1. Consciência e computadores
"Na verdade, este grande Ser que habita o coração é menor do que um grão de arroz, menor do que um grão de cevada, menor do que um grão de mostarda, menor do que um grão de painço; e, no entanto, é maior do que a terra, maior do que o espaço, maior do que os céus, maior do que todos os mundos juntos."
Chandogya Upanishad 3.14.3
Hoje em dia, a relação entre Informação Semântica Computacional
(ISC) e consciência é um tema
complexo e debatido em filosofia da mente, ciência cognitiva e inteligência
artificial. A questão central é saber se um sistema computacional que processa
informação semântica pode ter ou simular consciência.
A computação clássica, onde podemos incluir o
processamento de linguagem natural e as redes neurais, trabalha com semântica
computacional ou seja, com a manipulação de símbolos que representam
“significados”. No entanto, isso não implica que a máquina tenha consciência
dos “significados”. Uma máquina pode associar palavras e conceitos, mas não há
evidência de que "entenda" como um ser humano entende. Em 1980 o
filósofo John Searle propôs uma experiência mental, conhecida por Quarto Chinês
(1), demonstrando que um sistema que
manipula símbolos (como um programa de inteligência artificial) pode simular a
compreensão sem realmente entendê-la. Ou seja, um computador pode processar
semântica sem consciência ou intencionalidade.
Porém alguns teóricos da mente computacional,
como Daniel Dennett e defensores
do Funcionalismo, argumentam que
se um sistema computacional puder alcançar um nível suficiente de complexidade
e integração de informação, poderia exibir algo funcionalmente equivalente à
consciência. Também o modelo da Teoria
da Informação Integrada (TII), de Giulio Tononi, propõe que a
consciência “emerge” da forma como a informação é processada e integrada nos
sistemas, dando a ideia da existência de milagres com o conceito de
“emergência”, que afinal, nada explica.
No entanto algumas teorias mais recentes sugerem
que a consciência pode ter um
fundamento quântico. Roger Penrose e Stuart Hameroff, por exemplo,
propuseram a teoria Orch-OR
(Orchestrated Objective Reduction), na qual a consciência é devida a
colapsos quânticos nos microtúbulos neuronais.
A nossa pretensão é explorar a ideia de que,
se a informação semântica estiver ligada à estrutura fundamental do
espaço-tempo, pode haver uma relação mais profunda entre computação (e a
codificação de erros na informação quântica, de que trataremos mais adiante) e
consciência. A verdade, é que hoje, os sistemas computacionais lidam com
semântica de forma sintáctica,
sem necessariamente terem experiência subjectiva (qualia). Se a consciência for apenas um processamento altamente
integrado de informação, então um sistema avançado poderia aproximar-se dela.
Mas se houver algo mais fundamental (como a estrutura do espaço-tempo ou “mecânica”
quântica), então a computação clássica nunca conseguirá replicá-la. Se há algo para além da computação
na consciência, uma hipótese radical e inovadora, é que a consciência pode ser
um Princípio fundamental da natureza,
assim como o espaço-tempo, a energia e a massa: a consciência aparece então como fenómeno fundamental.
Esta ideia defendida no Panpsiquismo apresenta a consciência
como propriedade fundamental da realidade, presente até nas partículas
elementares. A consciência encarada como
um fenómeno multiespectral em vez de um fenómeno binário fisicalista (presente
ou ausente, 0 ou 1). Outra é o Idealismo Metafísico que defende ser a
consciência um princípio primário e a matéria a sua consequência, não o
contrário. Faz lembrar as interpretações quânticas ao proporem que o
observador tem um papel fundamental na estrutura da realidade.
Se assumirmos que a consciência é mais do que
computação, então podemos concluir que esta pode estar inexoravelmente ligada à
estrutura fundamental do espaço-tempo,
e é deste pressuposto que vamos partir nesta aventura teórica.
2. A conexão entre consciência e a
estrutura do espaço-tempo
"Naquele que é sem começo e sem fim, que é além do tempo e do espaço, no imutável, repousam os céus e a terra, o espaço e a mente, com toda a vida."
Shvetashvatara Upanishad 6.7
Como vimos, algumas ideias sobre este assunto
incluem a Teoria Orch-OR de Roger
Penrose e Stuart Hameroff, que propõem que a consciência nasce de
processos quânticos nos microtúbulos cerebrais, influenciados pela geometria do
espaço-tempo onde poderia aliar-se a Holografia.
Os microtúbulos, eles próprios possuem uma geometria holográfica.
Contudo a holografia estende-se a outras
teorias, entre as quais as teorias da gravidade quântica, que implica ser a
informação no universo codificada também de forma holográfica. Se a consciência
for um processo informacional (2),
pode estar ligada a essa estrutura holográfica da realidade.
Então vamos aplicar a mesma metodologia usada
na computação quântica e introduzir os códigos
quânticos na estrutura do espaço-tempo, que em nossa opinião, poderão
estar intrinsecamente ligados a este problema. Se a consciência depende de
processos não computáveis ou da própria geometria fundamental da realidade,
como vimos antes, talvez seja necessário um novo tipo de "código"
para descrevê-la, um código que vá para além da computação clássica e até mesmo
da mecânica quântica tradicional. Deste
modo é aqui que surgem eventualmente a proposta dos códigos quânticos, intimamente
ligados à “substância” da consciência. Se a consciência for um aspecto
fundamental da realidade, talvez precisemos de uma nova estrutura teórica para
entendê-la, como já dissemos, algo que vá além da física clássica e até da
mecânica quântica convencional.
Talvez a consciência esteja relacionada com
alguma “camada” ainda mais profunda
para além da estrutura do espaço-tempo, algo como uma "teia
informacional" subjacente à própria realidade. Um network informacional
tipo akasha védico e que alguns teorizam como “espuma de spins” (Carlo
Rovelli). Esta visão
unificadora, junta física, filosofia e tradições espirituais de uma maneira que
não deixa de ser intrigante.
