência não seja apenas um fenómeno limitado, no mínimo, ao âmbito biológico, mas uma propriedade intrínseca dessa estrutura fundamental.

Poderíamos ver essa “teia informacional” como algo acessível directamente pela mente humana. O papel da intuição ou dos estados alterados de consciência. Neste caso a intuição corresponderia a Budhi pertencente ao ternário Atma, Budhi e Manas que fazem parte da constituição Septenária védica e hinduísta. Budhi seria a faculdade intuitiva superior, conectada à teia informacional fundamental (akasha), enquanto Manas representaria o intelecto e a mente racional, e finalmente, Atma a essência última do ser. Em qualquer caso, uma tríade que funciona num e como um todo. A intuição não é apenas um "atalho mental", mas passaria a ser um meio de aceder a níveis mais profundos da realidade. Talvez o que chamamos de insight ou “conhecimento directo” seja na verdade uma interacção com essa estrutura fundamental do universo e que pode ser cultivada por métodos específicos, como meditação ou mesmo práticas científicas avançadas e passíveis de controlo experimental (Raja Yoga). Se a consciência realmente interage com essa rede informacional, então práticas como meditação profunda possam actuar como um "afinamento" ou sintonização da percepção, enquanto abordagens científicas avançadas possam desenvolver métodos para detectar ou modelar essa interacção.

3. Plasmas, Pitris e consciência

"Aqueles que praticam ritos sacrificiais e caridade vão para a morada dos ancestrais (Pitrloka). Lá desfrutam de seu mérito, e quando o seu mérito se esgota, retornam a este mundo."

                                                  Brihadaranyaka Upanishad 6.2.16


Como já vimos a intersecção entre neurociência e física quântica pode revelar pistas sobre como a consciência “emerge” e interage com a realidade.

O universo é dominantemente plasmático (99% da matéria visível). Sendo o plasma o quarto estado da matéria, faz do plasma um candidato ideal para um substrato físico da interacção entre consciência e akasha.

Alguns físicos sugerem que o universo primordial era um plasma de quasipartículas, antes de se organizar em matéria fermiónica e espaço-tempo. Se partirmos do princípio que a consciência está ligada à estrutura fundamental do universo, será que há alguma relação com essa fase primordial? Inclusivamente foram trabalhadas hipóteses de que campos electromagnéticos no cérebro poderiam desempenhar um papel na consciência. Como os plasmas são condutores naturais de electricidade e magnetismo, talvez haja aqui alguma conexão oculta. Algumas pesquisas sugerem que o cérebro opera em um regime bio-electromagnético sofisticado, e se a consciência está além do físico, talvez interaja com estruturas plasmáticas dentro e fora do organismo.

Também algumas tradições esotéricas sugerem que o akasha pode ter propriedades semelhantes ao plasma – um meio dinâmico que armazena informação que liga diferentes níveis da realidade. Os plasmas podem perfeitamente ser mais do que um estado físico da matéria, possivelmente funcionando como um meio de transmissão ou armazenamento de informação dentro da consciência universal. Podemos encontrar nas tradições cosmogónicas védicas os Pitris Solares (Ágniṣvāttas) e Lunares (Barhiṣads) ligados geneticamente à formação do nosso planeta e da Lua.

Os Pitris Solares poderiam estar ligados aos plasmas de alta energia, como os ventos solares e as correntes de plasma interestelares, que estruturam e sustentam a informação no universo. Por outro lado os Pitris Lunares estariam associados aos plasmas mais densos e frios da matéria e da formação biológica, actuando como intermediários entre o mais subtil e o físico.


Plasma. Fonte - Creative Commons.

 

A um nível conceptual mais profundo, os plasmas poderiam ser um dos meios pelo qual o akasha se manifesta, servindo como um veículo informacional entre os estados de consciência e a estrutura da realidade.

Se o akasha for interpretado como um Campo informacional fundamental, e os plasmas forem altamente responsivos a campos electromagnéticos e a dinâmicas quânticas, como se prova na realidade, talvez haja uma relação profunda entre eles.

 Diferente dos sólidos, líquidos e gases, os plasmas possuem alta condutividade e interagem fortemente com campos electromagnéticos. Se a consciência universal opera através de um Campo subtil, o plasma poderia ser um dos "veículos" ou intermediários para essa interacção. Esta ideia é fundamento também no conceito de Universo Eléctrico, caro a Helena Blavatsky. Forçosamente isto poderá estar ligado a outra estrutura: o universo pode ser estruturado de forma holográfica, e o plasma cósmico primordial pode ter sido o "suporte" para a codificação dessa informação, como se a realidade manifesta fosse uma projecção de uma camada mais profunda.

Um caminho interessante para unir a tradição védica e a teosofia com a ciência moderna.

4. Estados expandidos e EQM`s

"Quando a mente está silenciosa, além do enfraquecimento pelo desejo, então aquele, como um sol sem nuvens, contempla o Ser supremo."