O conceito védico do akasha como um Campo informacional cósmico, emparceira com a teoria do campo unificado, a informação holográfica e até com outras
hipóteses quânticas já lançadas sobre a consciência. Acreditando que se o
espaço-tempo for mais do que apenas um "cenário" pode na verdade
resultar de uma teia de informações primordiais. Talvez a consciência não seja
apenas um fenómeno limitado, no mínimo, ao âmbito biológico, mas uma
propriedade intrínseca dessa estrutura fundamental.
Poderíamos ver essa “teia informacional” como
algo acessível directamente pela mente humana. O papel da intuição ou dos
estados alterados de consciência. Neste
caso a intuição corresponderia a Budhi pertencente ao ternário Atma, Budhi e Manas
que fazem parte da constituição Septenária védica e hinduísta. Budhi seria a faculdade intuitiva
superior, conectada à teia informacional fundamental (akasha), enquanto Manas representaria o intelecto e a
mente racional, e finalmente, Atma
a essência última do ser. Em qualquer caso, uma tríade que funciona num e como
um todo. A intuição não é apenas
um "atalho mental", mas passaria a ser um meio de aceder a níveis
mais profundos da realidade. Talvez o que chamamos de insight ou “conhecimento directo” seja na verdade
uma interacção com essa estrutura fundamental do universo e que pode ser
cultivada por métodos específicos, como meditação ou mesmo práticas científicas
avançadas e passíveis de controlo experimental (Raja Yoga). Se a consciência realmente interage
com essa rede informacional, então práticas como meditação profunda possam actuar como um "afinamento" ou
sintonização da percepção, enquanto abordagens científicas avançadas possam
desenvolver métodos para detectar ou modelar essa interacção.
3. Plasmas,
Pitris e consciência
"Aqueles que praticam ritos sacrificiais e caridade vão para a morada dos ancestrais (Pitrloka). Lá desfrutam de seu mérito, e quando o seu mérito se esgota, retornam a este mundo."
Brihadaranyaka Upanishad 6.2.16
Como já vimos a intersecção entre neurociência
e física quântica pode revelar pistas sobre como a consciência “emerge” e
interage com a realidade.
O universo é dominantemente plasmático (99% da
matéria visível). Sendo o plasma o quarto
estado da matéria, faz do plasma um candidato ideal para um substrato físico da interacção
entre consciência e akasha.
Alguns físicos sugerem que o universo primordial era um plasma de quasipartículas, antes de se organizar
em matéria fermiónica e espaço-tempo. Se partirmos do princípio que a
consciência está ligada à estrutura fundamental do universo, será que há alguma
relação com essa fase primordial? Inclusivamente foram trabalhadas hipóteses de
que campos electromagnéticos no cérebro poderiam desempenhar um papel na
consciência. Como os plasmas são condutores naturais de electricidade e
magnetismo, talvez haja aqui alguma conexão oculta. Algumas pesquisas sugerem
que o cérebro opera em um regime bio-electromagnético sofisticado, e se a
consciência está além do físico, talvez interaja com estruturas plasmáticas
dentro e fora do organismo.
Também algumas tradições esotéricas sugerem
que o akasha pode ter
propriedades semelhantes ao plasma – um meio dinâmico que armazena informação que
liga diferentes níveis da realidade. Os plasmas
podem perfeitamente ser mais do que um estado físico da matéria, possivelmente
funcionando como um meio de transmissão ou armazenamento de informação dentro
da consciência universal.
Podemos encontrar nas tradições cosmogónicas védicas os Pitris Solares (Ágniṣvāttas)
e Lunares (Barhiṣads) ligados geneticamente à formação do nosso planeta e da
Lua.
Os Pitris Solares poderiam estar ligados aos
plasmas de alta energia, como os ventos solares e as correntes de plasma
interestelares, que estruturam e sustentam a informação no universo. Por outro
lado os Pitris Lunares estariam associados aos plasmas mais densos e frios da
matéria e da formação biológica, actuando como intermediários entre o mais subtil
e o físico.
Plasma. Fonte - Creative Commons.
A um nível conceptual mais profundo, os
plasmas poderiam ser um dos meios pelo qual o akasha se manifesta, servindo
como um veículo informacional entre os estados de consciência e a estrutura da
realidade.
Se o akasha
for interpretado como um Campo informacional fundamental, e os plasmas forem altamente responsivos a
campos electromagnéticos e a dinâmicas quânticas, como se prova na realidade,
talvez haja uma relação profunda entre eles.
Diferente
dos sólidos, líquidos e gases, os plasmas possuem alta condutividade e
interagem fortemente com campos electromagnéticos. Se a consciência universal
opera através de um Campo subtil, o plasma poderia ser um dos "veículos"
ou intermediários para essa interacção. Esta ideia é fundamento também no conceito
de Universo Eléctrico, caro a Helena Blavatsky. Forçosamente isto poderá estar
ligado a outra estrutura: o universo pode ser estruturado de forma holográfica,
e o plasma cósmico primordial pode ter sido o "suporte" para a
codificação dessa informação, como se a realidade manifesta fosse uma projecção
de uma camada mais profunda.
Um caminho interessante para unir a tradição védica e a teosofia com a
ciência moderna.
4. Estados
expandidos e EQM`s
"Quando a mente está silenciosa, além do
enfraquecimento pelo desejo, então aquele, como um sol sem nuvens, contempla o
Ser supremo."
Mundaka Upanishad
3.1.8
Se a consciência interage com a “teia
informacional” do akasha por meio de estados ampliados, talvez seja possível
aceder a padrões de informação que não estão disponíveis na percepção comum.
Constituem os fenómenos de experiências místicas, visões durante meditação
profunda e até relatos de algumas investigações com substâncias enteogénicas - do grego entheos
("cheio de deus" ou "inspirado pelo divino") e genesthai ("vir a ser"), cujos efeitos parecem
"sintonizar" a mente a diferentes frequências da realidade senciente.