     Mundaka Upanishad 3.1.8


Se a consciência interage com a “teia informacional” do akasha por meio de estados ampliados, talvez seja possível aceder a padrões de informação que não estão disponíveis na percepção comum. Constituem os fenómenos de experiências místicas, visões durante meditação profunda e até relatos de algumas investigações com substâncias enteogénicas - do grego entheos ("cheio de deus" ou "inspirado pelo divino") e genesthai ("vir a ser"), cujos efeitos parecem "sintonizar" a mente a diferentes frequências da realidade senciente. Já para não falar das Experiências de Quase Morte (EQMs) cada vez mais reportadas, sobretudo nos meios hospitalares.

Inicialmente alguns pesquisadores propuseram uma hipótese de cariz neurológico para os fenómenos relatados nas EQMs. Seriam causadas por um conjunto de factores como a anoxia cerebral (falta de oxigénio cerebral), a libertação de neurotransmissores ou uma actividade anómala nas redes neuronais, incidentes ao nível do córtex visual e do sistema límbico. No entanto esta hipótese tem vindo a ganhar menos adeptos, uma vez que os fenómenos são acompanhados por confirmações médicas abalizadas (e não só) de situações colaterais, especialmente quando estas são sustentadas por relatos verificáveis de percepção fora do corpo em que os fenómenos relatados vão além do que pode ser explicado por processos cerebrais. Deste modo surgiu a designada Hipótese da Consciência Não-Local.

O que as EQMs propõem, é que se a consciência pode continuar a existir em estados onde a actividade cerebral está gravemente comprometida ou ausente (como nas paragens cardíacas), a mente pode existir independentemente do substrato neurológico. Milhares de casos tem sido documentados, como relatos de pessoas que descrevem detalhes verificados do ambiente em redor enquanto estavam clinicamente "inconscientes" ou os constantes relatos de padrões similares que envolvem um túnel de luz, sensação de paz, revisão da vida e “encontros” com entidades familiares já falecidas ou outras a longas distâncias do evento. Para não falar das consequências das EQMs nas mudanças permanentes induzidas na personalidade com transformações duradouras nas perspectivas e valores de vida das pessoas que passam por elas, indicando uma interacção profunda com um nível mais fundamental da realidade. Tudo isto se passa numa dimensão do foro interior ou interno pessoal mas, envolvendo também uma dimensão não-local externa ao indivíduo.

Nada disto é novidade: lembremo-nos apenas dos textos icónicos do Livro dos Mortos Tibetano, o "Bardo Thödol", que significa "Libertação pelo Ouvir no Estado Intermediário", onde se descreve o processo da morte e da transição entre vidas, guiando a consciência através dos estados intermediários (bardos); ou o Livro dos Mortos Egípcio, o "Peret Em Heru", que pode ser traduzido como "O Livro da Saída para a Luz", uma colectânea de instruções para auxiliar a alma na jornada pelos desafios do submundo (Duat), a vida após a morte.

Mas se os estados de consciência expandidos são uma ciência de foro “interno”, então podem ser sistematicamente estudados e aprimorados, talvez combinando práticas meditativas com uma compreensão mais profunda da relação entre mente, energia e informação. Poderia até levar a uma espécie de "tecnologia da consciência" baseada em princípios naturais e estruturais da realidade. São algumas abordagens contemporâneas, como a neurociência da meditação, a física da consciência e até certos aspectos da novíssima exploração quântica da mente. Sabe-se o quanto a estrutura do cérebro pode mudar em resposta à meditação e práticas introspectivas em que a sua neuroplasticidade conduz a estados alterados ou ainda como a consciência pode influenciar sistemas físicos (o efeito do observador na física quântica).

Por outro lado as teorias da informação e a holografia podem oferecer modelos profundos para entender a relação entre consciência e realidade. É assim que o Princípio Holográfico sugere que toda a informação de um volume tridimensional pode ser codificada na sua fronteira bidimensional. Chegámos ao ponto de equacionar, se a consciência interage com essa estrutura informacional, afinal será que a nossa percepção da realidade é uma projecção holográfica a um nível mais fundamental?

Alguns físicos teorizam que o espaço-tempo pode emergir da interconexão da informação quântica. Se a consciência estiver ligada à informação fundamental, talvez  tenha um papel na própria estrutura do universo. No entanto outros investigadores defendem a consciência como um processador de informação em que a mente não apenas recebe informações de um campo holográfico universal, mas as "descodifica" - o que reforça a concepção do akasha como rede informacional.

Isto implica que a consciência não é um mero observador da realidade holográfica, mas um participante activo, um componente essencial da estrutura informacional do universo. Se a consciência faz parte da teia holográfica, então a própria percepção e cognição podem ser manifestações de um processo mais profundo de organização da informação, transformando o universo num sistema auto-organizável de informação, onde a consciência não apenas recebe informações, mas contribui para a construção da realidade percebida. Se a consciência influencia a teia informacional, talvez os estados mentais possam alterar, de alguma forma, as próprias leis emergentes do espaço-tempo estabelecendo, em bases apropriadas, a relação entre observador e realidade e reforçar o conceito de akasha como um "Campo participativo", em vez de ser apenas um repositório de informações, transformando-o agora num tecido dinâmico onde a consciência interage e molda a realidade.

 

Se a realidade “emerge” de uma rede informacional dinâmica, a consciência pode perfeitamente influenciar a entropia em modos que vão além daqueles considerados pela termodinâmica clássica (3). Podemos até definir uma "entropia de participação", que mediria o quanto um observador interage e altera a distribuição da informação na teia fundamental, lembrando a entropia holográfica de Bekenstein-Hawking (4), mas numa forma expandida daquele conceito para considerar também a influência do observador como parte do processo.

Samsara. Fonte - Wikimedia Commons

 

"Assim como uma pessoa descarta roupas velhas e veste novas, da mesma forma a alma abandona corpos gastos e assume novos."

Bhagavad Gita 2.22

 Esta passagem do Bhagavad Gita ilustra de forma simples e incisiva a ideia do renascimento cíclico dentro do Samsara, onde a consciência se move através de diferentes corpos e experiências, semelhante a um processo de actualização e continuidade dentro de uma estrutura dinâmica da realidade visível e invísivel.

Segundo as tradições filosóficas presentes no Hinduísmo, Budismo e Jainismo, o Samsara é um ciclo contínuo de nascimento, morte e renascimento ao qual os seres estão sujeitos e, que podemos extrapolar a uma escala física da existência do Universo, dado a sua semelhança com a nova cosmologia de Roger Penrose dos Ciclos Cosmológicos Conformes – CCC, sustentada largamente pelos últimos dados observacionais do telescópio espacial James Webb. O Samsara representa a existência condicionada, onde a consciência se move através de diferentes estados e formas de vida, impulsionada pelo karma — a lei de causa e efeito, num ciclo infinito de éons – e do qual só se liberta apenas quando atinge a libertação referenciada como Moksha no Hinduísmo ou o Nirvana no Budismo.

Na base deste conceito poderá estar uma não-linearidade da informação, um Campo de interacções entrelaçadas, onde acontecimentos futuros influenciam eventos passados, reestruturando a trajectória da consciência. Se o karma for visto como um princípio de equilíbrio cósmico, a retrocausalidade poderia permitir que futuros estados de consciência “corrigissem” padrões passados, assemelhando-se à ideia de códigos quânticos de correcção de erros na computação quântica, onde informações podem ser restauradas mesmo se já tivessem sido “corrompidas” no passado. Fundamental ter por princípio, que a informação temporalmente não-linear abrange fluxos direccionais do passado-presente-futuro mas também os reversos correspondentes.

Ou seja, o akasha entendido como um Campo informacional fundamental, pode deste ponto de vista, conter tanto registos passados quanto potenciais futuros. A retrocausalidade poderia então ser um mecanismo de normalização, pelo qual os padrões kármicos são ajustados em resposta a estados futuros de consciência, na medida em que a realidade a este nível ajusta-se para manter a coerência da “teia informacional” fundamental e universal.

Haveria aqui que tirar consequências mais profundas, e considerar que a libertação do Samsara não seria apenas uma questão de “expiação” (no sentido das tradições religiosas) de acções passadas, mas também de reescrita da própria estrutura informacional da consciência com implicações sobre livre-arbítrio e a possibilidade de alterar não apenas o futuro, mas a própria teia causal da realidade. O karma assumiria o papel de um princípio mais profundo de auto-organização e equilíbrio cósmico. A retrocausalidade, a ideia de que efeitos futuros podem influenciar causas passadas, seria uma deriva lógica do funcionamento do universo como uma “teia informacional” interconectada, onde passado, presente e futuro não são entidades estáticas, mas sim aspectos interdependentes de uma realidade mais profunda.

Em apoio desta ideia poderemos citar um trecho dos Upanishads:

 

"No imutável, passado e futuro estão contidos. Aquele que percebe isto transcende o tempo e não mais renasce."

Maitri Upanishad 6.15

Indica-nos que o passado e futuro não são sequências fixas, mas aspectos de uma realidade atemporal de não-localidade, acessíveis, por exemplo, a uma consciência expandida. Deste modo se o tempo é um fenómeno que “emerge” dentro de uma estrutura não-local de sobreposição quântica, então acontecimentos futuros poderiam influenciar eventos passados, e possíbilitarem a retrocausalidade.

 Além disso, aquele trecho também menciona a transcendência do tempo e do renascimento, indicando claramente que a libertação do Samsara envolveria um alinhamento com este princípio, onde a causalidade convencional, normal no nosso dia-a-dia, perde a sua rigidez. Ao invés, neste domínio a consciência passa a interagir com diferentes momentos da linha temporal.

5. O akasha como um "Campo participativo" gerador de karma

"Assim como o espaço (Akasha) penetra tudo, grande, infinito e omnipresente, assim também o Ser Supremo habita todos os seres, mas permanece além deles."