Já para não falar das Experiências de Quase Morte (EQMs) cada vez mais
reportadas, sobretudo nos meios hospitalares.
Inicialmente alguns pesquisadores propuseram uma hipótese de cariz
neurológico para os fenómenos relatados nas EQMs. Seriam causadas por um
conjunto de factores como a anoxia cerebral (falta de oxigénio cerebral), a
libertação de neurotransmissores ou uma actividade anómala nas redes neuronais,
incidentes ao nível do córtex visual e do sistema límbico. No entanto esta
hipótese tem vindo a ganhar menos adeptos, uma vez que os fenómenos são
acompanhados por confirmações médicas abalizadas (e não só) de situações
colaterais, especialmente quando estas são sustentadas por relatos verificáveis
de percepção fora do corpo em que os fenómenos relatados vão além do que pode
ser explicado por processos cerebrais. Deste modo surgiu a designada Hipótese
da Consciência Não-Local.
O que as EQMs propõem, é que se a consciência
pode continuar a existir em estados onde a actividade cerebral está gravemente
comprometida ou ausente (como nas paragens cardíacas), a mente pode existir
independentemente do substrato neurológico. Milhares de casos tem sido documentados,
como relatos de pessoas que descrevem detalhes verificados do ambiente em redor
enquanto estavam clinicamente "inconscientes" ou os constantes
relatos de padrões similares que envolvem um túnel de luz, sensação de paz,
revisão da vida e “encontros” com entidades familiares já falecidas ou outras a
longas distâncias do evento. Para não falar das consequências das EQMs nas mudanças
permanentes induzidas na personalidade com transformações duradouras nas
perspectivas e valores de vida das pessoas que passam por elas, indicando uma
interacção profunda com um nível mais fundamental da realidade. Tudo isto se
passa numa dimensão do foro interior ou interno pessoal mas, envolvendo também
uma dimensão não-local externa ao indivíduo.
Nada disto é novidade: lembremo-nos apenas dos
textos icónicos do Livro dos Mortos Tibetano, o "Bardo Thödol", que
significa "Libertação pelo Ouvir no Estado Intermediário", onde se
descreve o processo da morte e da transição entre vidas, guiando a consciência
através dos estados intermediários (bardos); ou o Livro dos Mortos Egípcio, o "Peret
Em Heru", que pode ser traduzido como "O Livro da Saída para a
Luz", uma colectânea de instruções para auxiliar a alma na jornada pelos
desafios do submundo (Duat), a vida após a morte.
Mas se os estados de consciência expandidos
são uma ciência de foro “interno”, então podem ser sistematicamente estudados e
aprimorados, talvez combinando práticas meditativas com uma compreensão mais
profunda da relação entre mente, energia e informação. Poderia até levar a uma
espécie de "tecnologia da consciência" baseada em princípios naturais
e estruturais da realidade. São algumas abordagens contemporâneas, como a neurociência da meditação, a física da consciência e até certos aspectos
da novíssima exploração quântica da
mente. Sabe-se o quanto a estrutura do cérebro pode mudar em resposta à
meditação e práticas introspectivas em que a sua neuroplasticidade conduz a estados alterados ou ainda como a
consciência pode influenciar sistemas físicos (o efeito do observador na física quântica).
Por outro lado as teorias da informação e a holografia
podem oferecer modelos profundos para entender a relação entre consciência e
realidade. É assim que o Princípio
Holográfico sugere que toda a informação de um volume tridimensional
pode ser codificada na sua fronteira bidimensional. Chegámos ao ponto de
equacionar, se a consciência interage com essa estrutura informacional, afinal será
que a nossa percepção da realidade é uma projecção holográfica a um nível mais
fundamental?
Alguns físicos teorizam que o espaço-tempo
pode emergir da interconexão da informação quântica. Se a consciência estiver
ligada à informação fundamental, talvez tenha um papel na própria estrutura do universo.
No entanto outros investigadores defendem a consciência como um processador de informação em que a mente não
apenas recebe informações de um campo holográfico universal, mas as
"descodifica" - o que reforça a concepção do akasha como rede
informacional.
Isto implica que a consciência não é um mero
observador da realidade holográfica, mas um participante activo, um componente
essencial da estrutura informacional do universo. Se a consciência faz parte da teia holográfica, então a
própria percepção e cognição podem ser manifestações de um processo mais
profundo de organização da informação, transformando o universo num sistema auto-organizável de informação, onde a
consciência não apenas recebe informações, mas contribui para a construção da
realidade percebida. Se a consciência influencia a teia informacional, talvez
os estados mentais possam alterar, de alguma forma, as próprias leis emergentes
do espaço-tempo estabelecendo, em bases apropriadas, a relação entre observador e realidade e reforçar o conceito de akasha
como um "Campo participativo", em vez de ser apenas um repositório
de informações, transformando-o agora num tecido dinâmico onde a consciência
interage e molda a realidade.
Se a realidade “emerge” de uma rede
informacional dinâmica, a consciência pode perfeitamente influenciar a entropia
em modos que vão além daqueles considerados pela termodinâmica clássica (3). Podemos até definir uma "entropia
de participação", que mediria o quanto um observador interage e altera a
distribuição da informação na teia fundamental, lembrando a entropia
holográfica de Bekenstein-Hawking (4),
mas numa forma expandida daquele conceito para considerar também a influência
do observador como parte do processo.
Samsara. Fonte - Wikimedia Commons
"Assim como uma pessoa descarta roupas velhas e veste novas, da mesma forma a alma abandona corpos gastos e assume novos."
Bhagavad
Gita 2.22
Esta passagem do Bhagavad Gita ilustra de forma simples e incisiva a ideia do renascimento cíclico dentro do Samsara, onde a consciência se move através de diferentes corpos e experiências, semelhante a um processo de actualização e continuidade dentro de uma estrutura dinâmica da realidade visível e invísivel.