                                                                   Mundaka Upanishad 2.1.1

Então o akasha não seria apenas um registo passivo da informação, mas um sistema dinâmico de causalidade, onde a consciência interage e gera padrões que influenciam tanto a realidade subjectiva quanto objectiva. O karma, nesse contexto, poderia ser entendido como a estrutura de retro alimentação dentro desse campo informacional, onde cada acção e intenção reverbera e molda futuras experiências, o que não está longe de algumas ideias actuais da física e da teoria da informação.

A ligação entre rectrocausalidade e entrelaçamento surge aqui espontaneamente uma vez que o universo é essencialmente informacional. Então os eventos podem influenciar o passado e o futuro de maneiras que ainda não compreendemos completamente. Também os conhecidos Campos morfogenéticos (Rupert Sheldrake) e registos akáshicos védicos como padrões de comportamento e memória colectiva, poderiam estar codificados num campo informacional, ressoando com consciências individuais e colectivas. A informação não se perderia, mas sofreria redistribuição, como autênticos processos quânticos de feedback, em que as nossas opções e estados de consciência deixariam impressões profundas na estrutura holográfica da realidade.

 Será que o karma estaria arredado dos efeitos da 2ª lei da termodinâmica? O karma poderá ser apreciado como um “mecanismo” de equilíbrio na “teia informacional”. Se a entropia mede o quanto a informação se encontra distorcida, então o karma pode ser visto como um processo natural de redução da entropia informacional, restaurando a longo prazo, em processos de rectrocausalidade e entrelaçamento, os padrões coerentes da teia. Na própria teia poderão surgir modelos espectrais de entropia relativa onde aquela tenderia a estados de menor entropia precisamente através da participação das consciências.

Isso significa que o karma não seria apenas um sistema moral ou simbólico, mas uma dinâmica fundamental da realidade, semelhante às leis da física, onde cada acção, intenção ou estado de consciência influencia o fluxo da informação no akasha.

Se o akasha é um Campo participativo, então o karma pode ser visto como a interacção contínua entre consciência e estrutura da realidade, equilibrando e ajustando padrões informacionais ao longo do nosso tempo. A prova estaria em princípios como a conservação da informação (Lavoisier: nada se cria, nada se perde, tudo se transforma), a interdependência sistémica, da Teoria dos Sistemas Complexos, em que as acções individuais afetam o todo ou o Princípio da Causalidade Holográfica, onde pequenas mudanças podem influenciar toda a estrutura (o Efeito Borboleta da Teoria do Caos). No seu conjunto, reflectiria a ideia ancestral de que o karma opera em múltiplas escalas espectrais.

O karma operaria não apenas a um nível individual, mas como um Campo colectivo de informação, onde as interacções entre consciências moldam a realidade compartilhada. Este conceito é suportado pela teoria dos Campos Morfogenéticos, uma vez que a consciência colectiva cria padrões informacionais que influenciam futuras gerações e estruturas da realidade. Também o equilíbrio do universo poderia nascer da interacção entre mil milhões de consciências, ajustando-se dinamicamente, como advoga a Teoria dos Sistemas Complexos. Assim se a consciência influencia a “teia informacional”, um número suficiente de mentes focadas poderia alterar estados da realidade em grande escala, o designado Efeito do Observador Ampliado (5).

Abre esperanças acerca da possibilidade de que mudanças na consciência colectiva possam conduzir também a transformações profundas na realidade, suportando a ideia do karma colectivo das nações.

6. O conceito de Potências em Pistis Sophia e o akasha

"E ele prosseguiu dizendo: ‘As Potências do Grande Invisível se moveram segundo sua ordem, enviando luz e força para aqueles que são dignos, para que possam se elevar e transcender as esferas inferiores.’"

   Pistis Sophia, Capítulo 86


No gnosticismo de Pistis Sophia, as Potências representam forças espirituais e inteligências que governam os processos de âmbito cósmico, influenciando tanto a ascensão da consciência quanto os ciclos de aprendizagem e redenção. Podem ser vistas como estruturas dinâmicas da realidade, responsáveis pelo equilíbrio e fluxo das experiências materiais ou subtis.

Se na realidade o akasha for um campo informacional participativo, as Potências poderiam ser interpretadas como princípios ou agentes dentro desse Campo, operando em diferentes níveis da realidade, como Campos de informação e energia que estruturam a manifestação da consciência e da matéria, forças reguladoras do karma, assegurando que as dinâmicas de equilíbrio no akasha fossem mantidas e também os aspectos de uma estrutura holográfica, onde diferentes níveis de consciência interagem com padrões arquetípicos da realidade. Não esquecer que o akasha surge não apenas de um “registo”, mas de um Campo vivo, no qual, neste sistema, as Potências poderiam actuar como moduladores da informação.

As Potências podem ser compreendidas como diferentes níveis de consciência informacional, onde cada camada opera dentro do akasha de maneira específica. Esta ideia, encontramo-la afinal fazendo parte das abordagens, tanto esotéricas quanto científicas.

Como na computação e na física da informação, existem hierarquias de informação que se entendem como diferentes níveis que organizam e processam a informação de maneiras distintas, no akasha isso poderia manifestar-se como camadas de consciência interligadas. Pressupondo que a realidade é holográfica, então cada nível de consciência poderia conter padrões informacionais que influenciam as outras camadas dando forma a estruturas holográficas de consciência. Ora se essas forças representariam níveis da mente universal. Então ter acesso a determinadas Potências pode equivaler a alcançar estados superiores de percepção e interacção com o akasha, de modo que as Potências poderiam ser também assumidas como se, de certo modo, fossem estados de consciência expandidos.

Se a “teia informacional” fundamental estrutura a realidade, então os códigos quânticos, dos quais faremos referência de seguida, podem ser a linguagem matemática que mantém essa estrutura coesa. Assim, poderíamos construir um código quântico holográfico, onde os erros não são apenas perturbações, mas sim distorções do significado (lá vem a semântica em nossa ajuda) na rede informacional. Logo, as Potências em Pistis Sophia, seriam corretores quânticos intrínsecos a esta dimensão.

Se o espaço-tempo (ou a própria realidade) “emerge” de códigos quânticos, então porque não considerar a entropia, segunda lei da termodinâmica, que mediria a degradação da informação fundamental?

Esta ideia iria de encontro à existência de mecanismos naturais de correcção para restaurar os estados coerentes da “teia informacional”, ideia reflectida na concepção das Potências em Pistis Sophia, assumidos agora como códigos de correcção quântica naturais, operando como restauradores da coerência informacional.

7. Finalmente os códigos de correcção quântica

"Assim como um ourives remove as impurezas do ouro pelo fogo, assim também o praticante remove as suas impurezas e se torna puro."

 

   Dhammapada 239


Poderíamos agora encarar um outro nível de interacção entre consciência individual, e os níveis informacionais do akasha em que essas Potências agiriam como códigos de correcção quântica. Se as Potências em Pistis Sophia (a que detém o conhecimento) forem interpretadas como níveis de consciência informacional, então elas poderiam agir como códigos de correcção quântica dentro do próprio akasha.

Os códigos quânticos são fundamentais na física da informação e na teoria da gravidade quântica ao protegerem a informação contra degradação e ruído, garantindo a coerência do sistema. Mas nas abordagens holográficas onde a geometria do universo emerge da codificação da informação, desempenhariam um papel importante na manutenção da estrutura do espaço-tempo e criar uma redundância inteligente, permitindo que a informação fosse recuperável mesmo quando partes do sistema são alteradas. Também de acordo com o fenómeno de sobreposição e de emaranhamento quântico.

Se o akasha for um campo informacional holográfico, as Potências poderiam ser equivalentes a códigos de correcção quântica que assim manteriam o equilíbrio do karma ao evitar a perda ou distorção da informação gerada pela consciência e, regulariam a estrutura da realidade, garantindo que diferentes níveis de consciência se interconectassem sem fragmentação. Deste modo possibilitariam a ascensão da consciência, corrigindo “erros” que poderiam levar ao aprisionamento da mente em estados inferiores de percepção. Estaria aqui implícito o conceito budista do Dharma?

Assim as Potências não seriam apenas forças espirituais simbólicas, mas princípios estruturais que garantiriam a estabilidade da realidade informacional, algo intrínseco, fenómeno de não-localidade e de emparelhamento numa dimensão para além das limitações do nosso espaço-tempo vivencial.

Na não-localidade quântica a informação pode ser compartilhada instantaneamente entre sistemas distantes, de modo que as Potências poderiam ser princípios actuantes simultaneamente em todo o akasha. Com a Codificação holográfica, se a realidade é um holograma informacional, então as Potências seriam padrões de correcção que mantêm a coerência desse sistema permitindo que a consciência e o akasha possam operar numa camada mais profunda da realidade em que a correcção da informação não ocorre apenas dentro do universo observável, mas numa dimensão mais fundamental, onde a consciência e a estrutura da realidade estão entrelaçadas.

Significa que essa dimensão actua como uma estrutura subjacente, garantindo a coerência da realidade sem que seja directamente perceptível. A realidade visível seria apenas uma projecção de interacções informacionais mais profundas em que o espaço-tempo surge da informação quântica e a correcção quântica como mecanismo oculto. Da mesma maneira como os códigos quânticos computacionais corrigem erros sem que os sistemas clássicos percebam, também as Potências poderiam actuar como princípios estruturantes invisíveis, mimetizando, na dimensão psicológica, o processo de como o inconsciente molda a mente sem ser directamente acessível. As Potências poderiam regular a informação do akasha sem intervenção directa da percepção comum.