Segundo as tradições filosóficas presentes no
Hinduísmo, Budismo e Jainismo, o Samsara é um ciclo contínuo de nascimento,
morte e renascimento ao qual os seres estão sujeitos e, que podemos extrapolar
a uma escala física da existência do Universo, dado a sua semelhança com a nova
cosmologia de Roger Penrose dos Ciclos Cosmológicos Conformes – CCC, sustentada
largamente pelos últimos dados observacionais do telescópio espacial James
Webb. O Samsara representa a existência condicionada, onde a consciência se
move através de diferentes estados e formas de vida, impulsionada pelo karma —
a lei de causa e efeito, num ciclo infinito de éons – e do qual só se liberta
apenas quando atinge a libertação referenciada como Moksha no Hinduísmo ou o Nirvana
no Budismo.
Na base deste conceito poderá estar uma
não-linearidade da informação, um Campo de interacções entrelaçadas, onde
acontecimentos futuros influenciam eventos passados, reestruturando a trajectória
da consciência. Se o karma for visto como um princípio de
equilíbrio cósmico, a retrocausalidade poderia permitir que futuros estados de
consciência “corrigissem” padrões passados, assemelhando-se à ideia de códigos
quânticos de correcção de erros na computação quântica, onde informações podem
ser restauradas mesmo se já tivessem sido “corrompidas” no passado. Fundamental
ter por princípio, que a informação temporalmente não-linear abrange fluxos
direccionais do passado-presente-futuro mas também os reversos correspondentes.
Ou seja, o akasha entendido como um Campo
informacional fundamental, pode deste ponto de vista, conter tanto registos
passados quanto potenciais futuros. A retrocausalidade poderia então ser um
mecanismo de normalização, pelo qual os padrões kármicos são ajustados em
resposta a estados futuros de consciência, na medida em que a realidade a este
nível ajusta-se para manter a coerência da “teia informacional” fundamental e universal.
Haveria aqui que tirar consequências mais
profundas, e considerar que a libertação do Samsara não seria apenas uma
questão de “expiação” (no sentido das tradições religiosas) de acções passadas,
mas também de reescrita da própria estrutura informacional da consciência com implicações
sobre livre-arbítrio e a possibilidade de alterar não apenas o futuro, mas a
própria teia causal da realidade. O karma assumiria o papel de um princípio
mais profundo de auto-organização e equilíbrio cósmico. A retrocausalidade, a
ideia de que efeitos futuros podem influenciar causas passadas, seria uma
deriva lógica do funcionamento do universo como uma “teia informacional”
interconectada, onde passado, presente e futuro não são entidades estáticas,
mas sim aspectos interdependentes de uma realidade mais profunda.
Em apoio desta ideia poderemos citar um trecho
dos Upanishads:
"No
imutável, passado e futuro estão contidos. Aquele que percebe isto transcende o
tempo e não mais renasce."
Maitri Upanishad 6.15
Indica-nos que o passado e futuro não são
sequências fixas, mas aspectos de uma realidade atemporal de não-localidade,
acessíveis, por exemplo, a uma consciência expandida. Deste modo se o tempo é
um fenómeno que “emerge” dentro de uma estrutura não-local de sobreposição
quântica, então acontecimentos futuros poderiam influenciar eventos passados, e
possíbilitarem a retrocausalidade.
Além
disso, aquele trecho também menciona a transcendência do tempo e do
renascimento, indicando claramente que a libertação do Samsara envolveria um
alinhamento com este princípio, onde a causalidade convencional, normal no
nosso dia-a-dia, perde a sua rigidez. Ao invés, neste domínio a consciência passa
a interagir com diferentes momentos da linha temporal.
5. O akasha como
um "Campo participativo" gerador de karma
"Assim como o espaço (Akasha) penetra tudo, grande, infinito e omnipresente, assim também o Ser Supremo habita todos os seres, mas permanece além deles."
Mundaka Upanishad 2.1.1
Então o akasha não seria apenas um registo
passivo da informação, mas um sistema
dinâmico de causalidade, onde a consciência interage e gera padrões que
influenciam tanto a realidade subjectiva quanto objectiva. O karma, nesse contexto, poderia ser
entendido como a estrutura de retro alimentação dentro desse campo
informacional, onde cada acção e intenção reverbera e molda futuras
experiências, o que não está longe de algumas ideias actuais da física e da
teoria da informação.
A ligação entre
rectrocausalidade e entrelaçamento surge aqui espontaneamente uma vez
que o universo é essencialmente informacional. Então os eventos podem
influenciar o passado e o futuro de maneiras que ainda não compreendemos
completamente. Também os conhecidos Campos
morfogenéticos (Rupert Sheldrake) e registos akáshicos védicos como
padrões de comportamento e memória colectiva, poderiam estar codificados num
campo informacional, ressoando com consciências individuais e colectivas. A informação
não se perderia, mas sofreria redistribuição, como autênticos processos quânticos de feedback, em que as nossas opções e estados de consciência
deixariam impressões profundas na estrutura holográfica da realidade.
Será
que o karma estaria arredado dos efeitos da 2ª lei da termodinâmica? O karma
poderá ser apreciado como um “mecanismo” de equilíbrio na “teia informacional”.
Se a entropia mede o quanto a informação se encontra distorcida, então o karma pode
ser visto como um processo natural de redução da entropia informacional,
restaurando a longo prazo, em processos de rectrocausalidade e entrelaçamento,
os padrões coerentes da teia. Na própria teia poderão surgir modelos espectrais
de entropia relativa onde aquela tenderia a estados de menor entropia precisamente
através da
participação das consciências.
Isso significa que o karma não seria apenas um
sistema moral ou simbólico, mas uma dinâmica
fundamental da realidade, semelhante às leis da física, onde cada acção,
intenção ou estado de consciência influencia o fluxo da informação no akasha.