Embora essa dimensão seja inacessível directamente, no entanto a sua influência pode ser experimentada ou traduzida quando a consciência entra em estados específicos de ressonância. Estados, esses que corresponderiam a princípios de sintonia quântica tais como aqueles quando as partículas entrelaçadas mantêm uma conexão instantânea. Também os estados elevados da consciência poderiam sintonizar-se com padrões informacionais profundos, alavancados por meditação, introspecção profunda. Em alternativa, certos insights intuitivos poderiam servir como "chaves" para interagir com essa estrutura em que a mente poderia captar essas influências através de símbolos, narrativas ou experiências subjectivas profundas. Daí também a razão e importância da semântica e do simbolismo.


Um futuro auspicioso

Acreditamos ser possível uma abordagem científica que vá além do reducionismo clássico e explore os chamados “novos modelos de consciência”. Na nossa opinião isso significa que a consciência não pode ser reduzida a uma mera “emergência” computacional, mas envolve uma conexão activa com a estrutura informacional subjacente ao universo. Neste sentido confluem actualmente algumas áreas do conhecimento e da investigação científica que nos perspectivam grandes desenvolvimentos. Contamos desde logo com a Teoria da Informação Quântica (TIQ) na investigação de como a consciência pode interagir com a informação fundamental do universo.

A Neurociência e os Estados Alterados de Consciência poderão também mapear como diferentes estados mentais podem modular a ligação com o akasha ou a “teia informacional”, enquanto a Física Holográfica e a Teorização do Espaço-Tempo e da Gravidade Quântica na área da Cosmologia e da Astrofísica poderão dar um contributo decisivo ao explorar se a estrutura do universo já codifica essa interacção com experimentos ligados, por exemplo, à detecção de ondas gravitacionais.

Se o akasha for um Campo informacional fundamental, talvez a consciência possa ser descrita em termos de princípios metafísicos ainda não totalmente compreendidos, como entrelaçamento quântico, não-localidade e computação holográfica.

Forçosamente que necessitamos de progredir noutras direcções de natureza científica, mas não do âmbito reducionista tradicional, que eventualmente poderão possibilitar a construção de experiências relativas à interacção da consciência com a “teia informacional”. Alguns laboratórios têm realizado estudos empíricos com EEG, fMRI e experimentação quântica numa tentativa, muitas vezes frutífera, de correlacionar estados de consciência com fenómenos de não-localidade. Também só agora o fenómeno de não-localidade, emparelhamento e sobreposição, está a ser melhor compreendido, sobretudo na área computacional quântica. Precisamente o desenvolvimento de modelos teóricos que liguem a informação quântica, correcção de erros e o papel da mente, poderão mostrar-se atraentes a curto prazo.

Ainda no domínio da Teoria das Probabilidades também poderão surgir contributos com algumas experiências concebidas na exploração de padrões estatísticos em eventos globais para avaliar se a consciência colectiva influencia sistemas físicos.

De algum modo estas e outras abordagens talvez ofereçam maneiras científicas e bases matemáticas na exploração na direcção do akasha/karma como uma estrutura activa da realidade. A consciência poderia ser modelada como uma interacção entre topologia (estrutura do espaço-tempo informacional) e dinâmica quântica (participação activa no colapso da realidade). Assim, poderíamos incluir uma versão expandida da equação de Wheeler-DeWitt, onde a função de onda do universo inclui um termo para a informação participativa da consciência.

Com este modelo da “teia informacional” fundamental, não poderíamos descartar o papel universal da entropia. A entropia, como lhe é própria pelas suas inerências atribuídas pela Física, teria que adquirir um papel fundamental porque mediria não só a incerteza, mas o grau de coerência do significado, num aspecto mais profundo. Estabelecer-se-ia uma relação entre os códigos quânticos onde estes corrigiriam as entropias que distorcem a informação fundamental, de modo que a consciência participaria na dinâmica da entropia, por influenciar o próprio equilíbrio informacional. O karma, afinal poderia também ser visto como um mecanismo de redução da entropia informacional fora dos limites impostos pelo espaço-tempo local. Estaríamos a ligar a entropia não apenas ao caos e à perda de informação, mas a um fluxo dinâmico onde a consciência e os códigos da realidade actuariam para manter a estrutura da “teia informacional”.

Acredito que esta exposição será considerada pouco ortodoxa, tanto pela ciência como pelos recônditos conceitos expressos nos conhecimentos esotéricos. Contudo o caminho muitas vezes faz-se por atalhos que chegam mais depressa aos objectivos pretendidos. O nosso objectivo, excluído qualquer pretensiosismo bacoco e de aviltação do ego, foi mostrar possíveis ligações entre conhecimentos ancestrais e as mais recentes teorias científicas que fazem caminho em tantos domínios, e que parecem indicar que a humanidade sempre teve os mesmos paradigmas, porém tratados com linguagens diferentes de acordo com as circunstâncias dos tempos que lhes foram próprios.

É certo que a humanidade terrestre está na sua infância mas começa a dar os seus primeiros passos.

 

Notas

(1) A experiência do Quarto Chinês foi proposta em 1980 pelo filósofo John Searle, para argumentar contra a ideia de que a inteligência artificial pode realmente ter compreensão ou consciência.