Se o akasha é um Campo participativo, então o karma pode ser visto como a interacção contínua entre consciência e
estrutura da realidade, equilibrando e ajustando padrões informacionais
ao longo do nosso tempo. A prova estaria em princípios como a conservação da informação (Lavoisier:
nada se cria, nada se perde, tudo se transforma), a interdependência sistémica, da Teoria dos Sistemas Complexos, em
que as acções individuais afetam o todo ou o Princípio da Causalidade Holográfica, onde
pequenas mudanças podem influenciar toda a estrutura (o Efeito Borboleta da
Teoria do Caos). No seu conjunto, reflectiria a ideia ancestral de que o karma
opera em múltiplas escalas espectrais.
O karma operaria não apenas a um nível
individual, mas como um Campo colectivo
de informação, onde as interacções entre consciências moldam a realidade
compartilhada. Este conceito é suportado pela teoria dos Campos Morfogenéticos, uma vez que a
consciência colectiva cria padrões informacionais que influenciam futuras
gerações e estruturas da realidade. Também o equilíbrio do universo poderia
nascer da interacção entre mil milhões de consciências, ajustando-se
dinamicamente, como advoga a Teoria dos
Sistemas Complexos. Assim se a consciência influencia a “teia
informacional”, um número suficiente de mentes focadas poderia alterar estados
da realidade em grande escala, o designado Efeito do Observador Ampliado (5).
Abre esperanças acerca da possibilidade de que
mudanças na consciência colectiva possam conduzir também a transformações
profundas na realidade, suportando a ideia do karma colectivo das nações.
6. O conceito de Potências
em Pistis Sophia e o akasha
"E ele prosseguiu dizendo: ‘As Potências
do Grande Invisível se moveram segundo sua ordem, enviando luz e força para
aqueles que são dignos, para que possam se elevar e transcender as esferas
inferiores.’"
Pistis Sophia,
Capítulo 86
No gnosticismo de Pistis Sophia, as Potências representam forças
espirituais e inteligências que governam os processos de âmbito cósmico,
influenciando tanto a ascensão da consciência quanto os ciclos de aprendizagem
e redenção. Podem ser vistas como estruturas
dinâmicas da realidade, responsáveis pelo equilíbrio e fluxo das
experiências materiais ou subtis.
Se na realidade o akasha for um campo informacional participativo, as Potências poderiam ser interpretadas
como princípios ou agentes dentro desse
Campo, operando em diferentes níveis da realidade, como Campos de informação e energia
que estruturam a manifestação da consciência e da matéria, forças reguladoras do karma,
assegurando que as dinâmicas de equilíbrio no akasha fossem mantidas e também os
aspectos de uma estrutura holográfica,
onde diferentes níveis de consciência interagem com padrões arquetípicos da
realidade. Não esquecer que o akasha surge não apenas de um “registo”, mas de
um Campo vivo, no qual, neste
sistema, as Potências poderiam actuar como moduladores da informação.
As Potências
podem ser compreendidas como diferentes níveis
de consciência informacional, onde cada camada opera dentro do akasha de
maneira específica. Esta ideia, encontramo-la afinal fazendo parte das
abordagens, tanto esotéricas quanto científicas.
Como na computação e na física da informação,
existem hierarquias de informação que
se entendem como diferentes níveis que organizam e processam a informação
de maneiras distintas, no akasha isso poderia manifestar-se como camadas de
consciência interligadas. Pressupondo que a realidade é holográfica, então cada
nível de consciência poderia conter padrões informacionais que influenciam as
outras camadas dando forma a estruturas
holográficas de consciência. Ora se essas forças representariam níveis
da mente universal. Então ter acesso a determinadas Potências pode equivaler a
alcançar estados superiores de percepção e interacção com o akasha, de modo que
as Potências poderiam ser também
assumidas como se, de certo modo, fossem estados de consciência expandidos.
Se a “teia informacional” fundamental
estrutura a realidade, então os códigos quânticos, dos quais faremos referência
de seguida, podem ser a linguagem matemática que mantém essa estrutura coesa.
Assim, poderíamos construir um código quântico holográfico, onde os erros não são
apenas perturbações, mas sim distorções do significado (lá vem a semântica em
nossa ajuda) na rede informacional. Logo, as Potências em Pistis Sophia, seriam corretores quânticos intrínsecos a esta
dimensão.
Se o espaço-tempo (ou a própria realidade) “emerge”
de códigos quânticos, então porque não considerar a entropia, segunda lei da
termodinâmica, que mediria a degradação da informação fundamental?
Esta ideia iria de encontro à existência de mecanismos
naturais de correcção para restaurar os estados coerentes da “teia
informacional”, ideia reflectida na concepção das Potências em Pistis Sophia, assumidos agora como códigos
de correcção quântica naturais, operando como restauradores da coerência
informacional.
7. Finalmente os
códigos de correcção quântica
"Assim como um ourives remove as
impurezas do ouro pelo fogo, assim também o praticante remove as suas impurezas
e se torna puro."
Dhammapada
239
Poderíamos agora encarar um outro nível de
interacção entre consciência
individual, e os níveis informacionais do akasha em que essas Potências
agiriam como códigos de correcção quântica. Se as Potências em Pistis Sophia (a que detém o conhecimento) forem
interpretadas como níveis de
consciência informacional, então elas poderiam agir como códigos de correcção quântica dentro
do próprio akasha.
Os códigos quânticos são fundamentais na
física da informação e na teoria da gravidade quântica ao protegerem a informação contra degradação e
ruído, garantindo a coerência do sistema. Mas nas abordagens holográficas onde
a geometria do universo emerge da codificação da informação, desempenhariam um papel importante na
manutenção da estrutura do espaço-tempo e criar uma redundância inteligente,
permitindo que a informação fosse recuperável mesmo quando partes do sistema
são alteradas. Também de acordo com o fenómeno de sobreposição e de
emaranhamento quântico.
Se o akasha for um campo informacional holográfico, as Potências poderiam ser equivalentes a códigos de correcção
quântica que assim manteriam o
equilíbrio do karma ao evitar a perda ou distorção da informação gerada
pela consciência e, regulariam a
estrutura da realidade, garantindo que diferentes níveis de consciência
se interconectassem sem fragmentação. Deste modo possibilitariam a ascensão da consciência, corrigindo “erros” que
poderiam levar ao aprisionamento da mente em estados inferiores de percepção.
Estaria aqui implícito o conceito budista do Dharma?
Assim as Potências não seriam apenas forças
espirituais simbólicas, mas princípios estruturais que garantiriam a
estabilidade da realidade informacional, algo intrínseco, fenómeno de
não-localidade e de emparelhamento numa dimensão para além das limitações do
nosso espaço-tempo vivencial.
Na não-localidade
quântica
a informação pode ser compartilhada instantaneamente entre sistemas distantes,
de modo que as Potências poderiam ser princípios actuantes simultaneamente em
todo o akasha. Com a Codificação
holográfica, se a realidade é um holograma informacional, então as
Potências seriam padrões de correcção que mantêm a coerência desse sistema
permitindo que a consciência e o akasha possam operar numa camada mais profunda
da realidade em que a correcção da informação não ocorre apenas dentro do
universo observável, mas numa dimensão
mais fundamental, onde a consciência e a estrutura da realidade estão
entrelaçadas.
Significa que essa dimensão actua como uma estrutura subjacente, garantindo a
coerência da realidade sem que seja directamente perceptível. A realidade
visível seria apenas uma projecção de interacções informacionais mais profundas em que o espaço-tempo surge da informação
quântica e a correcção quântica
como mecanismo oculto. Da mesma maneira como os códigos quânticos
computacionais corrigem erros sem que os sistemas clássicos percebam, também as
Potências poderiam actuar como princípios estruturantes invisíveis, mimetizando,
na dimensão psicológica, o processo de como o inconsciente molda a mente sem
ser directamente acessível. As Potências poderiam regular a informação do
akasha sem intervenção directa da percepção comum.
Embora essa dimensão seja inacessível
directamente, no entanto a sua influência pode ser experimentada ou traduzida
quando a consciência entra em estados específicos de ressonância. Estados,
esses que corresponderiam a princípios
de sintonia quântica tais como aqueles quando as partículas entrelaçadas
mantêm uma conexão instantânea. Também os estados elevados da consciência
poderiam sintonizar-se com padrões informacionais profundos, alavancados por
meditação, introspecção profunda. Em alternativa, certos insights intuitivos poderiam servir como "chaves" para
interagir com essa estrutura em que a mente poderia captar essas influências
através de símbolos, narrativas ou experiências subjectivas profundas. Daí
também a razão e importância da semântica e do simbolismo.
Um futuro
auspicioso
Acreditamos ser possível uma abordagem
científica que vá além do reducionismo clássico e explore os chamados “novos modelos de consciência”. Na
nossa opinião isso significa que a consciência não pode ser reduzida a uma mera
“emergência” computacional, mas envolve uma conexão activa com a estrutura
informacional subjacente ao universo. Neste sentido confluem actualmente
algumas áreas do conhecimento e da investigação científica que nos perspectivam
grandes desenvolvimentos. Contamos desde logo com a Teoria da Informação Quântica (TIQ) na investigação de como a
consciência pode interagir com a informação fundamental do universo.
A Neurociência e os
Estados Alterados de Consciência poderão também mapear como diferentes
estados mentais podem modular a ligação com o akasha ou a “teia informacional”,
enquanto a Física Holográfica e a Teorização
do Espaço-Tempo e da Gravidade Quântica na área da Cosmologia e da
Astrofísica poderão dar um contributo decisivo ao explorar se a estrutura do
universo já codifica essa interacção com experimentos ligados, por exemplo, à
detecção de ondas gravitacionais.
Se o akasha for um Campo informacional fundamental, talvez a consciência possa ser descrita em termos de princípios metafísicos ainda não totalmente compreendidos, como entrelaçamento quântico, não-localidade e computação holográfica.
Forçosamente que necessitamos de progredir
noutras direcções de natureza científica, mas não do âmbito reducionista
tradicional, que eventualmente poderão possibilitar a construção de
experiências relativas à interacção da consciência com a “teia informacional”.
Alguns laboratórios têm realizado estudos empíricos com EEG, fMRI e
experimentação quântica numa tentativa, muitas vezes frutífera, de
correlacionar estados de consciência com fenómenos de não-localidade. Também só
agora o fenómeno de não-localidade, emparelhamento e sobreposição, está a ser
melhor compreendido, sobretudo na área computacional quântica. Precisamente o desenvolvimento
de modelos teóricos que liguem a informação quântica, correcção de erros e o
papel da mente, poderão mostrar-se atraentes a curto prazo.
Ainda no domínio da
Teoria das Probabilidades também poderão surgir contributos com algumas
experiências concebidas na exploração de padrões estatísticos em eventos
globais para avaliar se a consciência colectiva influencia sistemas físicos.
De algum modo estas e outras abordagens talvez
ofereçam maneiras científicas e bases matemáticas na exploração na direcção do
akasha/karma como uma estrutura activa da realidade. A consciência poderia ser
modelada como uma interacção entre topologia (estrutura do espaço-tempo
informacional) e dinâmica quântica (participação activa no colapso da
realidade). Assim, poderíamos incluir uma versão expandida da equação de
Wheeler-DeWitt, onde a função de onda do universo inclui um termo para a
informação participativa da consciência.