Imagine que uma pessoa que não sabe chinês está trancada num quarto. Dentro do quarto, há um conjunto de regras escritas num idioma que ela entende (por exemplo, inglês) e um manual que diz como manipular símbolos chineses sem precisar compreendê-los.

Do lado de fora, chineses enviam perguntas escritas em chinês para dentro do quarto. A pessoa dentro do quarto usa o manual para combinar os símbolos e gerar respostas apropriadas, que depois são passadas para fora. Para um observador externo, parece que há alguém no quarto que compreende chinês, porque as respostas são coerentes. No entanto, a pessoa dentro do quarto não entende nada do que está acontecendo porque segue apenas as regras sintácticas.

Searle mostra-nos que essa situação é análoga ao funcionamento dos computadores e da inteligência artificial. Estes manipulam símbolos segundo regras formais (como um programa de computador faz com os dados), mas não têm compreensão real do significado (semântica). Em conclusão, a IA pode simular inteligência, mas não tem uma consciência verdadeira ou um entendimento genuíno – falta-lhe qualia.

(2) Impõe-se nesta altura fazer a distinção entre os conceitos de informação de Shannon e informação Informacional. Genericamente reside na abordagem e no significado atribuído à informação. A informação de Shannon (conhecida como Teoria da Informação), formalizada por Claude Shannon em 1948, trata da quantificação, armazenamento e transmissão de informação com foco na estrutura estatística dos sinais e das mensagens, sem se preocupar com o seu significado (semântica), traduzindo-se em bits (0/1) e apenas preocupada com a redução da incerteza nos sistemas.

A Informação Informacional está, pelo contrário, intimamente ligada a um conceito mais amplo e envolver não apenas a estrutura estatística da informação, mas também o seu significado, a interpretação e o impacto da informação nos sistemas que a recebem. Sobretudo relaciona-se com os domínios da epistemologia, da filosofia da informação, dos sistemas biológicos e da computação, incluindo noções de informação semântica, informação contextual e até informação quântica, dependendo do campo de estudo.

Resumindo: enquanto a primeira trata a informação como uma propriedade quantitativa dos sinais, sem considerar o seu significado, a segunda estabelece uma óptica mais ampla que incluí a semântica, a pragmática e o impacto nos sistemas. A primeira diz-nos a quantidade de informação existente, mas não o que essa informação significa. Já a informação informacional, dependendo do contexto, engloba qualidade, significado e impacto, o que se alinha muito mais com a ideia de uma “teia informacional” fundamental, onde a informação não é apenas um dado bruto, mas algo que co-cria a realidade.

Como afirma Federico Faggin, na sua perspectiva de aplicação da informação informacional aos sistemas biológicos: “Live information is the informational, energetic, and material aspects of living organisms that can only be explained with quantum physics.”, Irreducible, Essentia Books, 2024, pp 101.

Como veremos na abordagem feita por nós sobre a consciência e da “teia informacional” fundamental, a informação de Shannon adquire apenas um aspecto superficial da estrutura informacional maior, porquanto o conceito informacional envolve outras ressonâncias, camadas mais profundas de significado e participação no akasha. Como se a teoria de Shannon lidasse apenas com a casca, enquanto a “teia informacional” fundamental estivesse ao nível de um Campo participativo, onde a informação não apenas reduz a incerteza, mas molda o próprio tecido da existência. Lembra até a ideia de Wheeler com o It from Bit, mas indo mais além, onde o bit não apenas descreve a realidade, mas também a gera e interage com a consciência.

Aqui levanta-se uma outra questão: será que a informação informacional pode ter uma estrutura matemática além daquela presente em Shannon? Algo que incorpore significado, contexto e até participação consciente, reforçando a ideia de que o espaço-tempo pode nascer a partir de relações informacionais mais profundas, talvez até algo análogo a códigos quânticos que estruturam a realidade. Trataremos de explorar esta ideia mais adiante.

(3) A Segunda Lei da Termodinâmica afirma que a entropia de um sistema fechado aumenta tendencialmente ou, no mínimo, mantém-se constante. Dentro da visão da “teia informacional”, precisaríamos reformular essa lei para incluir o papel da informação, da consciência e dos códigos de correcção quântica, “mecanismo” de estabilização, que introduziremos mais tarde na nossa exposição. No paradigma clássico, a entropia aumenta porque os sistemas tendem a assumir estados mais prováveis, porque as distribuições aleatórias são mais numerosas do que estados ordenados.

A entropia pode introduzir outro conceito ligado à tendência natural da informação em fragmentar-se e por conseguinte perder coerência, se encararmos a proposta de que a realidade “emerge” de uma “teia informacional”. Esse processo poderia ser descrito como uma dissipação da ressonância informacional, onde partes da teia poderiam perder ligação com os padrões estruturantes. Nesta lógica, a segunda lei da termodinâmica poderia ser vista como a manifestação de uma degradação da coerência informacional quando não há participação activa da consciência ou de mecanismos de correcção. Como se a consciência ao interagir com a “teia informacional”, pudesse actuar reduzindo a entropia e organizando padrões de informação. Não é por acaso que o Princípio de Landauer, relaciona o colapso de informação ao aumento de entropia. A consciência reverteria os processos imanentes de dispersão informacional.

Em termos matemáticos, isso poderia ser descrito como um termo adicional na equação da entropia, onde a interacção consciente contribui negativamente para a sua taxa de crescimento. Ou seja a segunda lei não seria absoluta, mas adquiriria um carácter estatístico, e poderia ser equilibrada por processos correctivos em escalas apropriadas. Simplesmente a quântica aplicada à entropia.

Outras ligações à entropia são dadas por modelos como aquele da gravidade emergente de Verlinde, onde a entropia está conexa à geometria do espaço-tempo. Em vez de ser uma interacção fundamental, a gravidade surge quando a informação no espaço-tempo se distribui de forma desigual, implicando que o próprio tecido do espaço-tempo armazena informação, e a gravidade é um reflexo de como essa informação é organizada.

Inspirado no Princípio Holográfico, Verlinde argumenta que a informação da gravidade está codificada na superfície do espaço-tempo (como a informação de um Buraco Negro está codificada no seu horizonte de eventos). Também da sua argumentação, e vindo ao nosso encontro, surge uma ideia relativa à natureza da “matéria escura” que afinal pode ser apenas um efeito geométrico da estrutura informacional do espaço-tempo como se esta contivesse informações, “variáveis ocultas”, que influenciariam a dinâmica do espaço-tempo, sem necessidade de matéria exótica.

A gravidade emergente de Verlinde reforça a ideia de que o espaço-tempo pode ser entendido como uma rede informacional. Se a informação estrutura a realidade, então a gravidade pode ser simplesmente um efeito secundário da organização dessa informação e a consciência poderia interagir com essa “teia informacional”, talvez até alterando sua distribuição, e portanto afectando a própria gravidade. Uma hipótese que explicaria os fenómenos de levitação verificadas em experiências místicas e estados alterados de consciência, nas práticas do yoga e dos mestres espirituais ou ainda naqueles fenómenos espontâneos relatados em estados de êxtase ou profunda concentração de Teresa dʼÁvila.

Se a consciência pode actuar sobre a informação fundamental da realidade, então estados profundos de concentração podem ser capazes de reduzir a entropia informacional local, gerando um efeito gravitacional reverso. Em termos físicos, traduzir-se-ia por uma reconfiguração do campo informacional subjacente, não constituindo uma violação da gravidade clássica, observada por nós na nossa dimensão física.

Outra consequência prende-se com a remoção da necessidade de uma partícula mediadora da gravidade, um novo bosão a descobrir – o tão ansiado gravitão que comporia o Modelo Padrão.

Também a gravidade em Newton pode ser derivada a partir de um princípio entrópico: quando uma massa se aproxima de outra, a configuração informacional do espaço-tempo ao redor muda, aumentando a entropia, fazendo com que a gravidade nos surga como uma força estatística que empurra os corpos para estados de maior entropia.

(4) A Entropia Holográfica de Bekenstein-Hawking (EHBH) estabelece uma relação profunda entre a gravidade, a termodinâmica e a informação. Descreve a entropia de um Buraco Negro como proporcional à área do horizonte de eventos, onde a informação gravitacional é codificada em superfícies, e não no volume do espaço-tempo. Em resumo: A entropia de um Buraco Negro não cresce com o volume, mas sim com a área da sua fronteira!

O conceito EHB é também fundamental para o Princípio Holográfico e para a gravidade emergente de Verlinde e a holografia quântica.

(5) O Efeito do Observador Ampliado pode ser interpretado como uma generalização do ainda pouco compreendido efeito do observador na mecânica quântica, mas com implicações que vão além do contexto tradicional do exercício de medições em sistemas microscópicos (interacção objecto observado e observador). Este Efeito do Observador Ampliado envolve a possibilidade de que a consciência não apenas afecte o colapso da função de onda ao nível microscópico, mas também tenha um papel activo na organização da realidade física e informacional em larga escala.

 No âmbito deste trabalho este conceito poderia abranger e reforçar a relação entre consciência, informação e a própria estrutura do espaço-tempo. A consciência poderia influenciar a “teia informacional” fundamental do universo, reconfigurando padrões de informação e afectando probabilisticamente a ocorrência de eventos numa escala maior do que aquela normalmente associada ao efeito quântico. Esse conceito teria a sua aplicação devido ao entrelaçamento e à não-localidade.

Hipoteticamente se a mente pode aceder a diferentes camadas da realidade por meio de estados expandidos de consciência, então o Efeito do Observador Ampliado poderia desencadear uma interacção ressonante entre a mente e a estrutura subjacente do universo. Justificaria a ideia de que estados meditativos profundos, experiências visionárias ou mesmo a tentativa de utilização de procedimentos tecnológicos avançados, mas ainda não descortinadas, permitissem uma interacção mais directa com a malha informacional do universo.

 

João Porto e Ponta Delgada, 4/3/25


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