Com este modelo da “teia informacional”
fundamental, não poderíamos descartar o papel universal da entropia. A
entropia, como lhe é própria pelas suas inerências atribuídas pela Física,
teria que adquirir um papel fundamental porque mediria não só a incerteza, mas
o grau de coerência do significado, num aspecto mais profundo. Estabelecer-se-ia
uma relação entre os códigos quânticos onde estes corrigiriam as entropias que
distorcem a informação fundamental, de modo que a consciência participaria na
dinâmica da entropia, por influenciar o próprio equilíbrio informacional. O
karma, afinal poderia também ser visto como um mecanismo de redução da entropia
informacional fora dos limites impostos pelo espaço-tempo local. Estaríamos a
ligar a entropia não apenas ao caos e à perda de informação, mas a um fluxo
dinâmico onde a consciência e os códigos da realidade actuariam para manter a
estrutura da “teia informacional”.
Acredito que esta exposição será considerada
pouco ortodoxa, tanto pela ciência como pelos recônditos conceitos expressos
nos conhecimentos esotéricos. Contudo o caminho muitas vezes faz-se por atalhos
que chegam mais depressa aos objectivos pretendidos. O nosso objectivo,
excluído qualquer pretensiosismo bacoco e de aviltação do ego, foi mostrar
possíveis ligações entre conhecimentos ancestrais e as mais recentes teorias
científicas que fazem caminho em tantos domínios, e que parecem indicar que a humanidade
sempre teve os mesmos paradigmas, porém tratados com linguagens diferentes de
acordo com as circunstâncias dos tempos que lhes foram próprios.
É certo que a humanidade terrestre está na sua
infância mas começa a dar os seus primeiros passos.
Notas
(1) A experiência do
Quarto Chinês foi proposta em 1980 pelo filósofo John Searle, para argumentar
contra a ideia de que a inteligência artificial pode realmente ter compreensão
ou consciência.
Imagine que uma pessoa que não sabe chinês
está trancada num quarto. Dentro do quarto, há um conjunto de regras escritas num
idioma que ela entende (por exemplo, inglês) e um manual que diz como manipular
símbolos chineses sem precisar compreendê-los.
Do lado de fora, chineses enviam perguntas
escritas em chinês para dentro do quarto. A pessoa dentro do quarto usa o
manual para combinar os símbolos e gerar respostas apropriadas, que depois são
passadas para fora. Para um observador externo, parece que há alguém no quarto
que compreende chinês, porque as respostas são coerentes. No entanto, a pessoa
dentro do quarto não entende nada do que está acontecendo porque segue apenas
as regras sintácticas.
Searle mostra-nos que essa situação é análoga
ao funcionamento dos computadores e da inteligência artificial. Estes manipulam
símbolos segundo regras formais (como um programa de computador faz com os
dados), mas não têm compreensão real do significado (semântica). Em conclusão,
a IA pode simular inteligência, mas não tem uma consciência verdadeira ou um
entendimento genuíno – falta-lhe qualia.
(2) Impõe-se nesta altura fazer a distinção entre os
conceitos de informação de Shannon e informação Informacional. Genericamente
reside na abordagem e no significado atribuído à informação. A informação de
Shannon (conhecida como Teoria da Informação), formalizada por Claude Shannon
em 1948, trata da quantificação, armazenamento e transmissão de informação com
foco na estrutura estatística dos sinais e das mensagens, sem se preocupar com o
seu significado (semântica), traduzindo-se em bits (0/1) e apenas preocupada
com a redução da incerteza nos sistemas.
A Informação Informacional está, pelo contrário, intimamente ligada a um
conceito mais amplo e envolver não apenas a estrutura estatística da
informação, mas também o seu significado, a interpretação e o impacto da
informação nos sistemas que a recebem. Sobretudo relaciona-se com os domínios
da epistemologia, da filosofia da informação, dos sistemas biológicos e da
computação, incluindo noções de informação semântica, informação contextual e
até informação quântica, dependendo do campo de estudo.
Resumindo: enquanto a primeira trata a informação como uma propriedade
quantitativa dos sinais, sem considerar o seu significado, a segunda estabelece
uma óptica mais ampla que incluí a semântica, a pragmática e o impacto nos
sistemas. A primeira
diz-nos a quantidade de informação existente, mas não o que essa informação
significa. Já a informação informacional, dependendo do contexto, engloba
qualidade, significado e impacto, o que se alinha muito mais com a ideia de uma
“teia informacional” fundamental, onde a informação não é apenas um dado bruto,
mas algo que co-cria a realidade.
Como afirma Federico Faggin, na sua perspectiva de aplicação da
informação informacional aos sistemas biológicos: “Live information is the
informational, energetic, and material aspects of living organisms that can
only be explained with quantum physics.”, Irreducible,
Essentia Books, 2024, pp 101.
Como veremos na abordagem feita por nós sobre a consciência e da “teia
informacional” fundamental, a informação de Shannon adquire apenas um aspecto
superficial da estrutura informacional maior, porquanto o conceito
informacional envolve outras ressonâncias, camadas mais profundas de
significado e participação no akasha. Como se a teoria de Shannon lidasse apenas com a casca,
enquanto a “teia informacional” fundamental estivesse ao nível de um Campo
participativo, onde a informação não apenas reduz a incerteza, mas molda o próprio
tecido da existência. Lembra até a ideia de Wheeler com o It from Bit, mas indo mais além, onde o bit não apenas descreve a realidade, mas também a gera e interage
com a consciência.
Aqui levanta-se uma outra questão: será que a informação informacional
pode ter uma estrutura matemática além daquela presente em Shannon? Algo que
incorpore significado, contexto e até participação consciente, reforçando a
ideia de que o espaço-tempo pode nascer a partir de relações informacionais
mais profundas, talvez até algo análogo a códigos quânticos que estruturam a
realidade. Trataremos de explorar esta ideia mais adiante.
(3) A Segunda Lei da Termodinâmica afirma que a entropia
de um sistema fechado aumenta tendencialmente ou, no mínimo, mantém-se
constante. Dentro da visão da “teia informacional”, precisaríamos reformular
essa lei para incluir o papel da informação, da consciência e dos códigos de
correcção quântica, “mecanismo” de estabilização, que introduziremos mais tarde
na nossa exposição. No paradigma clássico, a entropia aumenta porque os
sistemas tendem a assumir estados mais prováveis, porque as distribuições
aleatórias são mais numerosas do que estados ordenados.
A entropia pode introduzir outro conceito ligado à tendência natural da
informação em fragmentar-se e por conseguinte perder coerência, se encararmos a
proposta de que a realidade “emerge” de uma “teia informacional”. Esse processo
poderia ser descrito como uma dissipação da ressonância informacional, onde
partes da teia poderiam perder ligação com os padrões estruturantes. Nesta
lógica, a segunda lei da termodinâmica poderia ser vista como a manifestação de
uma degradação da coerência informacional quando não há participação activa da
consciência ou de mecanismos de correcção. Como se a consciência ao interagir
com a “teia informacional”, pudesse actuar reduzindo a entropia e organizando
padrões de informação. Não é por acaso que o Princípio de Landauer, relaciona o
colapso de informação ao aumento de entropia. A consciência reverteria os
processos imanentes de dispersão informacional.
Em termos matemáticos, isso poderia ser descrito como um termo adicional
na equação da entropia, onde a interacção consciente contribui negativamente
para a sua taxa de crescimento. Ou seja a segunda lei não seria absoluta, mas
adquiriria um carácter estatístico, e poderia ser equilibrada por processos
correctivos em escalas apropriadas. Simplesmente a quântica aplicada à
entropia.
Outras ligações à entropia são dadas por modelos como aquele da gravidade
emergente de Verlinde, onde a entropia está conexa à geometria do espaço-tempo.
Em vez de ser uma interacção fundamental, a gravidade surge quando a informação
no espaço-tempo se distribui de forma desigual, implicando que o próprio tecido
do espaço-tempo armazena informação, e a gravidade é um reflexo de como essa
informação é organizada.
Inspirado no Princípio Holográfico, Verlinde argumenta que a informação
da gravidade está codificada na superfície do espaço-tempo (como a informação
de um Buraco Negro está codificada no seu horizonte de eventos). Também da sua
argumentação, e vindo ao nosso encontro, surge uma ideia relativa à natureza da
“matéria escura” que afinal pode ser apenas um efeito geométrico da estrutura
informacional do espaço-tempo como se esta contivesse informações, “variáveis ocultas”,
que influenciariam a dinâmica do espaço-tempo, sem necessidade de matéria
exótica.
A gravidade emergente de Verlinde reforça a ideia de que o espaço-tempo
pode ser entendido como uma rede informacional. Se a informação estrutura a
realidade, então a gravidade pode ser simplesmente um efeito secundário da organização
dessa informação e a consciência poderia interagir com essa “teia informacional”,
talvez até alterando sua distribuição, e portanto afectando a própria
gravidade. Uma hipótese que explicaria os fenómenos de levitação verificadas em
experiências místicas e estados alterados de consciência, nas práticas do yoga
e dos mestres espirituais ou ainda naqueles fenómenos espontâneos relatados em
estados de êxtase ou profunda concentração de Teresa dʼÁvila.
Se a consciência pode actuar sobre a informação fundamental da realidade,
então estados profundos de concentração podem ser capazes de reduzir a entropia
informacional local, gerando um efeito gravitacional reverso. Em termos
físicos, traduzir-se-ia por uma reconfiguração do campo informacional
subjacente, não constituindo uma violação da gravidade clássica, observada por
nós na nossa dimensão física.
Outra consequência prende-se com a remoção da necessidade de uma
partícula mediadora da gravidade, um novo bosão a descobrir – o tão ansiado
gravitão que comporia o Modelo Padrão.
Também a gravidade em Newton pode ser derivada a partir de um princípio
entrópico: quando uma massa se aproxima de outra, a configuração informacional
do espaço-tempo ao redor muda, aumentando a entropia, fazendo com que a
gravidade nos surga como uma força estatística que empurra os corpos para
estados de maior entropia.
(4) A Entropia Holográfica de Bekenstein-Hawking (EHBH) estabelece
uma relação profunda entre a gravidade, a termodinâmica e a informação.
Descreve a entropia de um Buraco Negro como proporcional à área do horizonte de
eventos, onde a informação gravitacional é codificada em superfícies, e não no
volume do espaço-tempo. Em resumo: A entropia de um Buraco Negro não cresce com
o volume, mas sim com a área da sua fronteira!
O conceito EHB é também fundamental para o Princípio Holográfico e para a
gravidade emergente de Verlinde e a holografia quântica.
(5) O Efeito do Observador
Ampliado pode ser interpretado como uma generalização do ainda pouco
compreendido efeito do observador na mecânica quântica, mas com implicações que
vão além do contexto tradicional do exercício de medições em sistemas
microscópicos (interacção objecto observado e observador). Este Efeito do
Observador Ampliado envolve a possibilidade de que a consciência não apenas afecte
o colapso da função de onda ao nível microscópico, mas também tenha um papel activo
na organização da realidade física e informacional em larga escala.
No
âmbito deste trabalho este conceito poderia abranger e reforçar a relação entre
consciência, informação e a própria estrutura do espaço-tempo. A consciência poderia influenciar a “teia
informacional” fundamental do universo, reconfigurando padrões de informação e
afectando probabilisticamente a ocorrência de eventos numa escala maior do que
aquela normalmente associada ao efeito quântico. Esse conceito teria a sua
aplicação devido ao entrelaçamento e à não-localidade.
Hipoteticamente se a mente pode aceder a diferentes camadas da realidade
por meio de estados expandidos de consciência, então o Efeito do Observador
Ampliado poderia desencadear uma interacção ressonante entre a mente e a
estrutura subjacente do universo. Justificaria a ideia de que estados
meditativos profundos, experiências visionárias ou mesmo a tentativa de
utilização de procedimentos tecnológicos avançados, mas ainda não
descortinadas, permitissem uma interacção mais directa com a malha
informacional do universo.
João Porto e Ponta Delgada, 4/3/25
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